ESPECIAL PARA O ESTADÃO – Jornais internacionais repercutiram falas feitas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante sua passagem pela China e Abu Dhabi, nos Emirados Árabes. Em tom crítico ao posicionamento do petista sobre a Guerra na Ucrânia, os periódicos destacaram acusação que Lula direcionou aos Estados Unidos e União Europeia. Declarações sobre o dólar americano e fortalecimento das relações diplomáticas entre Brasil-China também foram ressaltadas pelos jornais.
“A decisão da guerra foi tomada por dois países”, disse o presidente em entrevista coletiva. “O presidente Putin não toma iniciativa de parar, o Zelenski não toma iniciativa de parar, e Europa e Estados Unidos terminam dando uma contribuição para a continuidade dessa guerra”, afirmou.
Em reunião fechada com o presidente da China, Xi Jinping, na última sexta, 14, Lula afirmou que “ninguém vai proibir que o Brasil aprimore suas relações” com o país asiático. O presidente disse ainda que a visita à gigante chinesa de tecnologia Huawei, em Xangai, foi uma demonstração de que o Brasil “quer dizer ao mundo que não tem preconceito” nas suas relações comerciais.
Repercussão internacional
Dentre os jornais americanos, o The Washington Post destacou que viagem de Lula a Pequim acontece em um momento em que a relação dos Estados Unidos com a China “está cada vez mais tensa”. Segundo avaliação, a fala de Lula demonstra que o Brasil estaria ajudando a fortalecer o yuan, moeda chinesa. O periódico ainda pontua que Lula dá prioridade ao “pragmatismo” e ao “diálogo”, pouco preocupado com a possibilidade de contrariar Washington ou o Ocidente. A viagem, portanto, teria laços mais estreitos entre Brasil e China.
Já o portal CNN reiterou a fala de Lula em que o presidente cita a necessidade de o Estados Unidos parar de encorajar a guerra na ucrânia. Segundo eles, a viagem do petista marca uma nova relação entre os países, uma vez que viveu “momentos tensos” no governo de Jair Bolsonaro (PL). No entanto, “revela um distanciamento crescente das questões geopolíticas que preocupam o Ocidente”. A filial espanhola do veículo pontuou a defesa de Lula em criar um grupo de países para ajudar a mediar futuras conversas entre Rússia e Ucrânia.
O jornal France 24 reiterou a crítica de Lula ao dólar e ao Fundo Monetário Internacional (FMI). Para a imprensa francesa, Lula está priorizando o estabelecimento de acordos internacionais após o Brasil ter se isolado sob a gestão de Jair Bolsonaro. Além disso, o periódico destaca quando Lula diz que FMI está “asfixiando” a economia de certos países.
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Já os britânicos The Economist e o Financial Times fizeram uma avaliação mais crítica sobre o saldo da visita. O Financial Times diz que o Brasil “empresta sua voz” para reforçar o papel da moeda chinesa no comércio global, e destaca que o “apelo de Lula” em acabar com a dependência do dólar acontece no momento em que a China amplia seus esforços neste mesmo sentido. O jornal observa, no entanto, que qualquer tentativa do Brasil em rejeitar a moeda americana trará desafios a serem enfrentados.
Para a The Economist, Lula se “esforça demais” para desempenhar o papel de pacificador global, e que isso pode fazer com que o presidente corra “o risco de parecer ingênuo em vez de um estadista ancião”.
O jornal espanhol DW Español analisou o encontro de Lula e Xi Jinping como uma “visita quente na nova ordem geopolítica”. Um especialista ouvido pela reportagem observou que o acordo do Brasil com o país asiático para evitar o dólar ataca a hegemonia americana e diz que, se a prática se generalizar, pode colocar em perigo a capacidade coercitiva de Washington. Em outra análise, o jornal também destacou a fala de Lula sobre os Estados Unidos para de encorajar a guerra, e lembrou que alguns membros do governo americano o classificaram as declarações como “ultrajantes”.
O periódico El País, por sua vez, enfatizou o retorno do Brasil ao cenário internacional depois que as relações diplomáticas foram prejudicadas por Bolsonaro. Além de pontuar que a visita é fundamental em termos comerciais e políticos
O jornal francês La Tribune afirmou que Lula “denunciou” a onipotência do dólar nas negociações internacionais e enfatizou o acordo Brasil-China para que o comércio seja feito apenas em suas próprias moedas. No mesmo sentido, o Le Monde enfatizou a disposição do Brasil em adotar o câmbio com a China para o yuan e citou o apoio do País sobre o plano de paz para o conflito na Ucrânia. No entanto, observou que os “contornos permanecem nebulosos”.
Em tom crítico, o Huffpost Italia afirmou que foram feitas declarações “antiamericanas” por parte de Pequim, e que Brasil e China “nunca impuseram sanções financeiras à Rússia e ambos buscam se posicionar como mediadores. O jornal ainda afirmou que há “mais lágrimas dos BRICS sobre o papel dos EUA na guerra da Ucrânia”, e que o papel do EUA como impopular “no clube das economias emergentes” ficou mais evidentes pós visita de Lula a China.
A emissora Al Jazeera, uma das mais populares do mundo árabe, disse que ambos os líderes “enfatizaram a importância de uma relação bilateral em conversas destinadas a fortalecer o comércio”, e que encontro de Lula e Xi Jinping era amplamente esperada na capital chinesa.
Brics
Do outro lado, o portal We Are China pontuou que o encontro de ambos os líderes “terá influência no mundo” e irá desenhar um novo projeto para o desenvolvimento das relações bilaterais. O destaque foi para a fala de Wang Yi, diretor do Gabinete da Comissão de Relações Exteriores do Comitê Central do Partido Comunista da China, ao dizer que a visita do presidente brasileiro é um marco na história da China. Em outro momento, o veículo citou que tanto o Brasil quanto a China “defendem o multilateralismo e a imparcialidade e justiça internacional”.
Já o site de notícias russas RT disse que Lula afirmou que as nações em desenvolvimento devem se afastar do dólar americano em favor de suas próprias moedas, a fim de resistir ao domínio americano sobre o sistema financeiro global. A publicação ainda destacou a fala de Lula sobre os Estados Unidos de que país “deve parar de fomentar o conflito na Ucrânia e começar a procurar maneiras de solução pacífica entre Moscou e Kiev”.
Reação Institucional
Logo após a declaração de Lula, os Estados Unidos e a União Europeia rebateram as acusações sobre estarem “incentivando” a guerra entre Rússia e Ucrânia. O porta-voz de Segurança Nacional dos EUA, John Kirby, disse que é “profundamente problemático” como o Brasil abordou a questão. Segundo ele, “o Brasil está repetindo propaganda russa e chinesa sem olhar para os fatos.”
O porta-voz da Comissão Europeia, Peter Stano, disse que as ações do bloco não alimentaram o conflito e ainda enfatizou que a Rússia é a agressora. Do outro lado, o presidente da Representação Central Ucraniano-Brasileira, Vitório Sorotiuk, pediu em comunicado que o Brasil “não traia” as esperanças dos brasileiros descendentes de ucranianos que moram no País, e disse que Lula foi ingênuo em suas declarações. “Se ele quer ser imparcial e lutar pela paz na Ucrânia, ele tem de ter menos ingenuidade em relação à Rússia porque é um país que, tradicionalmente, não respeita acordos internacionais”, comentou.
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