BRASÍLIA — Sem um partido definido e sem palanques competitivos nos principais colégios eleitorais do País, o presidente Jair Bolsonaro estará ainda mais dependente das redes sociais no ano que vem que em 2018 — uma arena na qual seus principais adversários avançaram desde a última disputa e diminuíram a diferença nos engajamentos.
Mesmo investigado no Supremo Tribunal Federal (STF) por divulgar notícias falsas, Bolsonaro ainda é, de longe, o político brasileiro com o maior alcance nas redes sociais. No Twitter, por exemplo, ele tem 7,14 milhões de seguidores: é quase a soma do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com 2,8 milhões; do ex-juiz Sergio Moro (Podemos), que tem 3,3 milhões; e que o ex-ministro Ciro Gomes (PDT), com 1,2 milhão.
Bolsonaro também está à frente nas interações, que é a quantidade de comentários, compartilhamentos ou "curtidas" que os posts recebem. Neste ano, o presidente teve 458 mil interações, enquanto o petista teve 123,2 mil. Mas essa vantagem já foi maior e está diminuindo.
A pedido do Estadão, a consultoria digital Bites compilou dados históricos sobre o desempenho do presidente e de seu principal adversário, Lula. Ao longo do ano de 2019, Bolsonaro teve 732,8 milhões de interações em seus perfis no Twitter, no Instagram e no Facebook — quase 13 vezes mais que as 56,6 milhões de interações do petista. De lá para cá, a diferença reduziu de forma expressiva: em 2021, até agora, Bolsonaro teve 3,7 vezes mais interações que Lula.
“A vantagem do presidente Bolsonaro já foi muito maior, como os números mostram. O indicativo que a gente vê aqui é uma recuperação do ex-presidente Lula em função de um entendimento melhor que a militância dele passou a ter do uso de redes sociais. Claramente, a militância de Lula e do PT está se digitalizando. Por isso, essa diminuição da diferença, especialmente no número de interações”, diz Manoel Fernandes, diretor-executivo da Bites.
A mesma comparação não é possível no caso do ex-juiz Sergio Moro — embora ele também esteja crescendo com rapidez nas redes. Recém-filiado ao partido Podemos, ele aparece como o terceiro colocado nas pesquisas de intenção de voto, atrás de Lula e de Bolsonaro,em empate com Ciro Gomes (PDT). Além de não ser candidato em 2018, o então juiz nem sequer tinha presença online: a conta do Twitter, por exemplo, é de abril de 2019. O perfil no Instagram, onde ele soma 2,5 milhões de seguidores, é ainda mais recente: foi criado em janeiro de 2020.
Segundo o secretário nacional de comunicação do PT, o ex-deputado Jilmar Tatto, o crescimento de Lula nas redes se deve à mudança da conjuntura política, com a soltura do ex-presidente e a volta dos direitos políticos dele por decisão do STF. “Em 2019, Lula estava preso (o ex-presidente só deixou o cárcere em 8 de novembro daquele ano) e o PT estava numa situação muito fragilizada, e isso se refletia nas redes sociais (...). Nós estamos nos preparando para 2022 desde o ano passado”, disse Tatto.
O desempenho de Bolsonaro nas redes sociais foi determinante para o sucesso dele em 2018. Mas outros recursos — como o tempo de rádio e TV e os palanques estaduais — poderão voltar a ter grande peso na disputa do ano que vem, diz o cientista político Bruno Carazza. “Se tem uma lição que dá para tirar (da eleição municipal) de 2020 é que a política tradicional voltou. Os partidos que se deram bem foram justamente os partidos bem estruturados, com diretórios organizados, que tinham candidaturas competitivas. E sobretudo dinheiro. Com o aumento dos fundos Partidário e Eleitoral, você tem muito mais condições de fazer campanha, inclusive nas redes. Campanha nas redes não é de graça. Impulsionar conteúdo é caro. As redes se tornaram um palco muito importante, mas são apenas um dos componentes”, diz Carazza, que é professor do Ibmec e da Fundação Dom Cabral.
Estados
No campo da política tradicional, as dificuldades do presidente ficaram evidentes no dia 14, quando o Partido Liberal adiou por tempo indeterminado a filiação de Bolsonaro, prevista inicialmente para esta segunda (22). Ao longo da semana, porém, o presidente da sigla, o ex-deputado Valdemar Costa Neto, conversou com dirigentes estaduais e conseguiu o compromisso de que as convenções partidárias não resultarão no apoio a outros presidenciáveis além de Bolsonaro. Assim, embora ainda sem data certa, a filiação ao PL é provável.
Na quinta-feira (17), após uma reunião de Valdemar com os chefes regionais do PL em Brasília, o partido publicou nota na qual dizia estar “pronto e alinhado” para receber Bolsonaro, “em todos os Estados”. “O presidente nacional do Partido Liberal, Valdemar da Costa Neto, tem carta branca para decidir sobre a sucessão presidencial e a filiação do presidente Jair Bolsonaro”, dizia o texto.
Segundo o Estadão apurou com pessoas presentes à reunião, as principais resistências estavam nos diretórios de Alagoas, Piauí, Bahia e São Paulo — neste último, o partido tinha fechado o compromisso de apoiar o candidato do PSDB ao Palácio dos Bandeirantes, o atual vice-governador do Estado, Rodrigo Garcia.
Nos outros três Estados, o problema era a ligação dos atuais dirigentes do PL a governadores anti-bolsonaristas. Na Bahia, o partido integra a base do governador Rui Costa (PT); no Piauí, o partido é comandado pelo deputado estadual Fábio Xavier, atual secretário de Cidades do governo de Wellington Dias (PT). Em Alagoas, o partido é comandado pelo ex-deputado Maurício Quintella Lessa, hoje titular da secretaria de Infraestrutura no governo de Renan Filho (MDB). Assim como o pai, o senador Renan Calheiros (MDB-AL), o governador faz oposição a Bolsonaro.
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