BRASÍLIA - O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidiu extinguir a Fundação Nacional da Saúde (Funasa) e dividir suas atribuições entre os ministérios da Saúde e de Cidades - comandado pelo MDB. O partido ficará responsável pelo setor que faz obras em saneamento e concentra a maior fatia do orçamento da fundação.
O Estadão apurou que parlamentares do MDB querem uma reunião com o ministro das Cidades, Jader Filho, e os ministros palacianos Rui Costa (Casa Civil) e Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais) para debater o destino da Funasa. O órgão é tradicionalmente disputado por partidos do Centrão, pela oportunidade de controlar um orçamento bilionário. Em 2022, mais de R$ 3,4 bilhões foram direcionados para a fundação.
A missão da Funasa é levar saneamento básico e água de qualidade aos brasileiros. Nas mãos do Centrão, o órgão se tornou um duto de escoamento do dinheiro do orçamento secreto. Durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a Funasa era área de influência do PSD. Os dois últimos chefes do órgão - Giovanne Gomes da Silva e Miguel Marques - foram indicados pelo deputado Diego Andrade (PSD-MG).
Familiar de político, coach, especialista em “análise sensorial de cachaça” e dono de restaurante self-service chegaram a assumir cargos de comando na fundação. Como mostrou o Estadão em uma série de reportagens em 2022, a Funasa chegou a fazer licitação de poços com indício de sobrepreço.
Neste domingo, 1, o governo Lula publicou uma medida provisória que extingue a Funasa e um decreto sobre a estrutura do Ministério das Cidades, que cria um departamento na pasta para tratar da extinção da fundação. A MP vale a partir do dia 24 de janeiro e estabelece que a Saúde ficará com “atividades relacionadas à vigilância em saúde e ambiente” e Cidades passará a controlar “demais atividades”.
“O Ministério da Saúde já há muito tempo, nas ações de vigilância, vinha realizando ações próximas ao que a Funasa vinha fazendo. Com esse decreto, ações de vigilância em saúde, que estava na Funasa, ficarão sob responsabilidade do Ministério da Saúde”, explicou a ministra da Saúde, Nísia Trindade nesta segunda-feira, 2.
“Todo o componente de saneamento ficará no Ministério das Cidades. Isso foi feito em um trabalho integrado entre os dois ministérios e vai ser positivo do ponto de vista das ações.”
A medida provisória é um dispositivo da Constituição que permite ao presidente da República tomar decisões com força de lei em casos de “relevância e urgência”. As determinações passam a valer no momento em que a medida é publicada e devem ser apreciadas pelo Legislativo. O Congresso Nacional tem o prazo de 60 dias, prorrogáveis por mais 60 dias, para apreciar o mérito da MP. Caso contrário, a medida provisória caduca.
O decreto do governo Lula sobre a Funasa estabeleceu que parte das atribuições da Secretaria-Executiva da pasta comandada por Jader Filho será “acompanhar e implementar a transferência das competências” da fundação para o Ministério das Cidades “e o seu processo de extinção”. Decreto publicado na edição do Diário Oficial da União criou o “Departamento de Extinção da Funasa” dentro do Ministério das Cidades.
O texto prevê que o novo setor deverá ser ocupado por ao menos cinco integrantes: diretor, coordenador-geral, coordenador, assessor técnico e assessor técnico especializado.
De acordo com o decreto, o novo departamento terá a função de executar a extinção do órgão hoje vinculado ao Ministério da Saúde e “adotar as medidas necessárias para que seja evitada a descontinuidade dos serviços à população prestados pela Funasa”.
A criação do departamento para extinguir o formato atual da Funasa representa um esvaziamento do Ministério da Saúde. Socióloga e ex-presidente da Fiocruz, Nisia Trindade foi escolhida para comandar a pasta e não tem ligação com partidos no Congresso, embora tenha a simpatia do deputado licenciado e ministro da SRI, Alexandre Padilha. Já a equipe do Ministério das Cidades avalia não faria sentido ter um órgão como a Funasa em outra pasta, visto que ministério chefiado por Jader Filho é quem centraliza a as ações federais sobre o saneamento.
A pasta das Cidades é uma das mais cobiçadas da Esplanada e foi alvo de intensa disputa nos últimos meses por partidos como PSB, União Brasil, PSD e MDB. O ministério também é o responsável pelo Minha Casa, Minha Vida, umas das principais vitrines sociais de apelo popular dos governos do PT.
Lula decidiu privilegiar o grupo hoje comandado pela senador Jader Barbalho e por seu filho, o governador Helder Barbalho, do MDB do Pará. A indicação foi feita na cota da bancada da Câmara. O Pará elegeu 9 dos 42 deputados federais do MDB na eleição do ano passado e Helder foi reeleito governador com mais de 70% dos votos válidos, a maior votação proporcional da disputa estadual de 2022. O MDB tem ainda Simone Tebet no Ministério do Planejamento, considerada cota pessoal de Lula e apoiada pelo presidente da sigla, Baleia Rossi, e Renan Filho no Transportes, indicado pela bancada do Senado.
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