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As relações entre o Poder Civil e o poder Militar

A omissão dos líderes do Congresso diante da Abin paralela de Bolsonaro

‘Abin Paralela’ se tornou a própria Abin, e nenhum parlamentar da Comissão de Controle das Atividades de Inteligência percebeu ou indagou quando surgiram suspeitas de uso irregular da agência

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Foto do author Marcelo Godoy

O verdadeiro poder começa onde o segredo começa. “Quanto mais visível é uma agência governamental, menos poder ela detém e, quanto menos se sabe sobre a existência de uma instituição, mais poderosa ela é.” A conclusão de Hannah Arendt em Origens do Totalitarismo é conhecida, mas precisa ser lembrada.

Evento do PL com a presença de Jair Bolsonaro para pré-candidatura de Alexandre Ramagem a prefeitura do Rio, na quadra da Mocidade de Padre Miguel  Foto: Pedro Kirilos / ESTADAO CONTEUDO

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No escândalo da “Abin paralela”, o próprio nome parece encobrir a sua dimensão. Também nada se diz sobre o papel da Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência no Congresso (CCAI). Formada por 12 membros – seis senadores e seis deputados – indicados pela maioria e pela minoria –, a comissão não passou perto dos desvios da agência de inteligência. No governo Bolsonaro, a CCAI teve como presidentes Fernando Collor e Aécio Neves. E, hoje, quem a preside é o senador Renan Calheiros, um dos alvos da arapongagem “paralela”.

O que a comissão controlou afinal? Procurou saber sobre a veracidade de informes a respeito de supostos desvios na contrainteligência da Abin, que deixaram vulneráveis a agências estrangeiras informações estratégicas do País? Ou sobre informes de que a Abin fez vista grossa a ações da CIA em Roraima contra Nicolás Maduro? Ou que policiais federais emprestados à agência produziam relatórios partidários, em que interesses de um grupo político capturavam um órgão de Estado?

O que fez quando se soube que a Abin entregou ao FBI o engenheiro naval americano Jonathan Toebbe, que queria vender segredos de reatores nucleares de submarinos americanos ao... Brasil. Relatos sobre isso já existiam desde 2022. Afinal de contas, para quem a Abin trabalhava sob Bolsonaro? Os áudios de Ramagem, as mensagens trocadas por agentes e os dados do programa First Mile demonstram sintomas mórbidos da crise da democracia no Brasil.

Em determinado momento do governo do ex-presidente, aparentemente, o que era a tal Abin Paralela deixou de ser paralela e passou a ser a própria agência, sob o controle do delegado Ramagem e do ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno. É sobre essa linha de investigação que se debruça a PF.

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O general da reserva Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) do governo do ex-presidente da República Jair Messias Bolsonaro (PL), presta depoimento à Comissão Mista Parlamentar de Inquérito (CPMI) do dia 8 de Janeiro Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO

Se Arendt estava certa, deve-se buscar nos segredos da Abin de Bolsonaro o núcleo duro de seu governo. Não só porque os arcana imperii, os segredos de Estado, eram vistos como o princípio e o fim do poder estatal. Mas porque os interesses do País pareciam se misturar com interesses familiares e amizades.

A manutenção de segredos está na base da utopia de todos os autoritários. A única forma de a sociedade confrontá-los é fazer o que a CCAI foi incapaz: fiscalizar e vigiar. É bom lembrar: eleito deputado, Ramagem foi fazer parte da comissão.

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