BRASÍLIA - O Ministério do Esporte, comandado por André Fufuca (PP), destinou ao Maranhão 28 contratos de construção de espaços esportivos comunitários, 18% do total. O número também é igual à somatória de equipamentos que serão construídos em outros oito Estados. Uma das cidades maranhenses selecionadas pelo governo federal para receber as obras foi Alto Alegre do Pindaré, cujo prefeito é Fufuca Dantas (PP), pai do ministro do Esporte.
Fufuca foi o quinto mais votado na disputa maranhense à vaga de deputado federal em 2022. Ele se licenciou da Câmara em seu terceiro mandato para assumir o cargo na Esplanada, em setembro do ano passado, como parte de um acordo entre o Governo Lula e o Centrão a fim de garantir mais apoio no Congresso. Ana Moser, ex-atleta e apoiadora histórica do PT e de Lula, foi demitida para dar a vaga para o presidente dar a vaga ao PP de Fufuca.
Em nota, a pasta afirmou que os critérios utilizados para selecionar as prefeituras beneficiadas foram “a situação de vulnerabilidade social do proponente” e “o número significativo de beneficiários alcançados pelo objeto da proposta” (ver mais abaixo).
Os municípios do Maranhão vão receber R$ 40,9 milhões em repasses da União, valor maior do que o que será destinado a 22 cidades de Alagoas, Amapá, Piauí e Pará, que integram, ao lado dos maranhenses, o grupo dos cinco Estados com piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do País. Juntos os municípios receberão R$ 32 milhões.
No governo Lula, o custo dos espaços esportivos comunitários é de R$ 1,462 milhão. Ou seja, todos os municípios selecionados receberão o mesmo valor para executar as obras. Os acordos preveem a construção de equipamentos que unem em um só espaço um campo society com grama sintética, uma quadra poliesportiva, uma pista de caminhada e um parquinho infantil.
Foram firmados até o momento 153 convênios entre o governo federal e os municípios interessados na política pública, de acordo com o Portal da Transparência e a plataforma TransfereGov.
A maioria dos convênios foi fechada pela pasta de Fufuca por meio do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Dos municípios beneficiados até aqui, 143 receberão recursos oriundos do programa vitrine do governo Lula. Os outros 10 municípios com contratos vigentes fecharam acordos diretamente com o Ministério do Esportes, sendo que sete desses são do Maranhão.
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Para receber os equipamentos do Novo PAC, os municípios precisam cumprir dois requisitos: instalar o equipamento em região de alta vulnerabilidade socioeconômica e comprovar a posse de terreno com a área necessária para a construção.
Contudo, o empreendimento, que foi anunciado como estritamente técnico pela Casa Civil, coordenadora do Novo PAC, ganhou contornos políticos em publicação de Fufuca nas redes sociais.
No dia 7 de junho, o ministro do Esporte publicou uma foto cumprimentando o governador do Maranhão, Carlos Brandão (PSB), após uma reunião na qual teriam feito acordos de parcerias entre a União e o governo estadual. Dentre as políticas acertadas pelos dois estaria “o lançamento de 31 espaços esportivos comunitários” em municípios maranhenses.
Já a Casa Civil respondeu aos questionamentos da reportagem com a informação de que os convênios foram fechados pelo Ministério do Esporte e que os critérios técnicos foram publicados em edital. Ainda de acordo com a pasta, os contratos foram firmados “com cláusula suspensiva, de forma que a Caixa irá realizar a fiscalização e acompanhamento da execução”.
‘Movimento político’
Para o professor Leandro Mazzei, do curso de Ciências do Esporte da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), os convênios assinados pelo Ministério do Esporte representam “um movimento político, sem interesse de Estado, que gira em torno do atual ministro e do seu Estado de origem”.
“Se eu tenho um orçamento que não é compatível com a dimensão do meu País e destino boa parte dele para um local e não para o Brasil todo, eu vou causar desequilíbrio. Isso gera uma espécie de prevalência para parte da população enquanto a maioria fica sujeita a outras políticas de Estados e municípios sem o aporte do governo federal”, completou.
A União prevê celebrar 86 novos acordos de construção dos espaços esportivos do PAC até o final deste ano.
“Os critérios adotados para a liberação de recursos do Ministério do Esporte, para atender projetos esportivos apresentados pelos municípios brasileiros a esta pasta foram: a situação de vulnerabilidade social do Proponente, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), o percentual de pessoas cadastradas no Bolsa Família daquele município, o número significativo de beneficiários alcançados pelo objeto da proposta. Todos os critérios foram alinhados com a Casa Civil”, diz a nota do ministério.
A Pasta citou, com base na página do Novo PAC na internet, que Pará, Pernambuco e Bahia foram selecionados para receber 25 equipamentos cada. A página do Novo PAC citada pelo Ministério detalha todos os selecionados, mas a sua última atualização foi em dezembro de 2023. Além disso, o site não indica quantos municípios já assinaram o termo de compromisso e quais tiveram os recursos de fato empenhados para executar as obras, dados que podem ser conferidos de forma atualizada no Portal da Transparência e na plataforma TransfereGov.
Existe ainda a possibilidade de as cidades escolhidas inicialmente não terem assinado os convênios que chancelam a parceria com a União por terem descumprido algum requisito.
A partir dos dados divulgados pelo Portal da Transparência e pelo TransfereGov, é possível identificar que o Maranhão desponta como o Estado que mais assinou termos de compromisso do novo PAC até aqui, o que implica na reserva do dinheiro das obras pelo Ministério do Esporte. O segundo Estado que mais celebrou convênios até o momento foi Minas Gerais, com 10 cidades beneficiadas.
Com os recursos já empenhados, os prefeitos dos municípios beneficiados podem anunciar o trunfo de terem conseguido recursos federais para obras na área do esporte, o que também pode ser explorado nas eleições municipais deste ano.
Para Mazzei, a experiência do País com políticas públicas de esportes provou que destinar recursos para prefeituras sempre tem problemas. Ele avalia que os governos municipais estão sujeitos à descontinuidade de iniciativas, além de sofrerem com falta de recursos próprios para manter as estruturas. “Construir equipamentos é a parte mais fácil, mas ter pessoas orientando atividades para a população é muito oneroso. Construir, inaugurar e ir embora não tem sido uma política eficiente”, afirmou.
O professor sugere que uma forma de tornar as políticas esportivas mais efetivas seria o governo federal abrir linhas de crédito para que as escolas públicas tivessem instalações esportivas e recursos humanos para geri-las. Dados do Censo Escolar da Educação Básica divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) em fevereiro deste ano mostram que apenas 40% das instituições de educação básica no País têm equipamentos esportivos adequados, como quadras, para realizar as aulas de educação física.
Mazzei cita que as escolas já contam, por exemplo, com a infraestrutura de segurança para controlar o uso dessas estruturas, além de atenderem públicos importantes para as políticas esportivas. Ele avalia ainda que as escolas poderiam abrir aos finais de semana para garantir o acesso de toda a comunidade aos equipamentos.
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