BRASÍLIA – “Eu sofro muito”. Foi assim que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se referiu à demissão de mulheres na sua equipe. Em dez meses de mandato, foram três: Ana Moser, do Esporte; Daniela Carneiro, do Turismo, e Rita Serrano, da Caixa. Todas elas substituídas por homens.
Quando foi eleito, Lula anunciou 11 mulheres no primeiro escalão, o que não significava nem metade da Esplanada, então com 37 ministérios. Mas o bloco de partidos liderado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), logo exigiu mais e mais cargos para apoiar o governo no Congresso.
Mesmo com essa “confissão” de sofrimento ao ter de dispensar mulheres, Lula não deu o braço a torcer de que o Executivo virou refém do Centrão. Nem adotou o discurso da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, que rasgou o verbo no X (antigo Twitter) ao criticar “interesses políticos insaciáveis” do Centrão. Depois de pedir o comando da Caixa e da Funasa, o grupo agora quer obrigar o governo a pagar emendas parlamentares de comissões permanentes.
Em café da manhã com jornalistas, no Palácio do Planalto, Lula parecia treinado para responder a esse tipo de pergunta. Disse que precisava de votos no Congresso para governar e se referiu ao Centrão, mais uma vez, como se fosse uma “construção teórica” pairando sobre o prédio desenhado por Oscar Niemeyer.
No Salão Leste do Planalto, Lula conversou com 37 repórteres nesta sexta-feira, 27, dia em que completou 78 anos. Na sua certidão de nascimento, a data de aniversário é diferente: 6 de outubro de 1945. O presidente sempre disse, porém, que dona Lindu, sua mãe, relatava ter ocorrido um erro no cartório porque ele foi registrado muito tempo depois.
Da política à economia, passando pelo cenário internacional, Lula tratou de vários temas com desenvoltura, mas não deu pistas de suas próximas escolhas para o Supremo Tribunal Federal (STF) nem para a Procuradoria-Geral da República (PGR). Só disse que “está chegando a hora” de indicar os nomes.
Ao lado da primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, o presidente tomou apenas café puro e água, comeu uvas verdes e beliscou um pedaço de pão. Deixou intactos o bolo de cenoura com chocolate e os frios.
Mais magro, Lula demonstrava bom humor depois de uma cirurgia a que se submeteu, em 29 de setembro, para colocação de uma prótese no quadril por causa de uma artrose severa. Na ocasião, ele também fez um procedimento para retirada do excesso de pele nas pálpebras.
“Estou feliz”, afirmou o presidente, ao lembrar que as terríveis dores no quadril desapareceram. “Estou fazendo fisioterapia. Leva de seis a oito semanas para eu estar inteiro de vez.” Os médicos o proibiram de viajar de avião, antes desse período, para evitar trombose.
Ano eleitoral será de viagens pelo Brasil
O primeiro roteiro internacional será para a Cúpula do Clima (COP-28), a conferência global do clima promovida pela ONU em Dubai, nos Emirados Árabes. A COP-28 começa em 28 de novembro e vai até 10 de dezembro.
“Vamos fazer o lançamento de uma política de recuperação de terras degradadas. O Brasil tem por volta de 40 milhões de (hectares) de terras que podem ser recuperadas (para a gente) criar o que quiser, sem precisar derrubar nenhuma árvore”, disse Lula. Depois disso, ele passará na Alemanha para um debate com empresários. Planeja parar também na Arábia Saudita para fazer uma apresentação do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) a empresários e investidores.
Uma pesquisa Quaest divulgada na quarta-feira, 25, mostrou que, para 55% dos entrevistados, a quantidade de viagens internacionais de Lula é excessiva. De cada dez eleitores, seis (60%) afirmam que o presidente se dedica mais do que deveria à agenda fora do País. Mas, ao que tudo indica, ele não está preocupado com números de pesquisas.
Em 2024, porém, Lula promete percorrer o Brasil. Será ano de eleições municipais e tanto o PT como os partidos aliados vão querer uma “mãozinha” do chefe do Executivo nos programas de TV.
“O ano que vem vai ser inteiro de viagem pelos Estados brasileiros, de lançamento de obras do PAC, inauguração do ‘Minha Casa, Minha Vida’, de escolas técnicas, institutos federais e universidades nesse país”, afirmou ele.
Não é fácil, porém, que Lula suba em palanques ou grave para um aliado, deixando o outro para trás. Se candidatos do Centrão estiverem no jogo, então, nem se fala porque o emaranhado de interesses desse bloco de partidos – que reúne integrantes do PP, Republicanos, União Brasil e PSD – é o mais variado possível. Mas, como diz o presidente, nada disso está na mesa porque ele não conversa com o Centrão.
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