Lula diz que País correu ‘sério risco’ de ter golpe após as eleições e chama Bolsonaro de ‘covardão’

Presidente faz primeira reunião ministerial do ano para cobrar da equipe o andamento de programas e ações no momento em que pesquisas indicam a queda de sua popularidade

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BRASÍLIA E SÃO PAULO – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou na abertura da reunião ministerial nesta segunda-feira, 18, que há clareza, a partir dos depoimentos dos ex-comandantes das Forças Armadas e de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), de que o País “correu sério risco de ter um golpe” após as eleições de 2022. Segundo Lula, a ruptura democrática não ocorreu por falta de apoio da cúpula militar e pelo ex-presidente ser um “covardão”.

“A gente já sabe o que aconteceu no mês de dezembro. Hoje, a gente tem clareza por depoimentos de gente que fazia parte do governo dele ou que estava no comando, inclusive, das Forças Armadas, de gente que foi convidada pelo presidente (Bolsonaro) para fazer um golpe”, disse o presidente.

Lula, presidente da República Foto: Wilton Junior/Estadão

“Então, se três meses atrás quando a gente falava em golpe parecia apenas insinuação, hoje nós temos certeza de que este País correu sério risco de ter um golpe em função das eleições de 2022″, afirmou.

Bolsonaro apresentou plano golpista, diz ex-comandante

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No mês passado, a Polícia Federal (PF) ouviu investigados e testemunhas sobre uma tentativa de golpe de Estado supostamente articulada por Bolsonaro e seus aliados. Na última sexta-feira, 16, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), derrubou o sigilo e os depoimentos se tornaram públicos.

As declarações do ex-chefe da Aeronáutica Carlos Almeida Baptista Júnior e do ex-comandante do Exército Marco Antônio Freire Gomes à PF narram os detalhes das reuniões em que o ex-chefe do Executivo teria tentado arregimentar as Forças Armadas em uma tentativa de se manter no Poder.

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Freire Gomes e Baptista Júnior, ex-comandantes das FA Foto: Marcos Corrêa/PR e Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Segundo Freire Gomes, Bolsonaro expôs a ele os argumentos jurídicos para a ruptura institucional, plano ao qual o então comandante não aderiu. Lula citou a resistência de alguns setores militares para que o golpe de Estado não fosse adiante e criticou o ex-presidente. “Não teve golpe não só porque algumas pessoas que estavam no comando das próprias Forças Armadas não quiseram fazer, não aceitaram a ideia do presidente, mas também porque o (ex) presidente é um covardão”, disse o presidente nesta segunda.

‘Preferiu fugir’, diz Lula sobre Bolsonaro

Lula afirmou ainda que Bolsonaro “preferiu fugir” para o exterior e, de lá, acompanhar o desenrolar dos fatos no País. “Ele (Bolsonaro) não teve coragem de executar aquilo que ele planejou, ele ficou dentro de casa aqui dentro do Palácio (da Alvorada) chorando quase que um mês e preferiu fugir para os Estados Unidos”, afirmou Lula. Segundo o chefe do Executivo, havia, de Bolsonaro, “a expectativa de que, de fora do País, o golpe poderia acontecer, porque eles financiaram as pessoas nas portas dos quartéis para tentar estimular a sequência do golpe”.

A ida de Bolsonaro para os Estados Unidos é dos pontos da investigação da PF. A quebra de sigilo bancário do ex-presidente demonstra que, prestes a encerrar a gestão, Bolsonaro fez uma transação de R$ 800 mil em 27 de dezembro de 2022 para os EUA. Segundo um documento obtido pela Revista Veja, os recursos teriam como objetivo assegurar a permanência do ex-presidente no exterior, para que, de lá, ele aguardasse “o desfecho da tentativa de golpe de Estado que estava em andamento”.

Ida de Jair Bolsonaro aos Estados Unidos no final de dezembro de 2022 é alvo de investigação da Polícia Federal Foto: Taba Benedicto/Estadão

“Nós sabemos que houve a tentativa de um golpe neste País”, disse Lula. “Quem tinha dúvida agora pode ter certeza de que por pouco a gente não voltou aos tempos tenebrosos neste País que as pessoas achavam que apenas com golpe, com a participação de alguns militares, poderiam ganhar o poder neste País. O povo foi mais sábio, foi mais corajoso.”

Primeira reunião ministerial do ano

Como mostrou o Estadão, esta primeira reunião ministerial do ano é para o presidente cobrar da equipe o andamento de programas e ações no momento em que pesquisas indicam a queda de sua popularidade. Nesta segunda-feira, Lula disse que o último ano foi de “recuperação” e que sabe que ainda falta muito a fazer naquilo que se comprometeu durante a campanha eleitoral.

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Lula faz a abertura da reunião ministerial ao lado do vice Geraldo Alckmin (PSB) e do ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa (PT) Foto: Foto: Ricardo Stuckert/PR

Ainda não está claro qual pode ser o impacto da avaliação do governo federal em relação às escolhas para prefeito e vereador, mas a gestão busca reverter os prognósticos negativos antes que o pleito se aproxime. Lula está à procura de uma marca para sua gestão neste ano de eleições municipais e tem consultado políticos e marqueteiros sobre como melhorar a comunicação do governo.

“Todo mundo aqui sabe que recuperar uma coisa estragada é mais difícil do que começar uma coisa nova. Todo mundo sabe a quantidade de obras em cada área que vocês pegaram, sobretudo na Saúde”, disse o presidente ao seu time. “Foi um trabalho hercúleo para recuperar tudo isso”, continuou.

O discurso do presidente foi permeado de críticas à gestão anterior. “Ele (Bolsonaro) nunca se preocupou em governar este País, ele nunca se preocupou com economia, ele nunca se preocupou com políticas de inclusão social, ele se preocupa em estimular o ódio entre as pessoas, estimular a mentira neste País”, afirmou.

Sobre os ministérios, o presidente falou em trabalhar para repor o dinheiro das pastas para que o País possa crescer nos próximos anos. “Vamos ter que fazer trabalho imenso para repor dinheiro em ministérios”, disse.

Lula critica uso da religião como instrumento político

O presidente também criticou o uso da religião como instrumento político, mostrando que o tema continua sendo uma preocupação do governo, que tem visto no eleitorado evangélico um grupo desafiador de se aproximar. “A gente não pode compreender a religião sendo manipulada da forma vil e baixa como está sendo neste País”, disse Lula, que também destacou a importância de a população apoiar o Estado Democrático de Direito.

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O eleitorado evangélico mostrou, ao longo dos últimos anos, uma proximidade maior com o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, e tem estado no mapa do atual governo como uma área de alerta.

Pesquisa Genial/Quaest divulgada no início do mês sobre o governo mostra uma queda na aprovação do trabalho do presidente Lula. A avaliação de governo também piorou. De acordo com a pesquisa, 34% avaliam como negativo (eram 29% em dezembro) e 35% como positivo (eram 36%).

Segundo o levantamento, os índices foram puxados principalmente pela opinião dos evangélicos no que diz respeito às declarações de Lula sobre o conflito entre Israel e Palestina. “A pior avaliação veio dos evangélicos, que respondem por 30% do eleitorado brasileiro, influenciado pelas declarações em que Lula comparou a guerra em Gaza com a ação de Hitler na Segunda Guerra Mundial”, diz o levantamento. A comparação foi considerada exagerada por 60% dos entrevistados e por 69% dos evangélicos.

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