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Marçal domina interações na campanha e contas são usadas como trampolim para ‘Jogo do Tigrinho’

Análise de 781 mil resultados para a busca por #pablomarçal no Instagram identificou centenas de perfis de divulgação de plataformas de caça-níqueis digitais; procurada, campanha do candidato do PRTB não se manifestou

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Foto do author Guilherme Caetano
Atualização:

BRASÍLIA - Mesmo com os perfis oficiais suspensos pela Justiça Eleitoral, Pablo Marçal (PRTB) tem nove de cada dez interações digitais entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo. O predomínio do ex-coach no Instagram, no qual conquistou 5,4 milhões de seguidores em cinco semanas, vem atraindo contas suspeitas de conteúdo alheio ao pleito eleitoral.

A partir de uma análise de 781 mil resultados para a busca por #pablomarçal, pesquisadores da USP que vêm monitorando o debate digital na eleição paulistana identificaram centenas de perfis de divulgação de caça-níqueis online, como o Jogo do Tigrinho, e venda de seguidores tentando se associar à imagem do ex-coach. Procurada, a campanha do PRTB não se manifestou.

Hashtags ligadas ao candidato Pablo Marçal (PRTB) geram de oito a 270 vezes mais buscas no Instagram que seus adversários Foto: Werther Santana/Estadão

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As informações constam no relatório quinzenal (entre 30 de agosto e 13 de setembro) do “Monitoramento das Eleições Municipais de 2024″, coordenado por um grupo interdisciplinar de pesquisadores da USP (leia aqui a íntegra do estudo). O projeto extraiu dados de cinco mídias sociais (Instagram, Facebook, TikTok, YouTube e X, antes de ser derrubado no Brasil por ordem do Supremo Tribunal Federal), em perfis dos candidatos à Prefeitura de São Paulo, comunicadores ligados às campanhas, veículos de comunicação e candidatos à Câmara Municipal.

Cassinos online, sites de apostas e jogos similares vêm despertando preocupação em autoridades enquanto dados começam a revelar o tamanho desse mercado no País. Neste ano, as apostas esportivas devem movimentar R$ 240 bilhões, segundo estudo recente do Banco Central. Além do possível envolvimento de casas de apostas em esquemas de lavagem de dinheiro, a prática é alvo de críticas por levar brasileiros ao vício e à penúria financeira.

Os pesquisadores avaliam que, dada a popularidade de Marçal nas redes, esses perfis de jogos lançam mão de uma estratégia para atrair seguidores e interações para esses perfis. Esse tipo de conteúdo começou a ser sugerido pelo Instagram aos usuários, aponta o estudo. Tratam-se em geral de perfis com fotos de mulheres de biquíni, baixo número de seguidores e comentários, links para sites suspeitos e muitas publicações sobre caça-níqueis virtuais e promessas de renda fácil.

Perfis de caça-níqueis online usam hashtag de Pablo Marçal para alcançar audiência Foto: Reprodução/ Instagram

No fim de setembro, as hashtags ligadas ao candidato do PRTB geravam de oito a 270 vezes mais buscas no Instagram que seus adversários: #pablomarcal (815 mil), #pablomarçal (581 mil), pablomarcal1 (335 mil), #datena (103 mil), #ricardonunes (77 mil), #boulos (50 mil), #guilhermeboulos (31 mil), #tabataamaral (10 mil), #marinahelena (3 mil).

A análise das interações (curtidas, comentários e compartilhamentos) nos perfis oficiais de Marçal, Guilherme Boulos (PSOL), Tabata Amaral (PSB), Marina Helena (Novo), Ricardo Nunes (MDB) e José Luiz Datena (PSDB) mostra também uma maioria esmagadora do candidato do PRTB: 89% do total. O ex-coach tem um grupo entre centenas e milhares de contas anônimas de apoio, cultivadas desde antes do período eleitoral, que ajuda a turbinar sua popularidade digital.

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“O repentino crescimento dos perfis ‘reserva’ de Marçal, sobretudo no Instagram, é algo que merece atenção, pois distorce o cenário da disputa eleitoral. O Instagram é atualmente a plataforma mais utilizada no Brasil, especialmente para a promoção e venda de produtos e divulgação de sites e jogos de apostas. A referência a Marçal impulsiona fortemente a visualização dos perfis a ele associados, e o uso de hashtags é uma estratégia fundamental nesse processo”, diz o relatório.

A socióloga Natasha Bachini, pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da USP e uma das coordenadoras do estudo, diz não ter identificado o uso de hashtags de outros candidatos por contas suspeitas como estratégia de impulsionamento do conteúdo desses perfis, e que isso parece se associar ao espectro ideológico da direita.

“Verificamos também o uso das hashtags #bolsonaro e #elonmusk, outras figuras muito populares nas redes, sobretudo entre os usuários alinhados à direita e à extrema-direita, o que sugere que tais canais têm como alvo um público específico, simpatizantes desses atores e seu discurso”, diz ela.

Para Natasha, uma das razões do desempenho de Marçal é fato de o candidato ter construído sua imagem na internet antes de ingressar na vida pública, como ex-coach e influenciador digital, de modo que transferiu sua popularidade do campo motivacional para o político. Outra é o eficiente uso dos reels, vídeos curtos que viralizam com maior facilidade nas redes.

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“Por não vir da política partidária-institucional, ele capta os anseios antissistêmicos e se coloca como uma autêntica novidade na política. Além disso, sua narrativa condensa elementos do neoliberalismo e do neoconservadorismo presentes na narrativa bolsonarista, que vem predominando no campo da direita nos últimos anos e responde a parte significativa das preocupações e sentimentos da população, empobrecida, insegura e religiosa. Assim, a partir de uma linguagem jovem e mais informal, ele se apresenta como homem bem-sucedido, próspero, que enriqueceu por mérito próprio, de fé, que zela pela família e defende o ‘cidadão de bem’, com todas as armas”, afirma.

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