BRASÍLIA - O ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Vinícius Marques de Carvalho, afirmou nesta quarta-feira, 29, que decidiu sair do seu escritório de advocacia VCMA. A decisão ocorre após o Estadão revelar que a banca tem contrato com a Novonor (antiga Odebrecht) ao mesmo tempo em que a CGU renegocia o acordo de leniência firmado pela empreiteira no âmbito da Lava Jato.
A saída do ministro foi confirmada por meio de nota do próprio escritório. “VMCA Advogados informa que recebeu de Vinicius Marques de Carvalho o pedido de afastamento da sociedade. A OAB foi comunicada da decisão. Os atuais sócios permanecem à frente da banca, fundada em 2017″, diz a nota.
Até então, Vinícius estava apenas licenciado do escritório, mas seguia como sócio patrimonial. A namorada de Vinícius, a advogada Marcela Mattiuzzo, segue na administração da banca.
Como ministro da CGU, Vinícius chegou a se reunir com a Odebrecht para discutir a renegociação do acordo de leniência. O encontro ocorreu no dia 12 de março e contou com representantes de outras sete construtoras. Além disso, ele tem dado declarações públicas que favorecem a defesa das empreiteiras. Segundo o ministro, os acordos de leniência não devem ser usados para “deixar as empresas numa situação pior, gerar pedidos de recuperação judicial ou falência”.
No total, Vinícius se reuniu na CGU com outros cinco clientes, além da Odebrecht, conforme revelou o Estadão. De acordo com os registros oficiais, o ministro recebeu nos últimos meses representantes do Facebook, Gol Linhas Aéreas, Mercado Livre, Rumo Logística e Vale.
No caso do Facebook, o ministro se reuniu com a big tech para discutir o Projeto de Lei 2630, conhecido como PL das Fake News. O encontro tinha como objetivo, segundo a agenda pública do próprio ministro, “influenciar a formulação, a implementação ou a avaliação de estratégia de governo ou de política públicas”. A CGU chegou a ser cogitada pelo governo para participar da fiscalização das redes sociais. O órgão até apresentou um desenho para a Casa Civil sobre como se daria sua participação.
O VMCA Advogados, escritório de Vinícius, tem contratos com o Facebook há cerca de seis anos e, atualmente, é responsável pela defesa da big tech no âmbito de um processo no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) que investiga abuso da empresa durante as discussões do próprio da projeto de lei das Fake News.
Em todos os casos, o ministro negou haver conflito de interesses. “A interação de organizações públicas e privadas é componente legítimo em uma democracia e parte da função institucional de ministro de Estado”, afirmou ele, em nota enviada neste mês.
O Estadão voltou a procurar o ministro nesta quarta-feira, com o anúncio de sua saída do escritório. A reportagem o questionou sobre o motivo de decidir se afastar definitivamente da banca mesmo não vendo quaisquer irregularidades ou situações conflituosas. Vinícius respondeu que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) já foi comunicada de sua saída e reafirmou as “medidas éticas tomadas anteriormente, como o afastamento total da advocacia, o não recebimento de honorários, o impedimento em casos que possam afetar ex-clientes e a proibição do escritório de atuar junto à CGU”.
“O ministro segue focado no desempenho de suas funções públicas. Quando deixar a CGU, cumprirá todas as regras de quarentena aplicáveis a autoridades públicas”, acrescentou o órgão.
Quando consultou a Comissão de Ética Pública (CEP) em janeiro de 2023, Vinícius afirmou que pretende voltar ao escritório assim que deixar sua função pública. Na ocasião, ele perguntou ao órgão colegiado se poderia seguir recebendo os lucros da banca mesmo estando licenciado. A CEP não viu problemas. Apesar da autorização, o ministro voltou atrás e decidiu não receber qualquer dinheiro do escritório, segundo informou em nota à imprensa.
Após o Estadão revelar o contrato do VMCA Advogados com a Odebrecht, a Comissão de Ética abriu um processo para apurar eventual conflito de interesse, mas o caso foi arquivado logo de início. O relator do caso foi o conselheiro Edson Leonardo de Sá, que é servidor de carreira da CGU. Na mesma decisão, porém, o órgão colegiado reviu entendimento anterior e proibiu o ministro de receber lucros do escritório resultantes de atuações junto ao governo federal.
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