EXCLUSIVO PARA ASSINANTES

Labirintos da Política

Opinião | Ciro Nogueira pode até dizer que quer, mas Bolsonaro é uma noiva impossível de levar ao altar

Ao prometer lealdade a uma candidatura que não poderá se concretizar, presidente do PP dá o recado de que está mesmo é livre para receber propostas

PUBLICIDADE

Foto do author Monica  Gugliano

No Congresso Nacional, onde a maioria dos políticos fala pelos cotovelos, quando um deles começa a andar calado, se diz que “está na muda”. Pelo contrário, quando falam muito em um tema é bom se precaver e tentar descobrir aonde ele quer chegar. Nos últimos quinze dias, o presidente do PP, líder da minoria, senador Ciro Nogueira (PI), ex-ministro chefe da Casa Civil do governo de Jair Bolsonaro, anda quase que monotemático e loquaz como nunca. Seus assuntos têm sido o “centrão”, a direita, a esquerda e o conservadorismo.

O tom vem sendo o da crítica e surpreendem suas palavras sobre as tendências políticas, inclusive a direita, seu berço no último governo em que Bolsonaro lhe deu o cargo mais importante de sua trajetória política. Ele retribui ao ex-chefe. Diz que deve a ele sua eterna lealdade e, segundo o senador, e o anuncia como seu único compromisso eleitoral. Bolsonaro não esconde que se sente honrado. E o senador fica bem com o aliado.

Ciro Nogueira, senador e presidente do PP Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado

PUBLICIDADE

Mas o senador está compromissado – como se diz por aí – com alguém que não poderá levar ao altar a não ser que o cenário jurídico e político deem uma pirueta como as da ginasta olímpica brasileira, Rebeca Andrade, Bolsonaro não terá a mínima chance de ser candidato a absolutamente nada. Deverá continuar inelegível até 2030.

Já era esse o cenário, antes de Francisco Wanderley Luiz - o homem-bomba - se explodir em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF). Pior ainda, antes das delações que falam na tresloucada ideia de matar Lula, Alckmin e Moraes durante as tramas dos militares que preparavam o golpe do 8 de janeiro.

Mas se a união com Bolsonaro não tem chances, é um amor impossível, o que o senador quer dizer com tanto declaratório: que já pagou com sua lealdade e a sistemática defesa oficial do ex-presidente o passivo do governo anterior. Agora está livre, leve e solto para seguir em busca de novos pretendentes que possam aparecer no mercado ou mesmo que já estejam. Seria uma ousadia pensar no presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no momento em que se fala em uma reforma ministerial que poderia abrigar o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) que deixa o cargo em fevereiro?

Publicidade

Ciro Nogueira está sendo o primeiro a se reposicionar num território que ainda pode ser considerado de “bolsonarismo raiz”. Outros, com muito menos cacife já andam por essas bandas. O deputado Otoni de Paula (MDB-RJ) - uma das mais fortes lideranças da bancada evangélica na Câmara - arrumou sua malinha e foi coordenar a campanha do prefeito Eduardo Paes para a reeleição, virou um apoiador de primeira hora da reeleição de Lula.

O que é muito cedo para saber hoje e nos próximos meses é quantos tomarão o mesmo caminho e quanto tempo vão levar para mudar de rumo por que as opções apresentadas pelo campo da direita não demonstram viabilidade e fôlego para chegar a 2026. E a principal, Bolsonaro, não existe.

Veja Tarcísio de Freitas, até pouquíssimo tempo uma estrela nessa constelação. Bastou confiar na pessoa errada, o secretário Capitão Derrite para começar a ver seus sonhos derreterem feito manteiga. Carregá-lo é um fardo que pesa mais que tonelada. A prática dele é draconiana e partes dos seus comandados estão envolvidos em ações comparáveis a assassinatos.

Outro nome, Ronaldo Caiado tem muito entusiasmo. Mas poucos instrumentos. Goiás é um Estado de pouca visibilidade, a exceção daquela concedida pelo agronegócio. O governador tampouco conta com o apoio unânime dessa ala que está dividida ainda entre Ratinho Júnior, do Paraná, e há até quem pense em Romeu Zema (Novo), o mineiro que certa vez, em entrevista ao Estadão disse que os nordestinos eram como vaquinhas.

Ciro Nogueira tem 56 anos. Está longe de ter o traquejo e a habilidade dos antigos políticos brasileiros que diziam sem dizer nada e faziam aparentando estarem imóveis. A única chance de desvendá-los era seguir as pequenas pistas que deixavam. Talvez valha para passar a buscar no que ele diz, o que já pensa um número, que não é pequeno, no Congresso.

Publicidade

Opinião por Monica Gugliano

É repórter de Política do Estadão. Escreve às terças-feiras

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.