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As relações entre o Poder Civil e o poder Militar

Análise

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Interpretação ou contextualização dos acontecimentos, explorando suas causas, consequências e implicações.

| Governo Lula prepara nova lei antimafia, com foco em facções e cárcere mais duro para criminosos

Promotores e a PF foram ouvidos pelo governo para a definição de novos instrumentos de combate às organizações criminosas, um das apostas da administração petista para ter o que mostrar sobre a Segurança Pública em 2026

Foto do author Marcelo Godoy
Atualização:

Acossado pela inflação e vendo seus índices de aprovação despencar nas pesquisas de opinião, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva prepara duas propostas para a Segurança Pública, em uma tentativa de ter o que exibir em 2026 durante a campanha eleitoral.

Além da Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que deve dar poder de polícia às Guarda Civis e aumentar as atribuições das Polícias Federal e Rodoviária Federal, a pasta da Justiça prepara uma nova lei antimáfia, que já está sendo chamada no Ministério da Justiça de Lei Lincoln Gakiya, o promotor do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado jurado de morte pelo Primeiro Comando da Capital (PCC).

Sarrubbo esteve a frente de ações contra o PCC quando era procurador-geral de Justiça de São Paulo; agora, está cuidando do projeto da nova lei antimafia Foto: VALERIA GONCALVEZ/ESTADAO

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A nova legislação deve facilitar o sequestro de bens de organizações criminosas e de seus líderes. Também deve estabelecer o regime de cárcere duro para os integrantes de facções, independente de decisão judicial. Ele passaria a ser condição do cumprimento de pena dos condenados por delitos de tipo mafioso, a exemplo do que acontece na Itália com o artigo 41 bis de seu Código Penitenciário.

Assim, os faccionados seriam privados de visita íntima, ficariam isolados dos demais presos e não teriam os direitos reservados aos presos comuns. Atualmente, isso só acontece quando a Justiça decide internar um detento no chamado Regime Disciplinar Diferenciado, o RDD, que precisa ser renovado de tempos em tempos pelo Judiciário – a maioria, no entanto, permanece em prisões comuns.

Outro ponto do projeto que está nas mãos do secretário nacional de segurança Pública, Mario Sarrubbo, é tornar clara a definição de organização mafiosa, seguindo o conceito da Convenção de Palermo de combate ao crime organizado. Isso tornaria o domínio territorial, como o exercido por facções e gangues em bairros e comunidades de diversos estados, não só uma agravante na hora da fixação das penas dos acusados bem como uma condicionante para agravar o cumprimento da condenação.

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Sarrubbo e o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Passos Rodrigues, são os principais interlocutores do ministro Ricardo Levandowski sobre o tema. Há ainda uma dúvida no governo: se as novas medidas antimafia devem ser apresentadas como uma nova lei – o que é defendido por Sarrubbo — ou se elas devem reformar a atual lei de organizações criminosas, como gostaria a Polícia Federal.

Outra possibilidade estudada pelo governo, mas que enfrenta resistências é a criação de umas agência antimáfia nos moldes da Diretoria Investigativa Antimáfia (DIA), da Itália, para reunir em nível federal integrantes de diversos órgãos que poderiam propor medidas cautelares, como o sequestro de bens e a abertura de investigações sobrem o crime organizado. Na Itália, é dessa diretoria que partem alguns dos maiores golpes contra o crime organizado naquele país.

Carabineiros italianos mobilizados pela procuradoria de Locri, na Calábria, para a Operação Eureka, em 2023,contra a 'Ndrangheta e suas ligações com o PCC: autoridades brasileiras obtiveram provas que levaram á Operação Mafiusi, da PF  Foto: Europol

O discurso petista na segurança

Caso traga ao País um arcabouço legal antimáfia, a nova lei e seus dispositivos poderão dar ao governo Lula um discurso que lhe falta na campanha de 2026: o da Segurança Pública e do combate às máfias que aprofundam sua atuação no país. Esse foi um dos temas tratados pelo ex-ministro José Dirceu em almoço em São Paulo no qual ele revelou que Lula lhe pediu para ser candidato a deputado federal no próximo ano.

