BRASÍLIA – A reação da Câmara dos Deputados contra o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) é uma iniciativa de atuação em múltiplas frentes, que passa por comissões, pelo plenário e reúne parlamentares que vão do bolsonarismo ao Centrão.
Essa empreitada se dá, sobretudo, nos colegiados de Constituição e Justiça (CCJ) e de Segurança Pública, assim como envolve a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) e o próprio presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL).
Lira age especialmente após a exoneração de Wilson César de Lira Santos, primo dele, do comando da Superintendência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) de Alagoas. Depois desse episódio, ele pautou requerimentos de urgência para acelerar a votação de projetos de lei contra o MST.
Foram duas as principais iniciativas que passaram em pauta. A primeira, que proíbe que invasores de propriedades rurais sejam beneficiários de auxílios e programas sociais do governo federal e ocupem cargos na administração pública, já saiu vitoriosa na terça-feira, 16.
A segunda permite que o dono de uma terra invadida possa pedir auxílio de força policial sem precisar recorrer de ordem judicial, bastando apenas apresentar a escritura do imóvel e ainda passará por votação. Com a urgência aprovada, o texto pulará a etapa de análise em comissões e poderá ser votado diretamente no plenário.
O governo passa por um embaraço. O agronegócio é um dos principais impulsionadores do crescimento econômico nacional e é resistente ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O chefe do Executivo tenta fazer gestos para aproximar-se do setor enquanto deputados ligados ao MST criticam a atual condução do Palácio do Planalto.
“Padilha ganhou muito poder”, disse o deputado Marcon (PT-RS) ao comentar atuação do ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, em setembro de 2023. Naquele período, Padilha chegou a criticar as invasões de terra.
A queixa ainda permanece. Na semana passada, deputados do PT ligados à pauta agrária reuniram-se com o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, e houve divergências dos dois lados. Eles concordaram, porém, que o repasse orçamentário ao Incra e à reforma agrária é insuficiente – queixa que se alonga desde 2023.
A CCJ iniciou a ofensiva nesta segunda-feira, 15, em uma reação às invasões promovidas pelo MST por todo o Brasil, no chamado “Abril Vermelho”. A presidente da comissão, Caroline de Toni (PL-SC), resgatou um pacote de projetos de lei que foram promovidos pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do MST. Ela foi integrante do colegiado que investigou o movimento.
Na sessão desta quarta-feira, 17, por exemplo, o colegiado apreciou um projeto de lei que impede invasores de terra de receberem auxílio e benefícios de programa do governo e tomar posse em cargo público ou exercer função pública. A votação foi adiada em razão de um pedido de vista.
As matérias deverão ser pautadas também na próxima semana. “Tem muitos projetos nesse sentido, até porque o trabalho realizado pela CPI do MST legou várias propostas para diminuir as invasões e aprimorar a reforma agrária. Grande parte delas estão na CCJ e poderão ser pautadas sim”, afirmou De Toni.
A ação da deputada confirmou o compromisso que ela tinha firmado com a bancada do agro em março. Caroline de Toni assegurou que, caso houvesse invasões no “Abril Vermelho”, pautaria projetos de lei contra o MST.
O “Abril Vermelho” refere-se a uma parte da Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária, que ocorre sempre neste mês, em memória ao massacre de Eldorado dos Carajás, no Pará, em 1996. No episódio, 21 pessoas ligadas ao MST foram assassinadas pela Polícia Militar.
“Cada um controla os seus aliados. Com essas invasões do MST, que tem cargos e está nos ministérios e no Planalto, é assim que o governo federal diz querer paz no campo?”, questionou Pedro Lupion (PP-PR), presidente da Frente Parlamentar Agropecuária no X (antigo Twitter).
O ex-presidente da CPI, deputado Zucco (PL-RS), é uma das peças importantes dessa nova empreitada. Ele é o presidente da Frente Parlamentar Mista Invasão Zero, que trata sobre o tema. Ele reuniu-se com Lira para pedir que os projetos entrassem em pauta, o que acabou por ocorrer. Ele é o autor do projeto de lei que teve a urgência aprovada na terça-feira.
O Invasão Zero também é um movimento nacional que reúne deputados e empresários do agronegócio que atuam para reduzir a zero as invasões de terra no País. Em reação ao “Abril Vermelho”, o grupo articula ações em oposição no chamado “Abril Amarelo”.
Zucco também é integrante da bancada da bala, e o grupo também tem papel importante para fazer matérias contra invasões avançarem. Na Comissão de Segurança Pública, por exemplo, está um projeto de lei que propõe criar um cadastro nacional de invasores de propriedades urbanas e rurais e punir infratores com a remoção de benefícios sociais.
O projeto é de autoria do deputado Marcos Pollon (PL-MS), que também é presidente da Associação Proarmas, a mais representativa da classe de colecionadores de armas, atiradores esportivos e caçadores (CACs).
O presidente da Comissão de Segurança Pública, Alberto Fraga (PL-DF), disse ao Estadão que pautará projetos contra o MST assim que puder. Fraga é o presidente da bancada da bala.
Na próxima semana, deverá haver um grande ato do agronegócio na Câmara. A Casa realizará uma sessão solene em homenagem ao Dia Mundial da Agricultura, com a presença de deputados ligados ao agro. Foram convidados empresários de vários setores do agronegócio nacional para participar do evento, que homenageará o agricultor e repudiará as invasões de terra.
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