Líderes dos caminhoneiros disseram que os protestos em rodovias do País que reúnem alguns motoristas apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) descontentes com o resultado das eleições não refletem demandas da maior parte da categoria. Os protestos incluem manifestantes que não são caminhoneiros, segundo os líderes.
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“Eu não vejo 100% da categoria. São pessoas que estão descontentes com o resultado das eleições. A gente está tentando levantar de onde está saindo o movimento”, disse o presidente da Associação Brasileira de Condutores de Veículos Automotores (Abrava), Wallace Landim, conhecido com Chorão. Em relação às imagens que circulam em grupos de WhatsApp e redes sociais, que falam em intervenção militar para reverter o resultado do pleito, Chorão foi categórico: “Fico muito triste de muitas pessoas usarem o nome dos caminhoneiros. Não luto e nunca vou lutar contra a democracia do País. Minha linha é mais de pacificação, conversar, dialogar e unificar o País”.
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O representante disse não acreditar na persistência dos protestos. “Os caminhoneiros têm que lutar pelo nosso segmento, pelo transporte. A diferença do presidente eleito em relação a Bolsonaro foi de 1 milhão e poucos votos. Não tem como falar que vai parar o País por política.” Segundo Chorão, a categoria entregou as pautas do setor aos presidenciáveis e seguirá interlocução com o novo governo.
Eu acredito que tenham o direito de protestar, só que eles têm que aceitar a democracia e não ficar travando a pista, porque está atrapalhando a vida de todo mundo. Assim como aceitamos a vitória do Bolsonaro em 2018, agora eles têm de aceitar a vitória do Lula
Wanderlei Alves, o Dedeco
Wanderlei Alves, conhecido como Dedeco, também vê os protestos como pontuais. “Eu acredito que tenham o direito de protestar, só que eles têm que aceitar a democracia e não ficar travando a pista, porque está atrapalhando a vida de todo mundo. Assim como aceitamos a vitória do Bolsonaro em 2018, agora eles têm de aceitar a vitória do Lula”.
“Se for uma paralisação para reivindicar algum direito da classe, a classe terá meu apoio. Se for uma paralisação política, para atrapalhar o governo do Lula, não terá o meu apoio. Acho que autoridades têm de tomar providências porque não pode cercear o direito de ir e vir das pessoas que estão na via. É assim que os bolsonaristas falavam quando a gente ia reivindicar alguma coisa contra o governo Bolsonaro.”, ressalta Alves.
Plínio Dias, diretor-presidente do Conselho Nacional do Transporte Rodoviário de Cargas (CNTRC), disse que não há indício de paralisação ampla de caminhoneiros autônomos. “Vi alguns vídeos e são pessoas desconhecidas e acho que também nem são caminhoneiros”, apontou.
O deputado federal Nereu Crispim (PSD-RS), presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Caminhoneiros Autônomos e Celetistas, afirmou ao Estadão que se trata de ações isoladas, de pequenos grupos que não conformam com o resultado das urnas. “Essas manifestações e bloqueios não são atos da categoria dos caminhoneiros autônomos. Esses bloqueios são o choro de extremistas que não sabem perder e não respeitam a democracia”, disse Nereu Crispim.
Ele declarou que a categoria reconhece o resultado das eleições. “As pautas da categoria continuam e continuarão sendo requeridas de solução independentemente de qualquer governo, pois elas são oriundas da paralisação de maio de 2018, a qual o então candidato da época, Jair Bolsonaro, se comprometeu a resolver e veio a se eleger, e durante os quatro anos nunca resolveu nenhuma delas.”
A pauta dos motoristas profissionais é a criação de um piso mínimo do frete, a mudança da política de preços dos combustíveis, a criação de mais pontos de parada, a aposentadoria aos 25 anos e a unificação dos documentos fiscais.
As manifestações não contam sequer com o apoio do caminhoneiro Marcos Antônio Pereira Gomes, conhecido como Zé Trovão e deputado federal eleitor pelo PL-SC. Apoiador do presidente Jair Bolsonaro, Zé Trovão pediu “calma”. “Caminhoneiros de Santa Catarina e do Brasil, estou ao lado de vocês sempre. Contem comigo para o que vocês precisarem. É um direito de vocês se manifestarem e dizerem o que querem ou não para o Brasil”, disse em vídeo divulgado nas suas redes sociais. “Vou pedir muita cautela, respeito, reciprocidade. Não vamos ultrapassar os limites aos quais não queremos ferir ninguém. Queremos que a coisa seja como está sendo: ordeira e mantendo o respeito”, completou. Em 2021 e neste ano, Zé do Trovão liderou protestos de caminhoneiros contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e pedindo a intervenção militar.
Em nota oficial, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes e Logística (CNTTL) diz defender a democracia e “respeitar o resultado soberano das urnas”. “Vivenciamos uma ação antidemocrática de alguns segmentos que não representam a categoria dos caminhoneiros autônomos de não aceitação do resultado das urnas. Precisamos respeitar o que o povo decidiu nas urnas: a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva. Esse projeto que está foi derrotado ontem”, afirma o diretor da CNTTL, o caminhoneiro autônomo de Ijuí-RS, Carlos Alberto Litti Dahmer.
“Com base em nosso monitoramento identificamos que não se trata de uma greve/ movimento exclusivo de caminhoneiros, são movimentações individuais, .pontuais e de cunho ideológico sem coordenação de entidades ou lideranças”, afirmou a Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA).
A Polícia Rodoviária Federal (PRF), que no dia da eleição fez diversos bloqueios em estradas do País, declarou que, até o momento, foram registradas situações de bloqueio ou aglomeração em 11 Estados e no Distrito Federal. “A PRF segue atenta, monitorando todas as ocorrências e com efetivo empregado na tarefa de garantir fluxo viário normal a todos os cidadãos”, afirmou.
A reportagem questionou a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) sobre as paralisações, mas ainda não teve retorno.
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