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Bastidores da política que movimentam a economia

Opinião|Lula terá coragem de enfrentar meio trilhão de reais em renúncias tributárias?

Trata-se de uma bomba que vem crescendo há anos e nada silenciosamente, sob o alerta de sucessivos ministros da Fazenda e órgãos de controle. Terá o presidente coragem de cortar benefícios?

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Foto do author Lorenna Rodrigues

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva ficou “extremamente mal impressionado” com o volume de renúncias fiscais no Brasil. Aparentemente, ele só descobriu na última segunda-feira, 17, o tamanho do chamado gasto tributário, o tanto que o País deixa de arrecadar ao permitir que determinados grupos ou setores não paguem impostos por diversos motivos, uns nobres, outros nem tanto.

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Trata-se de uma bomba que vem crescendo há anos e nada silenciosamente, sob o alerta de sucessivos ministros da Fazenda e órgãos de controle. Há um capítulo no projeto de lei orçamentária de cada ano dedicado aos gastos tributários, presidente, caso o senhor queira acompanhar. Neste ano, a previsão é que o valor chegue a R$ 523,715 bilhões. Para se ter uma ideia do crescimento, há cinco anos, a estimativa era de R$ 306,4 bilhões.

Em entrevista à Rádio CBN nesta semana, Lula disse que os ricos tomaram conta do Orçamento. “É muita isenção, muita desoneração, muito benefício fiscal”, afirmou. “Você vai tentar jogar isso em cima de quem? Do aposentado, do pescador, da dona de casa, da empregada doméstica?”

O presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva participa de reunião com reitores de Universidades e Institutos Federais no Palácio do Planalto em Brasília. FOTO: Wilton Júnior/Estadão Foto: Wilton Júnior/Estadão

O discurso é muito bonito, mas a questão é, terá o presidente coragem de cortar benefícios? Quais? Reportagem do Broadcast destrinchou os gastos tributários e mostrou que grande parte deles são daqueles considerados “imexíveis” - para lembrar a expressão cunhada pelo ex-ministro do Trabalho e Previdência de Fernando Collor, Antônio Magri.

Para começar, 24% das renúncias são com o Simples Nacional. Lula vai passar longe de mexer aqui, pelo contrário. A pressão das empresas e do Congresso é por aumentar o limite do faturamento que pode ser enquadrado no Simples, o que só elevaria o gasto tributário com o programa.

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Em seguida no ranking, vem algo que o presidente citou nominalmente na entrevista nesta semana: o setor agrícola. São R$ 58,9 bilhões, ou 11,25% que o governo deixa de arrecadar.

Mas é factível imaginar que o governo cortará incentivos para o agro, o primeiro a “gritar” contra a MP que restringiu a compensação do PIS/Cofins, tirada da cartola de Haddad para compensar a desoneração da folha de pagamentos? Que tem uma bancada enorme e forte no Congresso Nacional? E que emprega e produz?

Os industriais reclamam que recebem menos incentivos que o setor agrícola, mas há diversos regimes específicos para a indústria na tabela dos benefícios, que, imagina-se, também não serão alvo do presidente, como o do setor automotivo e a “imexível” Zona Franca de Manaus, responsável por R$ 32,7 bilhões em renúncias neste ano.

Há pontos já endereçados pelo governo e em tramitação no Congresso Nacional, como a tributação de lucros e dividendos. Os rendimentos isentos e não tributáveis do Imposto de Renda da Pessoa Física respondem por R$ 51,3 bilhões em renúncias. Parte desse valor poderia ser reduzida com a taxação dos lucros e dividendos, pretendida tanto pelo ministro liberal da Economia Paulo Guedes, quanto pelo atual da Fazenda no governo petista, Fernando Haddad.

As mudanças no Imposto de Renda são, inclusive, a segunda etapa da reforma tributária pretendida por Haddad, mas enfrenta grande resistência no Congresso. O Legislativo, aliás, vem atuando no sentido contrário e aprovando novos benefícios - nesta quarta-feira, 19, o Senado autorizou R$ 18,3 bilhões para o hidrogênio verde. Não é o que quer Lula, mas na hora de cortar, é mais fácil a corda arrebentar para o lado dos pescadores.

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Opinião por Lorenna Rodrigues

Editora do Broadcast, serviço de notícias em tempo real do Grupo Estado, em Brasília, e colunista do Broadcast e Estadão. Jornalista desde 2006, especialista em Orçamento e Gestão Pública e em Desenvolvimento Econômico. Responsável por coberturas como das emendas Pix e de investigações de fraudes no cartão de vacina do ex-presidente Jair Bolsonaro.

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