Marçal rejeitado, Nunes sem empolgar e Boulos com voto estabilizado: a reação de eleitores ao debate

Pesquisa qualitativa feita pelo Instituto Travessia a pedido do ‘Estadão’ mostrou dificuldades do prefeito para mobilizar apoio e rejeição elevada ao ex-coach; na avaliação do grupo, Tabata teve o melhor desempenho entre os candidatos

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Foto do author Zeca  Ferreira

Um debate morno e sem grandes emoções, mas que confirmou o voto cristalizado de Guilherme Boulos e expôs as fragilidades do prefeito Ricardo Nunes (MDB) e do ex-coach Pablo Marçal (PRTB). Esse foi o resultado de uma pesquisa qualitativa do Instituto Travessia, realizada nesta quinta-feira, 4, com um grupo de eleitores que assistiram ao debate da TV Globo entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo.

O Estadão acompanhou a dinâmica ao vivo, de dentro de uma sala de espelho. Participaram da pesquisa 16 participantes, com idades entre 25 a 65 anos, das classes B1, B2 e C1. A proporção de eleitores levou em conta os resultados das pesquisas mais recentes, garantindo um perfil equilibrado para cada candidato. O grupo foi selecionado pelo cientista político Renato Dorgan, CEO do Travessia.

Último debate dos candidatos à Prefeitura de São Paulo Foto: Reprodução TV Globo

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Três dos eleitores tinham tendência a votar em Guilherme Boulos na pesquisa estimulada (quando o eleitor escolhe a partir de uma lista de opções), outros três em Ricardo Nunes e mais três em Pablo Marçal. O grupo também incluía dois eleitores de Tabata Amaral (PSB), um de José Luiz Datena (PSDB), um de Marina Helena (Novo), além de três indecisos. Os participantes acompanharam o debate com três cartões em mãos, que podiam levantar a qualquer momento: o vermelho indicava reprovação, o amarelo sinalizava neutralidade e o verde expressava aprovação.

A fragilidade do eleitorado de Nunes e a alta rejeição de Marçal ficaram evidentes durante todo o debate. O prefeito não conseguiu se destacar em nenhum momento e falhou em empolgar até mesmo seus próprios apoiadores, que frequentemente flertavam com outros candidatos. Em nenhuma de suas falas houve uma onda de apoio expressiva, e as demonstrações de aprovação com o cartão verde foram pontuais e isoladas, mostrando a dificuldade do emedebista em mobilizar o eleitorado às vésperas da eleição.

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Nunes não foi considerado pelos eleitores do grupo como o candidato com a melhor performance em nenhum dos blocos do debate. Ao final, ele perdeu um eleitor para Tabata. Além disso, sempre que mencionava propostas de sua gestão, como a inauguração de UBS ou “a construção de mais 300 jardins de chuva”, as reações foram majoritariamente negativas. Em um momento específico, enquanto o prefeito falava sobre a situação da área da saúde na cidade, uma eleitora inclinada a votar em Marina Helena (Novo) chegou a chamá-lo de “mentiroso”.

O problema de Marçal é outro: a rejeição. Assim que o ex-coach aparece na tela da Globo, uma onda espontânea de cartões vermelhos se ergueu, deixando claro que o influenciador é quem mais desperta emoções no grupo —neste caso, negativas. Logo no início de sua fala, ao lamentar a morte do apresentador Cid Moreira, uma eleitora comentou em tom de brincadeira: “Ele é o marqueteiro dele mesmo”. Quando o influenciador falou “faz o M” pela primeira vez, outro eleitor retrucou: “sai fora”, e nove cartões vermelhos se levantaram. A declaração sobre a previsão de 28ºC no dia da eleição, fazendo uma referência ao seu número de urna, arrancou risadas do grupo.

'Estadão' acompanhou a pesquisa qualitativa em uma sala de espelho Foto: Alex Silva/Estadão

Ao contrário de Nunes, Marçal conseguiu um momento de destaque positivo no debate. Quando defendeu a implementação de educação financeira nas escolas e a criação de uma cultura de empreendedorismo, ele conquistou a simpatia de eleitores indecisos e que tendem a votar em Tabata Amaral, Ricardo Nunes, Datena e Marina Helena.

Marçal terminou o debate com o apoio de apenas um de seus três eleitores. Os outros dois acabaram o debate se declarando indecisos. As reações às suas propostas foram predominantemente negativas, e ele não venceu nenhum bloco do programa. “O Marçal vive em um mundo fantasioso”, criticou uma eleitora de Nunes. Já quando o ex-coach sugeriu trazer para o Brasil práticas adotadas nos Estados Unidos, uma eleitora indecisa rebateu: “Não dá para comparar os dois países, são realidades diferentes”. Algumas propostas de Marçal chegaram a ser vistas como cômicas. A maioria dos eleitores não só desaprovou a ideia de um teleférico, como também riu quando o ex-coach a mencionou.

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O caso de Camizungo

Dois momentos se mostraram sensíveis ao ex-coach: quando Ricardo Nunes disse que o influenciador prometeu fazer 300 casas em Camizungo, em Angola, mas só entregou 26. “Se não conseguiu fazer 300 casas com as doações que recebeu lá na África, como é que vai colocar algo de concreto aqui na nossa cidade”, disse o prefeito. O episódio gerou discussões no grupo, com alguns eleitores comentando que já tinham lido a respeito. “Acho que o Marçal melhorou nesse bloco, mas o Nunes quebrou as pernas dele quando falou sobre a África”, disse uma eleitora do atual prefeito. Antes de Nunes trazer o caso à tona, Marçal havia respondido a uma pergunta de Tabata sobre mobilidade.

