Novo secretário de Segurança de Ricardo Nunes rejeita uso de câmeras corporais na GCM

Ex-prefeito de São Bernardo do Campo defende a ampliação do sistema de vigilância com câmeras inteligentes na cidade e diz que a Prefeitura pretende expandir de 23 mil para 40 mil os equipamentos até o fim do ano: ‘Foragidos e procurados pela Justiça não encontrarão mais em São Paulo uma zona neutra para se viver’

PUBLICIDADE

Foto do author Bianca Gomes
Foto do author Pedro Augusto Figueiredo
Foto: Taba Benedicto/Estadão
Entrevista comOrlando MorandoSecretário de Segurança Urbana da Prefeitura de São Paulo

Recém-empossado secretário de Segurança Urbana da capital paulista, Orlando Morando (sem partido) rejeita o uso de câmeras corporais pela Guarda Civil Metropolitana. Em entrevista ao Estadão, ele justificou que a medida não se aplica à GCM, pois ela não é uma força de segurança, e sim uma guarda patrimonial. Além disso, afirmou que, devido à baixa letalidade da corporação, não há razão para investir recursos nesse tipo de equipamento. Ex-prefeito de São Bernardo do Campo (SP), Morando deixou o PSDB após quase duas décadas de filiação e, poucos dias depois, embarcou no governo emedebista de Ricardo Nunes. O novo secretário garante não ter pressa para escolher uma nova legenda, mas ressalta que agora tem “chefe” e consultará o prefeito quando chegar a hora.

O uso de câmeras corporais se tornou um ponto sensível para o governador paulista Tarcísio de Freitas (Republicanos), que chegou a afirmar que o equipamento não tinha “nenhuma” efetividade na segurança do cidadão. No entanto, no ano passado, diante do aumento dos casos de violência policial, Tarcísio reconheceu que sua postura estava “completamenteerrada e admitiu ter uma “visão equivocada” sobre o tema.

Se por um lado rejeita as câmeras corporais, por outro, Morando aposta na ampliação das câmeras de monitoramento para reduzir a criminalidade. Segundo ele, ainda este ano, a prefeitura vai expandir de 23 mil para 40 mil o número de câmeras de reconhecimento facial instaladas pela cidade, como parte do programa Smart Sampa.

Outros ex-prefeitos, como Rogério Lins, de Osasco, e Rodrigo Ashiuchi, de Suzano, também assumiram cargos de secretário, em articulações do Podemos e do PL. No seu caso, o senhor deixou o PSDB recentemente. Como foi a conversa com o prefeito?

Não foi tratado de partido. Minha decisão de sair do PSDB foi pessoal, e eu, inclusive, emiti uma nota. Acho que a essência do PSDB acabou, virou um partido cartorial, com dono, sem vontade coletiva, sem respeito democrático, e não havia mais motivo para eu continuar. Por isso, saí. Quanto à migração, estou sem partido, e o prefeito, ao me convidar, não tratou de filiação partidária.

Publicidade

Mas o senhor já está em conversa com alguma sigla?

Eu sei que eu tenho chefe. Não tomarei nenhuma decisão sem ouvi-lo, naturalmente. Mas não tenho nenhuma prioridade de tratar de partido agora e o prefeito não me impôs nenhuma obrigação.

Qual é a sua avaliação sobre a forma como o governo federal tem lidado com a questão da segurança?

Acho que a maior prova é esse convênio que assinamos no último dia 10. É um avanço, algo que não existia antes. O Governo Federal vai disponibilizar o Banco de Dados Nacional com informações de todos os veículos irregulares, sejam eles procurados ou roubados. É um avanço, e entendo que podemos, sim, continuar firmando mais parcerias, inclusive buscando investimentos para a Secretaria.

O governo federal não tem uma força de segurança permanente nos estados. O estado é o responsável pela segurança por meio da Polícia Militar, Polícia Civil, Polícia Científica e Corpo de Bombeiros, enquanto os municípios passaram a desempenhar um papel muito importante com suas GCMs. O governo federal, no exercício de seu papel legislador — que considero ser sua principal função —, pode contribuir com investimentos, mas não está presente no dia a dia da segurança.

Mas há alguma avaliação que possa ser feita em relação à PEC da Segurança e ao decreto de Lula sobre o uso da força policial, ambos bastante criticados?

Esse é um assunto a ser debatido, primeiramente, pelo Congresso e pelos governadores, portanto, não me diz respeito.

Publicidade

Qual o plano do senhor para o Smart Sampa, sistema com câmeras inteligentes de São Paulo que se tornou uma vitrine do prefeito?

É o melhor programa que a Secretaria de Segurança já implantou. Os equipamentos servem não apenas para reprimir, com velocidade e austeridade, as práticas criminosas que eventualmente possam acontecer, mas para trazer a certeza de que foragidos e procurados pela Justiça não encontrarão mais em São Paulo uma zona neutra para se viver.

O novo secretário de Segurança de São Paulo, Orlando Morando, no Smart Sampa Foto: tiago queiroz

O programa hoje já conta com 18 mil câmeras espalhadas por toda a cidade de São Paulo. A grande maioria faz parte do sistema Smart Sampa, mas já há mais de 5 mil câmeras da rede privada. Aqui, podemos conectar ao sistema câmeras de condomínios, prédios, postos de gasolina, sacolões e padarias. Isso porque a tecnologia não está na ponta da câmera, mas na recepção da imagem colhida por ela. A meta é chegar a 40 mil câmeras até o final deste ano.

