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Labirintos da Política

Opinião | Slogan ‘real, moeda forte’ é lembrança que se desintegra diante da alta do dólar na gestão Lula

Se ações da atual equipe econômica derem errado, moeda que abateu o petista em 1994 pode voltar a fazê-lo em 2026

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Foto do author Monica  Gugliano

“Real, moeda forte”. De todos os slogans criados para o lançamento da nova moeda no Plano Real, nenhum me marcou tanto como esse. Nunca esqueci da frase que, obviamente, voltou à minha cabeça com força nesses dias em que vimos nossa “moeda forte” se desintegrar perante o dólar. O fundo do poço parecia nunca chegar e nele despencava nossa moeda, perdendo valor como não se vira desde que o Plano, criado há 30 anos e implementado em três etapas durante o governo do então presidente Itamar Franco (1930-2011) derrubou uma inflação de 40% ao mês ou três mil por cento ano ano. Em 1º de julho de 1994 nasceu o Real, a sexta moeda brasileira, e sem estar contaminada pela hiperinflação.

O presidente, que fora contra o plano e àqueles que o elaboraram sob o comando do então ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso, e que sempre defendia o congelamento de preços, exultou. E viu ali, ano de eleições presidenciais, uma chance de ouro de fazer seu sucessor. A campanha eleitoral, até aquele momento, era dominada por Luiz Inácio Lula da Silva. O petista, que vira no confuso governo de Itamar a chance de chegar ao Palácio do Planalto, num primeiro momento não deu muita importância.

O presidente Lula e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em solenidade no Planalto Foto: WILTON JUNIOR/Estadão

O passar dos dias, porém, mostrou o quanto o PT estava equivocado e o tamanho do erro que cometera ao votar contra a Medida Provisória 542 que criava a nova moeda. Itamar lançou o tucano FHC à presidência da República. Lula, que até então, estava na frente nas pesquisas começou a perder terreno. E não havia estratégia que lhe devolvesse a liderança. Enquanto o petista patinava, as pessoas se aglomeravam ao redor de Fernando Henrique, brandindo as notas de R$ 1,00 e pedindo que o candidato as autografasse. O sociólogo venceu no primeiro turno.

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O fim dessa história todos nós conhecemos, inclusive a reeleição de FHC e os equívocos cometidos na condução da economia em seu governo que, dessa vez, em 2002, deram a vitória a Luiz Inácio Lula da Silva.

“Real, moeda forte”, pensei novamente enquanto nossa moeda saía da casa dos R$ 5,00 e entrava na dos R$ 6,00. E não parava por aí, R$ 6,10, R$ 6,20, R$ 6,30... Segundo a consultoria Elos Ayta, o desempenho do real foi o terceiro pior, em termos nominais, desde 2010. Foi a sétima moeda que mais se desvalorizou no mundo. A queda registrada em 2024 só perde para a desvalorização de 31,98% vista em 2015, quando a então presidente Dilma Rousseff enfrentou a crise política e econômica que culminou com seu impeachment e para a queda de 22,44% verificada em 2020, no auge da pandemia de covid-19.

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Em leilões de câmbio sucessivos durante oito dias distintos na última semana de 2024, o Banco Central vendeu um montante de U$ 33,3 bilhões. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, visivelmente abatido, tentava convencer o mercado que o governo está entregando o ajuste fiscal, que os juros altos vão conter a inflação e que mesmo o cenário internacional não justificam o dólar nas alturas. Se der certo, Lula ganha pontos para disputar a reeleição em 2026 ou tentar fazer um sucessor. Se der errado, o Real que bateu o petista em 1994 pode voltar a fazê-lo. Daquela vez por que deu certo. Desta vez por que a moeda se desfez e a economia deu muito errado.

Opinião por Monica Gugliano

É repórter de Política do Estadão. Escreve às terças-feiras

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