Guilherme Boulos teve um bom desempenho no grupo. No segundo bloco, em que falou sobre a importância da cultura e citou a expansão de escolas em tempo integral, o candidato do PSOL foi o mais bem avaliado, com sete eleitores considerando sua performance a melhor.

O líder sem-teto conseguiu mobilizar até eleitores de Nunes, Marina Helena e Datena ao mencionar as filas para exames e consultas e a falta de remédios na rede municipal. No entanto, virou piada ao afirmar que não apoia a prática de rachadinha e que não aumentaria impostos na cidade, gerando reações de descrédito entre o grupo, com um de seus eleitores levantando um cartão vermelho quando o candidato do PSOL afirmou que rachadinha é crime e deve ser punida.

“Não acredito”, disse um eleitor sobre a declaração de Boulos de que não criaria novos impostos. Os dois indecisos duvidaram da promessa e levantaram cartão vermelho. Quando Tabata mencionou as mudanças de posicionamento do deputado nesta eleição, citando como exemplo as creches conveniadas, oito eleitores sinalizaram concordância com a sua crítica.

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Para Renato Dorgan, CEO do Instituto Travessia, os eleitores chegaram ao último debate com um certo cansaço em relação à dinâmica estabelecida nas eleições de 2024 em São Paulo. O debate da Globo rompeu com a lógica dos confrontos anteriores, que foram marcados por ataques mútuos e uma dose de agressividade além do convencional. Este debate, diz ele, foi mais equilibrado e positivo, porém, pela dinâmica imposta nos encontros anteriores, os eleitores tiveram a sensação de um confronto morno, sem grandes emoções. Quando instigados a definir o debate em uma única palavra, termos como “inconclusivo”, “razoável”, “ruim”, “sem graça” e “deprimente” foram algumas das respostas que apareceram.

“Em resumo, Boulos cristalizou ainda mais seu voto, mas segue sem conseguir furar sua bolha de eleitores. Nunes passou o tempo todo nas cordas, se defendendo de ataques contra seu governo, o que não lhe permitiu ter uma grande performance. Ele é visto como um político convencional, que não desperta paixões, o que dificulta convencer o eleitor indeciso nesta reta final. Já Marçal é visto como alguém fora da normalidade, e a maioria dos entrevistados não o leva a sério. Seus eleitores gostam dele pelo que ele vende: palavras e promessas de efeito. Porém, na dinâmica de hoje, um Marçal mais calmo e com certa vitimização não empolgou. Seus ataques pessoais não contagiaram tanto”, avalia o cientista político.

Para Dorgan, o voto do eleitor de Marçal parece ser silencioso. Ele aponta que os apoiadores do ex-coach se sentem constrangidos em manifestar apoio abertamente. Esse cenário pode indicar um voto oculto, em que o eleitor, ao notar a rejeição dos demais a Marçal, prefere se calar e muitas vezes afirma estar indeciso sobre em quem votar.

Tabata e Datena se destacam

Tabata foi elogiada ao longo de todo o debate, recebendo comentários positivos de eleitores de diversos candidatos, que se referem a ela como alguém preparada. Antes da dinâmica começar, dois participantes tinham tendência a votar nela, mas esse número subiu para cinco ao final. Ela conseguiu manter seus dois apoiadores e atraiu o voto de um eleitor de Nunes, um de Datena e um indeciso. Além disso, foi considerada pela maioria dos participantes a vencedora do primeiro e do último bloco, com oito e nove menções, respectivamente.

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“Tabata mostrou convicção e preparo. Venceu a maioria dos blocos do debate, com embates principalmente contra Marçal e Nunes, além de equilibrar a discussão com Boulos (um momento de alto nível do debate para muitos). No entanto, essa força demonstrada nos debates não parece ser suficiente para torná-la a principal candidata. Tabata sofre com os tempos modernos do rito eleitoral, com a propaganda eleitoral em queda de audiência e reduzida drasticamente a um tempo mínimo de 10 minutos diários”, diz Dorgan.

Para ele, a era dos debates espetaculosos, nos quais os confrontos midiáticos prevalecem em detrimento de discussões mais aprofundadas sobre temas de administração pública, também prejudicam Tabata, que acaba se destacando em um nicho mais sofisticado e intelectualmente engajado, preocupado com o futuro da cidade — um perfil que representa uma minoria dentro do espectro eleitoral. “Além disso, Tabata enfrenta uma certa resistência por ser uma mulher jovem e intelectualizada, com um perfil que transmite ares de menina — características que fogem ao arquétipo tradicional do eleitor paulistano.”

Além de Tabata, Datena também foi elogiado pelo grupo e apresentou um desempenho superior ao das participações anteriores, quando teve problemas com o tempo e chegou a gaguejar. Desta vez, sua evolução foi percebida pelos eleitores, que o consideraram o vencedor do terceiro bloco. Apesar da melhora, o tucano acabou perdendo seu único apoiador para Tabata Amaral. Ainda assim, conseguiu gerar reações positivas ao longo do programa.

Seus melhores momentos foram dois: primeiro, ao criticar a concessão dos cemitérios da capital à iniciativa privada pela gestão de Ricardo Nunes, destacando o aumento dos preços nos serviços funerários; e, depois, quando fez um discurso firme contra o extremismo político, seja de esquerda ou de direita. “Não tenho nada contra cara de esquerda, mas que jogue o jogo democrático, que tenha boas ideias. O cara de direita, que tenha boas ideias. Eu não tenho nada contra esse tipo de gente, mas quem usa violência da extrema esquerda e extrema direita, isso é muito condenável”, disse.

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