“A solução não pode ser o que os Bolsonaros estão pregando, porque eles estão falando contra a PEC como uma possível invasão da federação, da autonomia dos Estados, mas na verdade, o que Tarcísio (de Freitas) fez em São Paulo, voltou a Rota na Rua, esquadrão da morte, tropa de elite, nada disso funciona. O Brasil já passou por todas essas experiências e só piorou o problema de Segurança Pública.”

Dirceu, que conversara com Lula um dia antes na festa para a ex-senadora Marta Suplicy, também em São Paulo, demonstrou o que deve ser o discurso petista na área. “Vamos reformar as penitenciárias, reformar as polícias, porque aqui em São Paulo nós vimos aonde chegou a investigação do caso Gritzbach, porque o crime foi feito no local federal (Aeroporto de Guarulhos), que policiais estavam envolvidos, civis e militares, no assassinato do delator (Gritzbach, delator do PCC). No Rio, nós vimos que os fracassos da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) foi a infração da polícia no Alto Comando da PM e nós sabemos que as milícias são dirigidas por esses policiais.”

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Ele continuou: “Se o Brasil quer enfrentar o problema do crime organizado, que é internacional, que é empresarial hoje é atacar as finanças, usar o Coaf, vigiar as fronteiras e atuar na área cibernética. As forças armadas devem dar apoio e devemos criar uma força nacional para isso”, afirmou

Em seguida, o petista, a exemplo de seus colegas, desfilou ataques aos governadores da oposição. Poupou apenas Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul. “O que eles estão pregando, que o Caiado fala em matar, matar, matar em Goiás e o Tarcísio está fazendo em São Paulo não resolve problema nenhum. O que resolve é infiltração, câmera e inteligência.”

Dirceu então tratou da experiência do governo petista do Piauí no combate aos roubos de celulares, o que, deve estar na boca de seus companheiros para se opor à aprovação registrada pelo governador Tarcísio em São Paulo – a última pesquisa Quaest mostrou que ele tem 61% de aprovação, enquanto Lula é desaprovado no Estado por 69% dos eleitores.

O ex-ministro José Dirceu na festa de seu aniversário em São Paulo acompanhado pelo deputado estadual do PT Eduardo Suplicy: legenda prepara discurso da segurança para eleição de 2026 Foto: Marcelo Godoy / Estadão

Dirceu afirmou que a lei antimáfia “mais do que uma bandeira para 2026 é algo que precisa ser feito. “Quem criou os presídios federais no Brasil foi o governo Lula, o ministro Márcio Thomaz Bastos. Veja como mudou o isolamento dos líderes organizados. Nós queremos combater o crime organizado no Brasil. Estados e União têm de trabalhar juntos. Ninguém vai resolver esse problema sozinho. Não sei porque não pode haver uma cooperação entre os Estados e o governo federal.”

Dirceu citou como exemplo o caso de Roraima em razão da atuação do crime organizado em uma região de fronteira. E concluiu: “O crime tomou conta de um estado brasileiro e na fronteira com dois países, uma coisa gravíssima. O Brasil é metade do PIB, da população e do território da América Latina. Se o México e a Colômbia passaram pelo que passaram, vai acontecer aqui também, se nós não pararmos de ter essas discussões políticas inúteis. Veja a situação de Fortaleza e do Rio. As facções se estenderam para o Brasil todo.”

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O desafio do PT é agora fazer com que o discurso de Dirceu convença quem nunca viu o partido como portador de um discurso crível para a Segurança Pública. A ideia é mostrar que mensalão e petrolão são coisas do passado, que o partido conseguirá ser uma opção eleitoral em um cenário em que a ausência de Jair Bolsonaro no pleito é cada vez incerta e no qual uma opção mais à direita _ descolada do bolsonarismo – consiga reunir votos suficientes para estar no segundo turno e enfrentar Lula, Dirceu e seus aliados com chance real de vitória.

Análise por Marcelo Godoy

Repórter especial do Estadão e escritor. É autor do livro A Casa da Vovó, prêmios Jabuti (2015) e Sérgio Buarque de Holanda, da Biblioteca Nacional (2015). É jornalista formado pela Casper Líbero.

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