MP abre investigação sobre contrato de R$ 30 milhões para obras em estradas de São Paulo

Objetivo é apurar supostos desvios em licitação que teria beneficiado empresa que ofereceu preço mais caro na Secretaria de Agricultura do governo anterior

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Foto do author Gustavo Côrtes
Atualização:

O Ministério Público de São Paulo (MPSP) abriu investigação para apurar possíveis irregularidades em um contrato de R$ 30 milhões do governo de São Paulo com a construtora Planservi para o planejamento de obras em estradas. Na prática, a empresa era responsável por formular os projetos que seriam executados por empreiteiras. O procedimento também deve averiguar supostos desvios no processo de licitação. A Secretaria de Agricultura e Abastecimento de SP (SAA), responsável pela contação, informa que há apuração em andamento com relação ao contrato citado na solicitação. Procurada pelo Estadão, a Planservi optou por não se manifestar.

Conforme revelou o Estadão, um parecer da assessoria técnica do Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP) apresentou questionamentos sobre o certame em que a empresa venceu a concorrência contra outras duas competidoras, apesar de ter oferecido o maior preço.

Registros feitos por fiscais da Secretaria de Agricultura de São Paulo mostram erosões em estrada no município de Novo Horizonte. A imagem foi anexada em dossiê feito pelo governo de Tarcísio de Freitas sobre o programa de construção de estradas Melhor Caminho na gestão do PSDB. Ao todo foram encontrados R$ 200 milhões em desvios. Foto: Reprodução/Dossiê Secretaria de Agricultura de São Paulo

Na disputa, o Consórcio HMP fez oferta R$1,5 milhão mais baixa do que os R$ 27 milhões da Planservi, mas não foi escolhido. O valor pago pelo Estado aumentou posteriormente devido a dois aditamentos no contrato para execução de reequilíbrios econômico-financeiros. Segundo técnicos do TCE-SP, os critérios adotados na seleção são incorretos. Nas regras do edital, as chamadas “propostas técnicas”, que mediam a capacidade das licitantes de realizar o serviço, tinham peso sete e, os preços, peso três.

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Aplicou-se ainda uma fórmula em que a diferença entre as “notas de preços” da empresa mais econômica e da mais custosa poderia variar em apenas 10 pontos em um total de 100. Com isso, a Planservi obteve a melhor nota geral mesmo tendo feito proposta mais cara aos cofres do Estado.

“Não foi justificada a proporção adotada e nem se observa que foi efetivamente utilizada tal proporção”, diz o relatório de auditoria realizado por fiscais do tribunal, que também citaram decisões anteriores em que os conselheiros consideraram irregulares licitações com normas semelhantes.

Os técnicos também apontam para deficiências na avaliação técnica das propostas. Segundo eles, o texto do edital utilizou termos genéricos ao estabelecer critérios de avaliação para a proposta técnica. “Notamos que há subjetividade nos critérios de julgamento e atribuição das notas técnicas, não se verificando transparência e clareza nos critérios adotados, seja porque apoiados em expressões de abstração, seja porque de obscura compreensão do mérito de avaliação”.

Planservi, ex-secretários e engenheiros são alvo de representação

No último dia 18, a promotora Karyna Mori, da Promotoria de Justiça de Patrimônio Público e Social da Capital, enviou ofícios ao presidente do TCE-SP, conselheiro Sidney Beraldo, e ao secretário de Agricultura, Antonio Junqueira, com pedidos de informação sobre o caso. A pasta foi a responsável pela contratação, realizada em agosto de 2021, ainda na gestão do então governador João Doria.

A secretaria encaminhou cópias dos termos de aditamento do contrato e o termo de quitação termos de recebimento provisórios e definitivo.

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Além da Planservi e da pasta, foram representados os ex-secretários de Agricultura Itamar Borges e Francisco Maturro e os engenheiros Silvio Bogosso e Rodrigo Santiago Azevedo.

Vinte e cinco voltas em torno da Terra e 160 km/h

A tabela de preços do contrato também é alvo da investigação. Estavam previstos R$ 1,1 milhão para o aluguel de um carro com capacidade para quatro pessoas e motor 1.6 e de uma caminhonete com ar-condicionado e direção hidráulica. Durante os oito meses de serviço, um veículo percorreria 924 mil km e, o outro, 84 mil km – distâncias que, somadas, equivalem a 25 voltas em torno da Terra.

Para cumprir tal itinerário, os dois automóveis precisariam fazer, juntos, 4,1 mil km por dia. O carro encarregado do trajeto mais longo teria que rodar a 160 km/h, velocidade superior ao limite de todas as vias do País, ininterruptamente, durante todo o período. Ao todo, São Paulo tem 160 mil km de vias rurais. Com o aluguel de carros previsto no contrato, era possível percorrer a integridade de todas as vias por seis vezes.

As informações foram incluídas em um relatório produzido pela secretaria de Agricultura e entregue ao TCE-SP em maio e revelado pelo Estadão. No documento, apontam para graves irregularidades cometidas no programa Melhor Caminho, relançado em 2021 com o objetivo de reformar 4,8 mil km de estradas rurais.

As suspeitas de desvios no programa levaram o Ministério Público a abrir 147 investigações para apurar o pagamento de R$ 50 milhões em aditivos de reequilíbrio econômico-financeiro a empreiteiras contratadas para executar as obras. Os repasses foram efetuados no fim de dezembro de 2022, na reta final do governo de Rodrigo Garcia (PSDB).

Renato Bottcher, secretário executivo da Agricultura de São Paulo, responsável pelas denúncias enviadas ao TCE-SP, foi exonerado pelo governo de São Paulo na última segunda-feira, 28 Foto: Governo de SP/Divulgação

Na última segunda-feira, 28, Marcos Renato Bottcher, número 2 da Agricultura nos últimos meses e responsável pelo envio do relatório ao TCE, acabou exonerado da Pasta. Interlocutores do governo apontaram pressão da bancada do MDB e do ex-secretário e hoje deputado estadual Itamar Borges (MDB), que nega. O governador Tarcísio de Freitas, porém, apontou que tomou a decisão de demissão por “baixo desempenho”.

Procurado, Itamar Borges lembrou que as outras licitantes não impugnaram o certame e que o TCE-SP ainda não julgou se houve irregularidades. Afirma ainda que a empresa Planservi apresentou proposta com valores inferiores ao referencial do Estado. Ele alega que “não houve qualquer favorecimento dos ex-agentes públicos que subscreveram os termos aditivos e, assim, eventual prejuízo ao patrimônio público estadual”.

Sobre a contratação dos carros, disse que “não é de responsabilidade da Secretaria de Agricultura e Abastecimento controlar durante a execução do contrato a quantidade de carro. Caso contrário, estaria desvirtuando a objeto da contratação, passando a ser contratação de mão de obra ou locação de veículos”.

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O ex-secretário Francisco Maturro, não se manifestou. Os engenheiros Silvio Bogosso e Rodrigo Santiago Azevedo não foram encontrados para colocarem suas posições. O espaço está aberto caso algum deles queira fazer algum esclarecimento.

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