Um dos programas estratégicos do Exército, o Forças Blindadas deve ter um ano decisivo com o processo de escolha de novos carros de combate e viaturas fuzileiros, além de entregas de novos blindados Guarani, Guaicurus e Centauro, e a modernização do veterano Cascavel. São todos projetos cujos contratos já assinados ultrapassam a casa do bilhão e assim também devem ser as novas compras da Força Terrestre.
Trata-se de um programa de longo prazo, que deve ser concluído em 2040. Os valores e quantidades de viaturas podem sofrer alteração durante a execução. A coluna buscou com o Comando do Exército os dados hoje disponíveis para ilustrar o tamanho dos planos para assegurar à Força poder de dissuasão no entorno estratégico do País.
O Guaicurus na fronteira com a Venezuela
O primeiro dos blindados com a compra já acertada é o Guaicurus. Em julho de 2024, o Exército assinou o contrato para a compra de 420 Viaturas Blindadas Multitarefa Leve Sobre Rodas Guaicurus (VBMT LSR Guaicurus). Esses blindados serão entregues entre 2026 e 2034. O contrato prevê que o País deve desembolsar R$1,4 bilhão pelos veículos.
Atualmente, a Força terrestre já tem 32 desses veículos em operação, que estão no 18.º Regimento de Cavalaria Mecanizado, em Boa Vista (RR), prontos para qualquer ameaça vinda da Venezuela. A VBMT LSR Guaicurus pesa 8 mil quilos e tem uma blindagem, segundo o padrão estabelecido pela OTAN (STANAG), nível 2A. Sua autonomia é de 500 Km. Ela tem proteção contra minas e chega a uma velocidade máxima de 110 Km/h, transportando até 5 (cinco) militares.
O Guaicurus deve contar com uma estação de armas remotamente controlada – a SARC REMAX 4.0 –, capaz de observar o terreno a longas distâncias de dia e à noite e dotada de sistema de alerta laser, além de acompanhar alvos automaticamente e acertá-los com precisão. “As viaturas também podem ser equipadas com torres manuais que também conferem proteção ao atirador.” Elas contam com um sistema de proteção com lançadores de fumígenos.
O Cascavel modernizado
O segundo projeto em andamento é a modernização de 98 Viaturas Blindadas de Reconhecimento Média Sobre Rodas EE-9 Cascavel (VBR MSR EE-9 Cascavel). Os blindados devem ser entregues entre 2026 e 2037 a um custo estimado de R$ 1,2 bilhão. Trata-se de adaptar aos novos tempos o veterano blindado concebido pela Engesa.
O Cascavel tem blindagem STANAG nível 2A e sua autonomia ficará igual ao do Guaicurus – 500 Km –, atingindo uma velocidade máxima um pouco inferior: de 100 Km/h. Uma das novidades nesse blindado de 12 mil quilos será o novo motor 30% mais potente, com câmbio automático de seis marchas e um sistema de giro e elevação assistidos para o velho canhão de 90 mm, seu principal armamento.
Na versão modernizada, o blindado contará com um sistema de controle de tiro capaz de detectar e engajar alvos, diurnos e noturnos, com maior precisão e rapidez. Também terá um sistema de comando e controle moderno e câmeras diurnas/noturnas 360º, o que deve proporcionar uma grande “consciência situacional” à tripulação.
O EE-9 Cascavel também será dotado de sistema de defesa com lançadores de fumígenos e dos novos mísseis anticarro 1.2 MAX. Por enquanto, dois protótipos do novo Cascavel já estão sendo testados – na sequência, outras sete unidades serão modernizadas, para compor o lote piloto.
A epopeia do Centauro
O ano de 2024 marcou o fim da primeira fase de testes com os dois protótipos da nova Viatura Blindada de Combate de Cavalaria Média Sobre Rodas 8x8 Centauro II (VBC Cav MSR 8x8 Centauro II). Com isso o Exército acertou o fornecimento de mais 96 blindados, que serão entregues entre 2027 e 2036, conforme contou à coluna o comandante da Força Terrestre, general Tomás Miguel Ribeiro Paiva.
O caminho até a aprovação do Centauro foi o de uma epopeia. Quando a primeira das viaturas ia embarcar para o Brasil, o fabricante italiano – o Consórcio Iveco-OTO Melara (CIO) foi surpreendido pelas autoridades alfandegárias alemãs, que retiveram o blindado no porto de Hamburgo. Depois disso, o consórcio resolveu despachar a segunda unidade, diretamente de um porto italiano para o Brasil.
