Ministra da Saúde diz que tem ‘boa relação’ com Congresso apesar das críticas de parlamentares

Nísia Trindade nega que tenha distribuído recursos de emendas sem conrole; Estadão revelou que repasses foram destinados a cidades muito acima da capacidade de atendimento de saúde dos municípios

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Foto do author André Shalders

Alvo de críticas no Congresso e com o posto cobiçado por parlamentares do chamado Centrão, a ministra da Saúde, Nísia Trindade, disse nesta segunda-feira, 8, que não tem qualquer problema de relacionamento com o Legistativo. Nas últimas semanas, congressistas de várias legendas vêm demonstrando descontentamento com a gestão dela, principalmente em relação à destinação de verbas para Estados e municípios. Os parlamentares reclamam da falta de transparência nos critérios usados pelo Ministério para definir para onde vai o dinheiro.

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O Estadão mostrou que a liberação das verbas atendeu a pedidos de congressistas e do ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, e ignorou critérios técnicos do próprio ministério.

“Com relação ao Congresso, considero que tenho uma relação boa. Me reuni e recebo deputados, individualmente e em bancadas. Bancadas de Estados governados por partidos da base e de oposição. Senadores, igualmente. Então, vejo que não há nenhum problema na relação com o Congresso”, disse Nísia Trindade em entrevista no Palácio do Planalto, ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do ministro da Secretaria de Comunicação da Presidência, Paulo Pimenta (PT), e de secretários do Ministério da Saúde.

“O que houve são mudanças na dinâmica orçamentária. Não vejo nada disso personalizado em mim ou em nenhum parlamentar. No caso das emendas, a gente fez a execução de 98% delas (em 2023). Além disso, nós estabelecemos um diálogo com as lideranças, mostrando as ações que são prioritárias no PAC e chamando os parlamentares (a participar)”, disse ela. Como mostrou o Estadão, a iniciativa mencionada pela ministra para atrair congressistas para o PAC fracassou: só 22 dos 6.365 foram escolhidos por deputados ou senadores, ou 0,3%.

Nísia alega que não houve descontrole na destinação de recursos para municípios por meio de uma portaria editada em maio do ano passado liberando os limites de transferência de recursos. Por conta dessa portaria, ao menos 651 municípios receberam mais que o teto de recursos de média e alta complexidade estabelecido pelo próprio Ministério da Saúde; e em 20 deles o limite foi ultrapassado em mais de 1.000%. Enquanto isso, outros com rede hospitalar e capacidade para usar os recursos ficaram sem nada.

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Lula com Nísia Trindade durante entrevista a jornalistas no Palácio do Planalto, na manhã desta segunda-feira (08). Foto: Wilton Júnior/Estadão

Isso significa que municípios que sequer possuem hospitais receberam recursos para tratamentos de média e alta complexidade, que eles não têm capacidade de realizar. Segundo Nísia, porém, as regras foram aprovadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), e o teto não era “cabível” em alguns casos.

“Não houve descontrole. Nós seguimos estritamente o que estava inclusive em apontamentos do Tribunal de Contas da União. Em alguns casos de destinação, o teto para média e alta complexidade, ou mesmo o teto para a atenção primária, ele não era algo cabível, em alguns casos”, disse ela. “E todos esses critérios nós apresentamos com bastante transparência. Seja em relação à Portaria 544, seja em relação a tudo que eu falei de incremento de recursos que houve, da parte discricionária do nosso orçamento, a estados e municípios”, acrescentou.

Para evitar desperdícios, o Ministério da Saúde estabelece um limite de quanto cada cidade pode receber, tanto para procedimentos da média e alta complexidade (Teto MAC), quanto na atenção básica. Ao alegar “emergência”, o Ministério da Saúde dispensou o cumprimento do Teto MAC na destinação dos recursos da Portaria 544.


“Ela (Portaria 544) é fruto dessa destinação, desses recursos de R$ 3 bilhões (de recursos do orçamento secreto, proibido pelo STF em 2022). Mas (é) um grande volume de demandas não atendidas. Eu diria que a portaria nos mostrou algo que eu vi na prática no gabinete e busquei corrigir: a grande demanda represada, o grande subfinanciamento do SUS, a pressão sobre os municípios. Tanto é que a demanda foi da ordem de R$ 30 bilhões”, disse a ministra. Ela se equivocou em relação ao montante: as demandas apresentadas passaram de R$ 100 bilhões.

Criada inicialmente para destinar pouco mais de R$ 3 bilhões, ao longo de 2023 a Portaria 544 foi recebendo mais recursos, como cerca de R$ 4 bilhões destinados à Saúde pelo Congresso por meio da Lei Complementar 201, em outubro. Ao fim, o montante disponibilizado por meio da Portaria chegou a pouco mais de R$ 8 bilhões.

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Ela também negou que a priorização dos recursos tenha sido feita por indicação de congressistas, embora os encontros para tratar da liberação do dinheiro estejam na agenda oficial do ministério. Ao Estadão, congressistas falaram abertamente sobre o “apadrinhamento” do dinheiro.

“Quem tem esse controle, que faz o acompanhamento das indicações desses recursos todos (da Portaria 544), é a assessoria do presidente da Câmara (Arthur Lira, do PP de Alagoas). Esse levantamento (de Lira) é que, digamos, provocou esse início de indagação, do pedido de informação para o Ministério da Saúde (em fevereiro)”, disse o líder do PDT, Afonso Motta (RS).

Lula e o ministro da Secom, Paulo Pimenta (PT), durante a entrevista a jornalistas no Palácio do Planalto Foto: WILTON JUNIOR

Na Secretaria de Relações Institucionais, quem toca o dia a dia da relação com o Ministério da Saúde é o médico pernambucano Mozart Sales, amigo de Padilha desde os tempos de movimento estudantil e hoje assessor especial do ministro. Do lado do Ministério da Saúde, a relação é com o secretário-executivo Swedenberger Barbosa, o Berge, quadro histórico do PT, ligado a Lula e ao ex-ministro José Dirceu.

Na entrevista, Nísia apresentou um novo programa do ministério, o Mais Acesso a Especialistas, que tem por objetivo reduzir o tempo de espera necessário para acessar serviços do SUS. A ministra também defendeu a manutenção do atual piso da saúde, isto é, o valor mínimo que o Orçamento precisa destinar à área todos os anos. Hoje, este piso está fixado em 15% da Receita Corrente Líquida (RCL). A RCL é a receita da União menos as transferências obrigatórias aos Estados e municípios. Há uma discussão em curso na equipe econômica sobre a possibilidade de diminuir este piso, tanto para a saúde quanto para a educação. Segundo Nísia, o assunto terá de ser discutido na Junta de Execução Orçamentária (JEO).

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