BRASÍLIA – O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) foi eleito nesta quarta-feira, 6, presidente da Comissão de Educação da Câmara, por 22 votos favoráveis e 15 votos em branco. A decisão se deu após falhar a articulação de parte do PT, que tentava impedir que o parlamentar indicado pelo PL ocupasse o posto. Petistas alegam que o partido oposicionista teria quebrado um acordo estabelecido e feito a indicação de última hora para tentar barganhar com o PT pela vice-presidência no colegiado de Saúde.
A falha na articulação para a Comissão de Educação já havia se dado nos debates sobre o comando do principal colegiado da Casa. Mesmo com o governo tentando impedir, o PL conseguiu eleger Carol de Toni (PL-SC), uma das mais fervorosas oposicionistas, para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde passam todos os projetos em tramitação.
Afastado da Câmara por licença-paternidade, Nikolas gravou um discurso pronto, publicado depois da votação na Comissão de Educação. Ele defendeu, entre outras pautas, o homeschooling, e argumentou que a pluralidade de ideias se dará nos debates.
“Como presidente, vamos realizar várias audiências, vamos fazer subcomissões, além de fiscalizar a educação no atual governo. Vamos fazer uma comissão bastante plural no sentido de debate de ideias”, disse.
Como mostrou o Estadão, o governo trabalhou para a mudança na indicação do PL e pediu para que nenhum deputado marcasse presença para não haver quórum. A sessão, que deveria se iniciar às 15h30, só começou apenas por volta das 19h30.
No seu primeiro mandato de deputado federal, Nikolas é um dos parlamentares que compõem a linha de frente de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que mais provocam os governistas na Casa.
Em um dos principais episódios, que rendeu uma representação feita pelo PT no Conselho de Ética, Nikolas colocou uma peruca, disse ser “deputada Nikole” e pregou contra o feminismo no plenário da Câmara.
Em meio aos debates para a eleição na Comissão de Educação, Samia Bomfim (PSOL-SP) apontou que Nikolas não poderia assumir a função em razão de ser réu por transfobia após expor uma adolescente transexual de 14 anos nas redes sociais, em 2023. Ele divulgou um vídeo no canal do YouTube em que criticava a presença de uma aluna transexual em um banheiro feminino de uma escola da cidade.
No vídeo, intitulado “travesti no banheiro da escola da minha irmã”, o deputado expôs o nome do colégio e mostrou o momento em que a aluna foi questionada pela irmã dele, também menor de idade, dentro no banheiro feminino. O pedido foi indeferido pelo presidente em exercício da sessão instaurada, Moses Rodrigues (União-CE).
Para Tabata Amaral (PSB-SP), a escolha do nome de Nikolas trata-se de uma “vergonha” para a história do colegiado, que segundo ela ficou “apequenado” por escolher um deputado “extremista”. “A gente vai ter uma pessoa que tem postura de moleque, já destratou inúmeras deputadas no plenário, que não tem postura, que não sabe dialogar, que não tem tamanho para ser deputado federal, quem dirá para ser presidente da Comissão de Educação”, afirma. “Nossa educação está longe de ser referência no mundo e me entristece muito saber que a gente está apequenando esse espaço tão importante.”
Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), primeiro-vice-presidente da Câmara, fez um apelo, dizendo que Nikolas ouvirá a todos, inclusive deputados do PT. “Gostaria de dizer que, conhecendo como funciona esta Casa, nenhuma comissão funcionará sem um deputado que tenha diálogo com todos. Tenho convicção do bom trabalho que ele vai fazer”, diz.
Rogério Correia (PT-MG), por sua vez, afirmou que não votaria em Nikolas, que estava ausente dos debates, pois estaria dando um “cheque em branco” ao parlamentar para, segundo ele, apresentar pautas ideológicas. “Não sei qual a pauta que teremos aqui”, questionou.
Correia afirma que o acordo com o PL previa que o deputado Joaquim Passarinho (PL-PA) seria indicado, o que não aconteceu. “Não se trata de ter acordo com o PL. Temos divergências, mas ele não tem posturas antiparlamentares. Não é o caso do que acontece agora (com a escolha de Nikolas)”, disse.
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Nos bastidores, PT e PL negociam para que as siglas possam indicar, respectivamente, o primeiro-vice-presidente das comissões de Educação e Saúde. Esta última será presidida pelo petista Dr. Francisco (PI). Na reunião com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e demais líderes partidários, o acordo nesse sentido chegou a ser firmado.
“Evidente que um presidente de uma comissão de uma importância dessa não pode fazer loucura”, disse o líder do governo, José Guimarães (PT-CE), aceitando o resultado final poucos minutos depois da reunião. “Fizemos várias ponderações e, no final, o PL não abre mão e nós vamos pacificar”, havia afirmado antes da votação.
Apesar da fala prévia de Guimarães, dentro de grupos do PT no WhatsApp passou a chegar a orientação do líder da bancada, Odair Cunha (MG), para que os deputados não dessem quórum nas reuniões de instauração das comissões, com a finalidade de adiar o funcionamento delas. Foi a senha para integrantes da sigla pedirem o rompimento do acordo e tentasse impedir a eleição de Nikolas, mas a estratégia falhou e o PL conseguiu reunir os votos necessários para a aprovação.
Petistas ouvidos pela reportagem reservadamente alegam que a manobra que acabou permitindo que o nome do PL ficasse no comando da Educação seria para garantir controle na Comissão de Saúde, que é dona, com sobras, do maior repasse com as emendas de comissão turbinadas em 2024. O PT, que a comanda, será responsável por destinar R$ 4,5 bilhões. A definição pelas vice-presidências ficou para a próxima semana.
Discussão antes do início da sessão
Antes mesmo de a sessão ser aberta, houve um debate entre deputados de direita e esquerda na sala da comissão. Em conversa com deputados do PL, entre eles Domingos Sávio (MG), Sóstenes Cavalcante (RJ) e Bia Kicis (DF), Tarcísio Motta (PSOL-RJ) disse haver preocupação na ala progressista da Câmara de que Nikolas na presidência pautaria temas polêmicos e deixaria de lado “problemas reais” do País.
“O que queremos é que tenha respeito ao conjunto da Educação aqui, senão essa comissão não vai funcionar”, afirmou Tarcísio. Ele também citou preocupações de que o PL não faça indicações de deputados de esquerda a relatorias, ou que não sejam pautados temas caros ao espectro político, competências de um presidente de comissão.
Sóstenes respondeu. “Ele (Nikolas) terá, como qualquer presidente do PL teve, que ter o equilíbrio que o PL teve, que sentar com o vice-presidente do PT para fazer a pauta em conjunto. Não pode partir da premissa de que vai dar errado sem antes provar”, afirmou.
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