A torre do Centauro é equipada com um canhão de 120 mm. A nova VBC Cav do Exército pesa 30 mil kg, A blindagem de nível 4 (STANAG). A viatura é operada por quatro homens e tem autonomia maior que os outros blindados do Exército, chegando a 600 quilômetros a uma velocidade de 110 km/h. “Seus sistema de armas é único no mundo”, afirma o Exército. O armamento principal, o canhão de alta pressão de 120 mm, é “controlado por um sistema de tiro capaz de identificar, acompanhar e engajar alvos a longa distância com rapidez e precisão, tanto durante o dia, como à noite”.
O Centauro também é dotado de duas metralhadoras de calibre 7,62 mm e pode receber uma estação de armas remotamente controlada na torre. O blindado italiano conta com um sistema de proteção com alerta de laser operando em conjunto com os lançadores de fumígenos. A Força terrestre estima que o contrato de compra das viaturas deve chegar a R$ 5,1 bilhões.
O Guarani e a mecanização do Exército
O blindado Guarani deve se tornar o padrão da mecanização da Força Terrestre. O contrato atual prevê a aquisição de 1.350 das chamadas Viaturas Blindadas de Transporte de Pessoal Média Sobre Rodas 6x6 (VBTP MSR 6x6), que serão entregues em lotes até 2037. Trata-se de um blindado com blindagem (STANAG) nível 3. O peso de cada uma dessas viaturas é de 18 mil kg. Operada por três soldados, elas podem transportar um grupo de combate de oito fuzileiros.
A autonomia é semelhante à do Centauro – 600 km – assim como a sua velocidade máxima de 110 Km/h. O Exército prevê diversas versões especiais desse blindado como a ambulância – que foi alvo de um pedido da Ucrânia, negado pelo governo Lula –, posto de comando, defesa antiaérea, comunicações e morteiro. Todas estão em desenvolvimento. O contrato com a Iveco tem um valor de R$ 5,93 bilhões.
O Guarani pode receber uma estação de armas remotamente controladas ou manuais, com metralhadoras 7,62 mm ou de calibre .50, bem como com canhão de alta cadência de 30 mm (UT30 BR). As VBTP MSR 6x6 também são equipadas com um sistema de proteção com lançadores de fumígenos. Por enquanto, já foram entregues ao Exército 686 unidades, enviadas para as brigadas de infantaria e de cavalaria mecanizadas – a Marinha recebeu também um lote para seus fuzileiros.
Os novos tanques e viaturas de fuzileiros
Por fim, o Exército começou o processo para a aquisição de novas Viaturas Blindadas de Combate Carro de Combate (VBC CC) e Viaturas Blindadas de Combate de Fuzileiros (VBC Fuz). Ainda não há definição em relação à quantidade – estima-se, por enquanto, em 78 novas VBCFuz e outras 65 VBC CC de até 50 toneladas – e o prazo de entrega, nem mesmo o custo total do investimento, mas se estima que o pacote deve ficar acima dos R$ 5 bilhões.
O Estado-Maior do Exército entre 1.º de agosto e 1.º de novembro de 2024 iniciou a Consulta Pública nº 02/2024 – EME, cujo objetivo era “diligenciar os mercados nacional e internacional sobre a capacidade de fornecimento de viaturas blindadas de combate de fuzileiros e viaturas blindadas de combate carros de combate por meio de um Request for Information”. De acordo com o Exército, o procedimento visava a identificação das oportunidades existentes no mercado internacional e, assim, elaborar os processos de futuras aquisições.
Os sistemas de armas desejados para cada um dos novos tipos de viaturas devem levar em consideração que normalmente as de transporte de fuzileiros são dotadas de canhões entre 25mm e 40mm. No caso dos carros de combate , a maioria dos modelos disponíveis no mercado tem canhões de 105 ou mais milímetros – caso opte por uma canhão de 120 mm, como o do Centauro, as chances dos carros de combate equipados com o canhão OTO Melara crescem na futura concorrência.
Os novos carros de combate e as VBC Fuz equiparão os Regimentos de Carros de Combate e os Batalhões de Infantaria Blindados das Brigadas Blindadas. Eventualmente, poderão também, renovar a frota dos Regimentos de Cavalaria Blindados. Eles devem substituir totalmente ou parcialmente as frotas de VBC CC Leopard – de fabricação alemã e hoje o principal tanque do Exército –, de VBC CC M-60 (tanque médio americano) e de VBTP M-113B/BR, também de fabricação americana. Tudo isso, é claro, se o arcabouço fiscal e a fome por emendas parlamentares for controlada.
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