A decisão do tenente-coronel Mauro César Barbosa Cid de procurar a Polícia Federal (PF) e o Supremo Tribunal Federal (STF) para colaborar com as investigações sob o comando do ministro Alexandre de Moraes após um longo tempo de prisão revela uma situação parecida com a vivida no passado durante a Operação Lava Jato. Essa visão é compartilhada por militares ouvidos pela coluna no quartel-general da Força Terrestre. Cid foi preso há quatro meses, no dia 3 de maio, e teve todos os pedidos de soltura negados até agora.
Uma possível delação estava no horizonte das conversas no Forte Apache já no começo da semana. Oficialmente, o comando do exército decidiu não se manifestar sobre esse movimento da defesa do tenente-coronel. Primeiro porque o caso se encontra na esfera jurídica do STF. Depois porque os fatos investigados não aconteceram dentro dos muros da instituição verde-oliva.
A exemplo dos demais atores em Brasília, militares ouvidos pela coluna também trabalham com algumas hipóteses. A primeira pergunta que se fazem é sobre quais os meios de prova Cid ainda disporia para corroborar a sua delação que a Polícia Federal não tenha conhecimento.
Traduzindo: existe algum celular, pen drive ou HD externo escondido com novos documentos, fotos ou mensagens que os federais desconhecem em poder de Cid ou de sua família que possam esclarecer o papel dos envolvidos e o alcance dos delitos cometidos? Quase ninguém acredita nessa hipótese.
O mais provável, segundo os militares consultados, é que Cid tenha informações e dê seu depoimento sobre os papéis de cada um nessas tramas – venda de joias, falsificação de cartões de vacina, ataque às urnas eletrônicas, manifestações golpistas, operações para dificultar o voto no Nordeste –, principalmente, o do ex-presidente Jair Bolsonaro. Há ainda quem acredite que a ação de Cid serviria para obter o compromisso de que seu pai, o general Mauro Cesar Lourena Cid, fique livre de qualquer acusação.
Até o começo da semana, era sentimento corrente entre os chefes do Exército que a prisão de Cid por mais de cem dias apontava para uma prática supostamente usada pela Lava Jato para obter provas contra políticos: forçar a delação de empresários. Cid – suspeitavam os generais – era mantido preso para confessar e envolver Bolsonaro como o mandante dos malfeitos.
Questionava-se ainda que, no caso da Lava Jato, os acusados ainda puderam, mais tarde, contar com a revisão de seus casos no Supremo. O que não aconteceria com Cid nem com Bolsonaro, processados já na última instância. Ou seja, não haveria ninguém no futuro para consertar possíveis erros do STF.
Há um claro desconforto entre os militares quando o tema é STF. Seria necessário reequilibrar os poderes na República, muitos pensam, a exemplos de vários juristas. E, como argumento, usa-se uma linha de raciocínio que remonta à decisão de impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva como ministro da Casa Civil de Dilma Rousseff, em 2016, até a mesma medida que impediu que Alexandre Ramagem se tornasse diretor da PF sob o governo Bolsonaro, em 2020.
Há ainda outras dúvidas suscitadas entre os militares pela delação. Ela poderia servir para isentar acusados da perda de posto e patente, desobrigando-os de serem submetidos a conselho de justificação? Este conselho é uma espécie de tribunal de honra que declara se o oficial é digno ou indigno do oficialato. Militares condenados a mais de dois anos de prisão são automaticamente desligados do Exército.
Cid poderia delatar e pedir em troca a preservação do posto e patente? Se um acordo assim for homologado pelo STF, ele teria de necessariamente ser cumprido pelo Superior Tribunal Militar (STM). Ao fim e ao cabo, acredita-se que a decisão de Cid pode abreviar seu caso e encurtar a agonia da instituição, desgastada a cada novidade. A notícia sobre o movimento da defesa do tenente-coronel provocou uma série de indagações dos generais – e a coluna ouviu três deles e um coronel. Eles também aguardam respostas para que tudo fique mais claro.
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