BRASÍLIA – O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) não pretende, por enquanto, acelerar a tramitação dos projetos que limitam a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF). Ele ainda está em Alagoas, Estado onde está sua base eleitoral e onde se dedicou a apoiar candidatura de aliados. Na última quarta-feira, 9, a Comissão de Constituição e Justiça aprovou duas propostas de emenda constitucional e dois projetos que atingem o STF.
Segundo pessoas próximas, Lira só retorna à capital federal na próxima semana e, até o momento, não deu qualquer indicação de que vai incentivar a votação célere das pautas aprovadas por larga maioria na CCJ com apoio de integrantes do Centrão. O presidente da Câmara, relata um auxilar, já teria manifestado preocupação com uma das PECs aprovadas, a que dá ao Congresso poder de anular julgamentos do Supremo. Mas segue sem se posicionar sobre as demais propostas.
A segunda PEC votada na CCJ impõe restrições às decisões monocráticas de ministros do STF, medida que é defendida por boa parte dos congressistas, incluindo o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Essa PEC já foi aprovada na Casa legislativa presidida pelo senador mineiro e ficou travada por quase nove meses até ser remetida para apreciação da CCJ.
Até o momento, Lira retardou ao máximo a apreciação das propostas. A PEC aprovada pelo Senado chegou na Câmara em 6 de dezembro de 2023. Ficou parada na direção da Mesa até o dia 19 de agosto deste ano. Ou seja, ficou travada por quase 8 meses. Já a segunda PEC, que autoriza o Congresso a derrubar decisões do STF, foi apresentada originalmente na Câmara pelo deputado Reinhold Stephanes (PSD-PR) em julho deste ano. Seguiu para a CCJ no mesmo dia da outra PEC.
Os dois projetos foram entregues à comissão que é presidida pela deputada bolsonarista Caroline de Toni (PL-SC) momento em que o ministro Flávio Dino, do Supremo, emitiu decisões travando emendas aos Orçamento. O gesto de tirar as propostas da gaveta foi interpretado como uma retaliação.
Entre aliados de Lira a explicação sobre como o tema vem sendo tratado na Câmara dá conta de que o timing de tramitação das propostas segue uma “velocidade política”. Ou seja, os projetos são vistos como trunfo do Congresso no embate com o Judiciário sobre o direito dos parlamentares de continuarem dando as cartas no repasse de recursos da União por meio de emendas ao Orçamento.
A tramitação das propostas também está comprometida pelo calendário eleitoral. O segundo turno das eleições municipais está marcado para o dia 27 de outubro. Até lá, não haveria quórum seguro para garantir aprovação de medidas polêmicas. Há ainda na mesa a disputa pelo cargo de Lira, que deixará a presidência da Câmara no início do próximo ano.
“É tudo um jogo político para se tentar definir a presidência da Câmara”, diz Fausto Pinato (PP-SP). Ele foi um dos membros trocados na CCJ pelo PP, de Lira, para garantir a aprovação de projetos ligados à pauta do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O PL é o partido com o maior número de deputados na Câmara — são 92. O número de apoiadores de pautas bolsonaristas na Câmara é estimado entre 140 e 150 dos 513 parlamentares. “Se o governo não entrar na parada, o que os deputados irão fazer? Fica mais fácil seguir a onda da internet para não perder voto”, conclui Pinato.
Governistas se dizem otimistas que podem impedir a tramitação das proposições. Na leitura desses deputados, derrubar os textos ainda na CCJ seria mais custoso do que nas comissões especiais e no plenário.
De acordo com Hélder Salomão (PT-ES), que participou das negociações na CCJ, a agenda está intensa até fevereiro do próximo ano, quando haverá a sucessão de Lira na presidência da Câmara. “A gente tem dúvida se isso vai prosperar e chegar a ser apreciado no plenário. Estamos num momento delicado, com segundo turno, sucessão do Lira. Tudo isso dificulta as articulações para que essas matérias prosperem”, afirma.
Caso as iniciativas, prosperem, ele avalia que é possível que o próprio STF derrube as propostas. “Se em último caso isso acontecer, nós já denunciamos a inconstitucionalidade dessas matérias”, diz.
A negociação se dará no colégio de líderes. Petistas querem intensificar os diálogos para derrubar as propostas na próxima semana, mas isso depende se o próprio Lira convocará sessões ou não.
Deputados do governo desejam que haja discussão já nos próximos dias, enquanto parlamentares do Centrão afirmam que a Câmara só deverá retomar as atividades no final de outubro, após o segundo turno. Ainda não há definição sobre quando haverá nova agenda na Casa.
Desse modo, cresce a pressão sobre o governo. No Congresso, ainda falta votar neste ano a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que aguarda a definição sobre o acordo das emendas, e o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA). Ainda há a possibilidade de da Câmara ainda votar projetos complementares da reforma tributária se as matérias voltarem do Senado.
O líder do União na Câmara, Elmar Nascimento (União-BA), já fez acenos para o governo. No dia anterior à votação do pacote que atinge o STF, o partido dele orientou pela obstrução ao projeto de lei que trata da anistia aos presos do 8 de janeiro.
Elmar é um dos postulantes à presidência da Câmara. Há alguns meses, ele era o favorito e contava com o apoio de Lira, a quem chama de amigo, mas acabou vendo o presidente da Casa o preterir para apoiar Hugo Motta (Republicanos-PB), nome tido como mais consensual, com poucos desafetos.
O pacote que atinge o Supremo envolve duas propostas de emenda à Constituição (PEC) e dois projetos de lei. Uma PEC quer limitar as decisões monocráticas (tomadas por um só ministro) e a outra daria o poder ao Congresso de sustar uma decisão do Supremo. As duas outras proposições aumentam as possibilidades para se admitir um processo de impeachment contra um magistrado.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.