Os relatos de bastidores já davam conta da irritação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tanto com o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, quanto com o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, pela condução da crise gerada com o não pagamento de dividendos extraordinários pela estatal. Ficou visível, no entanto, a falta de paciência de Lula com o ministro em um evento na quarta-feira, 14, em Serra do Salitre (MG). Enquanto Silveira rasgava elogios ao presidente, Lula coçava o bigode, cacoete a que recorre em situações de nervosismo.
Quando chegou a hora de discursar, Lula mal se referiu a Silveira. Falou dos outros ministros presentes repetidamente. Sem citar o nome, lembrou do de Minas e Energia apenas no final, em tom de bronca: “Ele [Silveira] não falou os números aqui, mas o que está projetado em investimento em energia renovável no Brasil são R$ 220 bilhões. É um montante de dinheiro que nem ele acredita que vai ser investido neste País”.
Não é só com Silveira que Lula está bravo. No fim do dia de ontem, Prates também teve que se explicar no X, antigo Twitter, e dizer que o conselho da Petrobras tomou a decisão sobre os dividendos “orientado pelo presidente da República e pelos seus auxiliares diretos, que são os ministros”. Parece que ele está se isentando da culpa, mas é o contrário.
De acordo com auxiliares, Lula ficou irritado justamente porque não ficou claro, desde o começo, que era sim, dele, a determinação de não distribuir os dividendos. Que trata-se de uma decisão deliberada de usar os recursos em outros destinos, como o próprio presidente defende desde antes da eleição. Enquanto o mercado e os investidores estão preocupados com ingerência política na empresa, o governo quer mais é deixar claro quem manda.
Silveira e Prates não se entendem e há quem diga que a paz só reinará no setor quando um dos dois deixar o cargo. Para acalmar a situação, Lula chamou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que atuou como bombeiro. Não foi a primeira vez. Haddad inclusive assumiu o papel de negociador principal com o Congresso e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) em temas como a reforma tributária quando este não se entendia com a articulação política do governo. (Depois Haddad e Lira brigaram, mas essa já é outra história).
Acontece que o posto de apagador de incêndios de Haddad tem prazo de validade. O ministro pode até ter ganhado pontos no episódio - e, de quebra, levou uma cadeira no conselho de administração da Petrobras para a Fazenda. Ele estava precisando, andava em baixa depois de perder batalhas como a da reoneração da folha de pagamentos e da manutenção do Perse, o programa de benefício tributário para o setor de eventos.
Mas Haddad tem pela frente uma luta já antecipada por Lula, que disse que, com a arrecadação aumentando, quer gastar mais. Isso somado à popularidade do presidente em queda nas pesquisas e à vontade de o PT eleger prefeitos nas eleições de outubro. A pressão para o ministro abrir as mangueiras será grande.
Popularidade
Como mostrou a última coluna, o governo já vinha preocupado com pesquisas internas e, mesmo antes da divulgação dos levantamentos dos principais institutos, buscava criar programas sob medida para atrair brasileiros que avaliam a administração Lula como regular. A recente sequência de pesquisas mostrando queda na popularidade do presidente só aumentou a urgência de tirar as ideias do papel e atrair esse público.
No discurso em Serra do Salitre (MG), Lula falou de improviso, mas também seguiu o roteiro traçado pela sua equipe. Citou as benesses do agro brasileiro - quer se aproximar do setor. Lembrou o lançamento de novos institutos federais de educação - quer melhorar a avaliação entre os jovens - e das escolas integrais para crianças - mirando mulheres, muitas evangélicas, grupo que também preocupa o governo. Aparentemente, esse será o mote dos discursos do presidente dos próximos meses.
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