BRASÍLIA — Os ministros da Controladoria-Geral da União (CGU), Wagner Rosário, e da Advocacia-Geral da União (AGU), Bruno Bianco, colocaram as estruturas de suas pastas para dar respaldo jurídico ao discurso do presidente Jair Bolsonaro (PL) de contestação das urnas eletrônicas. Os comandos de outros oito órgãos já dão suporte à tese não comprovada do presidente de que o sistema de votação do Brasil é “completamente vulnerável”. Entre eles estão os ministérios da Defesa e da Justiça, que comandam as Forças Armadas e a Polícia Federal, respectivamente, e o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que controla a Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
Auditores da CGU e advogados da União devem atuar como agentes de Estado e não como funcionários de um governante. A controladoria tem a missão de zelar pela transparência governamental, combater a corrupção e exercer o papel de corregedoria, punindo servidores públicos. Já a AGU tem a responsabilidade de representar judicialmente os três Poderes, e não apenas o Executivo. O órgão ainda serve como consultor jurídico para o governo.
O envolvimento da AGU e da CGU com o tema foi exposto na reunião de Bolsonaro com cerca de 70 embaixadores, na última segunda-feira. Na ocasião, o presidente disse que a “estabilidade democrática” depende de ajustes nas urnas eletrônicas. Entre os poucos ministros convidados, estavam Rosário e Bianco.
O chefe da CGU foi instado a colocar a estrutura da pasta na defesa da tese presidencial no último dia 5. Na ocasião, Bolsonaro fez uma reunião ministerial na qual só tratou da alegada fragilidade das urnas eletrônicas. Sete dias depois, Rosário cadastrou uma equipe de oito auditores para participar do processo na condição de órgão fiscalizador das eleições.
Bolsonaro está tentando cooptar as instituições por meio das pessoas.”
Leandro Machado, cientista político e mestre em Administração Pública
O convite havia sido feito pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em dezembro de 2021, mas a CGU vinha ignorando e chegou a perder o prazo, que foi reaberto para atendê-la. Procurado, o órgão disse que só falará “diretamente” ao TSE.
“A proximidade do ministro num ato insano do presidente é vergonhoso. Isso está dentro de um contexto em que várias instituições e órgãos e carreiras de Estado foram contaminados”, afirmou o presidente do Fórum das Carreiras de Estado (Fonacate), Rudinei Marques, que é auditor da CGU. A entidade agrega 37 entidades e 200 mil servidores públicos.
Enquanto a CGU entra na Corte Eleitoral, a estrutura da AGU é usada para respaldar juridicamente os ataques de Bolsonaro ao sistema. Em agosto do ano passado, o órgão enviou parecer ao Supremo Tribunal Federal (STF) em uma ação na qual a Rede pedia que a Corte cobrasse do presidente as supostas provas de fraude no pleito de 2018.
No documento, a AGU se ampara em uma nota da Subchefia para Assuntos Jurídicos da Secretaria-Geral da Presidência da República. Segundo os órgãos, o partido quis “impor uma verdadeira censura ao direito fundamental da livre expressão do pensamento do cidadão Jair Bolsonaro”.
O Estadão questionou à AGU se Bianco concordava com as declarações de Bolsonaro feitas no encontro dos embaixadores. “Não cabe comentar ou emitir opinião pessoal”, afirmou o órgão.
Para o cientista político Leandro Machado, mestre em Administração Pública, “os movimentos de Bolsonaro indicam que ele está em busca de mais apoios na máquina estatal contra as urnas eletrônicas”. “Ele está tentando cooptar as instituições por meio das pessoas”, disse.
A estrutura do Ministério da Justiça também é usada pelo presidente para respaldar seu discurso. Em junho, o ministro Anderson Torres comunicou ao TSE que colocaria a PF para participar de todas as etapas de fiscalização e auditoria das urnas eletrônicas.
Em reunião no Senado na última semana, o diretor executivo da PF, Sandro Torres Avelar, reforçou o posicionamento do ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, que defendeu uma votação paralela. “Quisera eu ter condições de argumentar como o general”, afirmou o delegado.
O ministro da Defesa colocou oficiais da Marinha, Exército e Aeronáutica para questionar o TSE sobre as urnas. Ele montou uma equipe de fiscalização com dez militares dessas forças.
Para entender: Auxiliares repetem discurso presidencial
Advocacia-Geral da União
Estrutura da pasta é usada para respaldar juridicamente os ataques do presidente Jair Bolsonaro ao sistema eleitoral. O órgão chefiado por Bruno Bianco (foto) enviou parecer ao Supremo Tribunal Federal no qual afirmou que a alegação, sem provas, de fraude nas eleições é “direito fundamental da livre expressão do pensamento”.
Controladoria-Geral da União (CGU)
Chefe da CGU, Wagner Rosário foi instado a pôr a estrutura da pasta na defesa da tese presidencial. Após reunião ministerial sobre suposta fragilidade das urnas, Rosário cadastrou equipe de oito auditores no TSE para participar do processo como órgão fiscalizador das eleições.
Outros órgãos
Também têm dado respaldo ao discurso de Bolsonaro os chefes dos ministérios da Defesa (Exército, Marinha e Aeronáutica) e da Justiça (PF) e o Gabinete de Segurança Institucional (Abin).
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