BRASÍLIA – O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, classificou nesta quarta-feira, 8, os ataques antidemocráticos do 8 de Janeiro como um “movimento subterrâneo” que articulava um golpe de Estado após a vitória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na eleição de 2022. O discurso foi lido pelo vice-presidente da Corte, ministro Edson Fachin, na cerimônia realizada no Palácio do Planalto, em memória da depredação dos prédios dos Três Poderes em 2023.
“Os atentados de 8 de Janeiro foram a face visível de um movimento subterrâneo que articulava um golpe de Estado. Foi a manifestação de um triste sentimento antidemocrático agravado pela intolerância e pela agressividade. Um desencontro político e espiritual com a índole genuína do povo brasileiro”, disse o presidente do STF.
Diante da pressão feita por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por uma anistia aos envolvidos no vandalismo em Brasília, Barroso disse que a responsabilização dos envolvidos é necessária para a “maturidade institucional”. “Relembrar esta data com a gravidade que o episódio merece constitui também um esforço para virarmos a página, mas sem arrancá-la da história. A maturidade institucional exige a responsabilização por desvios dessa natureza”, afirmou.
O presidente da Corte ainda chamou de “falsas” as narrativas de aliados do ex-presidente que tentam associar a punição aos vândalos com a ascensão de um autoritarismo judicial. “É o disfarce dos que não desistiram das aventuras antidemocráticas, com violação das regras do jogo e a supressão de direitos humanos.”
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Fachin completou o discurso de Barroso afirmando que o STF teve um “papel decisivo” na defesa da democracia. O magistrado, porém, ressaltou que o papel do Supremo não é de protagonismo e defendeu a autocontenção da Corte.
“A Constituição estabeleceu que o jogo é o da democracia e, numa democracia, não cabe ao árbitro construir o resultado. O juiz não pode deixar de responsabilizar quem violou as regras do jogo, mas não lhe cabe dizer quem vai ganhar”, disse o vice-presidente do Supremo.
Lula também discursou nesta quarta e, seguindo a linha de Barroso, o presidente prometeu que os responsáveis pela depredação dos prédios públicos serão punidos e disse que será intransigente na defesa da democracia. O presidente também afirmou que amantes são mais apaixonados pelas mulheres do que maridos, se referindo ao apreço dele pela democracia.
Além dos discursos, a cerimônia desta quarta foi marcada pela reintegração de obras de arte restauradas após os ataques antidemocráticos. Entre elas, um raro relógio do século XVII, trazido ao Brasil por D. João VI em 1808. Como mostrou o Estadão, a peça foi recuperada na Suíça sem custos para o governo brasileiro a tempo para a comemoração. Criado por Balthazar Martinot, relojoeiro do rei Luís XIV, o relógio, que possui apenas dois exemplares, havia sido destruído em 2023.
Lula também desceu a rampa do Planalto, acompanhado de autoridades, para participar do “Abraço da Democracia”. O ato simbólico na Praça dos Três Poderes contou com a presença de representantes do Executivo, do Legislativo, do Judiciário, de movimentos sociais e da militância de esquerda.
Leia o discurso de Barroso na íntegra
“Os atentados de 8 de Janeiro foram a face visível de um movimento subterrâneo que articulava um golpe de Estado. Foi a manifestação de um triste sentimento antidemocrático agravado pela intolerância e pela agressividade. Um desencontro político e espiritual com a índole genuína do povo brasileiro.
Relembrar esta data com a gravidade que o episódio merece constitui também um esforço para virarmos a página, mas sem arrancá-la da história. A maturidade institucional exige a responsabilização por desvios dessa natureza.
Ao mesmo tempo, porém, estamos aqui para reiterar os nossos valores democráticos, nossa crença no pluralismo e no sentimento de fraternidade. Há lugar para todos que queiram participar sob os valores da Constituição.
Não devemos ter ilusões. No Brasil e no Mundo está sendo insuflada a narrativa falsa de que enfrentar o extremismo e o golpismo, dentro do Estado de Direito, constituiria autoritarismo. É o disfarce dos que não desistiram das aventuras antidemocráticas, com violação das regras do jogo e a supressão de direitos humanos.
A mentira continua sendo utilizada como instrumento político naturalizado. Não virão tempos fáceis, mas precisamos continuar a resistir.”
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