Ana Carolina Oliveira prepara sua estreia no mundo político. Eleita vereadora pelo Podemos, a bancária e ativista de 40 anos mira em temas que lhe são caros. Mãe de Isabella Nardoni, assassinada em 2008 pelo pai e pela madrasta, engajou-se em ações contra a violência a crianças, adolescentes e mulheres. Quer tratar disso quando assumir a cadeira no Legislativo municipal. Nas eleições deste ano, obteve 129.556 votos, a segunda maior votação para o cargo, superada apenas por Lucas Pavanato (PL).
Ana Carolina conta que, desde o crime contra Isabella, recebe convites de partidos políticos para concorrer a cargos eletivos. Só aceitou um deles no primeiro semestre deste ano, com mais “preparo, maturidade e história de vida” do que outrora. A aproximação decisiva foi a de Renata Abreu, deputada federal e presidente nacional do Podemos. “Foi uma conversa mais profunda”, disse a vereadora eleita.
Na Câmara, pretende propor leis que forneçam assistência psicológica e jurídica a vítimas de violência. “É para que essas pessoas se sintam acolhidas e entendam que a violência não é um caminho”, disse a bancária, que também avalia propostas de estímulo ao empreendedorismo feminino. Segundo a vereadora eleita, essas pautas são alheias ao espectro político e “englobam todos os lados”.
“São pautas e questões que vão da direita à esquerda”, afirmou Ana, que também quer participar de comissões permanentes da Casa. “Quero ser uma vereadora ativa nas minhas atividades, em todas as posições que eu puder alcançar e atingir aqui dentro.”
A futura vereadora recebeu o Estadão no plenário 1º de Maio, da Câmara Municipal de São Paulo. Questionada sobre como se sente, prestes a assumir o mandato na Casa, Ana afirma que se trata de uma “enorme responsabilidade”. “Eu acho que esse voto de confiança foi uma forma que as pessoas viram, encontraram em mim, de poderem ser representadas”, disse a vereadora eleita. “Viram que eu era uma candidata real, que eu não estava ali somente para ter um cargo.”
Ao propor pautas de “todos os lados”, Ana Carolina vai ao encontro do perfil da sigla a que está filiada. Em maio, um estudo realizou um “raio X” do Centrão, como é chamado, no Congresso, o grupo de partidos sem delimitação programática clara. A pesquisa constatou que o Podemos é uma sigla do “núcleo duro” do Centrão, uma vez que atua sem ideologia nítida tanto na esfera legislativa quanto na eleitoral.
Esse voto de confiança foi uma forma que as pessoas viram, encontraram em mim, de poderem ser representadas. Viram que eu era uma candidata real, que eu não estava ali somente para ter um cargo
Ana Carolina Oliveira, vereadora eleita de São Paulo
A ativista, contudo, reitera que será orientada por “propostas da sociedade”, sem amarras a uma ou outra ideologia. “Não é estar em cima do muro”, disse. “Não quero saber se uma mãe que venha me procurar é de esquerda ou de direita. Quero saber qual é a causa dela e o que ela está precisando no momento. Enquanto a gente se mantiver nessa polarização, vamos criar muitas dificuldades para chegar nos resultados positivos que a gente quer.”
A eleição para cargos do Legislativo, com exceção do Senado, ocorre por meio do sistema proporcional. Na prática, cada candidato compete não apenas por si próprio, mas também pela sigla a que está filiado. Sem bandeiras programáticas claras, é comum que legendas do Centrão busquem a personalização do pleito, o que ocorre tanto pela ação de líderes locais, ligados aos territórios, quanto pelo lançamento de “puxadores de voto” – personalidades de apelo midiático que atraiam votos para o partido. A boa votação de Ana Carolina, por exemplo, beneficiou o candidato Kenji Ito, conhecido como “Kenji Palumbo”, que obteve 32.495 votos e não se elegeria em um cenário sem a ativista na chapa da legenda.
Enquanto a gente se mantiver nessa polarização, vamos criar muitas dificuldades para chegar nos resultados positivos que a gente quer
Ana Carolina Oliveira, vereadora eleita de São Paulo
Ana Carolina, por sua vez, reforça que se candidatou não por conveniência do partido que a convidou. “Quando você vive uma história na pele, quando você está dentro dela, você consegue falar com mais propriedade de causa sobre aquele assunto”, disse, definindo a política como um meio de “dar voz” a vítimas e familiares afetados pela violência.
O Podemos conquistou seis assentos na Câmara paulistana, a terceira maior bancada da nova legislatura, empatada com a do PSOL, e integra a base do prefeito reeleito Ricardo Nunes (MDB). “O apoio a ele foi o que fez sentido diante das opções que tínhamos. Dou meu voto de confiança ao prefeito para que, com os projetos e as pautas que eu tenho, a gente possa caminhar em conjunto”, afirmou Ana.
Duas iniciativas da Prefeitura contam com o apoio dela: a ampliação do horário de funcionamento das creches e o “Mamãe Tarifa Zero”, anunciado pela campanha de Nunes como uma ampliação do “Domingão” de gratuidade dos ônibus municipais. O programa será destinado a mães inscritas no CadÚnico que utilizam o transporte para levar e buscar seus filhos nas creches. Sobre a extensão da gratuidade nos ônibus para outros públicos, contudo, a futura vereadora é reticente. “A gente precisa ter hoje uma grande responsabilidade em relação ao orçamento, não é só tudo ser de graça, isso tudo custa”, disse.
A tarifa zero foi um dos temas que mais despertou a atenção do eleitor paulistano ao longo da campanha eleitoral, como mostrou o Termômetro Agenda SP, iniciativa do Estadão em parceria com o Google Trends. Quanto a outros temas de destaque durante a campanha, Ana diz ser favorável à ampliação das atribuições da Guarda Civil Metropolitana (GCM), incluindo maior escopo armado. “Eles são preparados e capacitados para isso. A GCM, hoje, exerce um papel muito importante”, afirmou a ativista.
Além disso, a vereadora eleita diz ser a favor de políticas habitacionais, mas contra invasões de movimentos por moradia: “A invasão a locais que não são seus já começa errada”. Além disso, é cética quanto a internação compulsória de dependentes químicos na Cracolândia. “É um problema muito sério e muito grave. A droga não é algo que você trata com um simples remédio ou uma simples consulta numa terapia.”
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