Como é uma política colaborativa, depende da adesão de terceiros. Estamos conversando com outros parceiros, como concessionárias e o metrô, que ainda não estão integrados. Pretendemos estender a cobertura para parques e todas as áreas de grande circulação, além do centro de São Paulo. Também há a ideia de ampliar o monitoramento nas proximidades dos terminais Barra Funda e Tietê, além da região próxima ao aeroporto de Congonhas. Na semana passada, assinamos um termo colaborativo [com o governo federal] para incluir no sistema informações sobre veículos apreendidos de todos os estados brasileiros. Nós estamos no ano de 2025 com média de oito prisões por dia de procurados pela Justiça. Isso aqui é um cerco às práticas criminosas na cidade de São Paulo.

Como o senhor vê essas críticas de que a cidade vai virar um Big Brother?

Isso é uma crítica? Para mim, é um megaelogio. Tenho certeza de que o cidadão de bem quer ser monitorado por um sistema de segurança. Quem tem medo de câmera é quem deve para a Justiça. O cidadão de bem, eu tenho certeza, quer ser assistido.

Publicidade

O senhor defendeu o uso de câmeras na cidade. Qual a sua opinião sobre a implementação de câmeras nos uniformes dos GCMs?

PUBLICIDADE

Recentemente, houve uma decisão do Supremo em relação ao uso de câmeras corporais pelas polícias. Não há decisão para a GCM. Se você me perguntar, como secretário, se eu defendo o uso de câmeras pela GCM, a resposta é não. O Smart Sampa também é um sistema de controle da própria GCM. Não se justifica fazer um investimento e gastar para equipar cada GCM com uma câmera se já temos o maior programa de proteção por meio do próprio Smart Sampa. Além disso, qual seria a motivação para usar câmeras? Qual foi a letalidade que um GCM cometeu que justificaria essa medida? Não há uma recorrência. É muito baixa. Não que não exista, porque é possível, mas não justifica o investimento.

É importante termos clareza sobre o papel da Guarda: a GCM é, essencialmente, uma guarda patrimonial. Embora, muitas vezes, ela acabe cumprindo um papel nas forças de segurança, mas ela não é [considerada uma força de segurança]. Por isso, não entendo que há necessidade de uso câmeras corporais na GCM. Para adotar essa medida, seria necessário também dar outras atribuições pela qual não se estendem. Eles não podem fazer algumas ações que as polícias fazem. Entendendo a importância que tem a GCM, mas eu compreendo que não há necessidade, porque eles não são reconhecidos como polícia, são uma guarda, e a essência principal é patrimonial.

A GCM não usa armamento pesado, como fuzil?

Autorizou-se uma melhora, mas tudo isso depende de autorização do Ministério da Defesa e da Polícia Federal, então tem um controle. Diferente dos Estados, que podem portar um armamento maior — as polícias civil e militar — sem esse controle. A GCM tem regras. Vou te dar um exemplo: os Estados possuem regimes próprios para a aposentadoria dos policiais, que se aposentam mais cedo que os trabalhadores comuns. Já as GCMs precisam seguir a lei da Previdência, em que homens se aposentam aos 65 anos e mulheres aos 62, o que, na minha opinião, é extremamente errado. Como prefeito, fiz uma lei municipal [para mudar essa regra], mas, infelizmente, ela foi derrubada na Justiça. É por isso que eu digo: não dá para tratar a GCM como polícia quando é conveniente e, quando não é, desconsiderá-la.

Quais são suas primeiras medidas planejadas para a pasta? Há alguma prioridade?

A prioridade que o prefeito me pediu foi a Defesa Civil, considerando que estamos entrando no período climático mais desfavorável, sob o aspecto de deslizamentos, enchentes, quedas de árvores e falta de energia elétrica. No caso de São Paulo, a Defesa Civil é vinculada à Secretaria de Segurança Urbana.

Publicidade

Além do Smart Sampa, quais outras iniciativas o senhor pretende desenvolver na área de segurança durante seu mandato?

Tem um ponto de São Paulo que não é um problema exclusivo da cidade, mas de toda a metrópole: os descontroles sociais por aglomerações, os chamados pancadões, que geram bastante desconforto. Tive uma reunião longa com o Coronel Mello Araújo (vice-prefeito) e trouxe para ele o programa Noite Tranquila, que eu tinha em São Bernardo. A ideia é tentar estruturar esse programa, obviamente sempre apresentando ao prefeito Ricardo e validando com ele, para diminuir esses problemas, principalmente na periferia. Você não vê pancadão em áreas nobres da cidade; isso acontece na periferia, e tira profundamente a tranquilidade [das pessoas] e pode gerar reflexos como violência, gravidez precoce na adolescência, início do uso de drogas por crianças e jovens, além do consumo de bebidas alcoólicas por menores de idade.

Esse programa envolve aumento de efetivo aos finais de semana?

Sim. Eu aumentei o efetivo. Mas esse é um programa intersecretarial, não apenas de segurança. Trata-se de um programa de controle que envolve a Secretaria de Saúde, através da vigilância, trânsito para apreensão de equipamentos irregulares, como carros e motos, e também ações de segurança relacionadas ao funcionamento de comércios irregulares.

Defendemos toda atividade cultural, elas são bem-vindas, mas o direito das pessoas a uma noite em paz também é um direito de toda a sociedade. Infelizmente, quem promove essas atividades, na maioria das vezes, não está muito preocupado se o vizinho vai estar dormindo ou não.

O senhor mencionou a diferença entre a Guarda e as polícias. O senhor é a favor de ampliar as atribuições da Guarda, conceder poder de polícia e redefinir seu papel?

As prefeituras estão assumindo cada vez mais responsabilidades que deveriam ser da União e dos Estados. Conforme os poderes aumentam, as despesas também crescem. Aqui em São Paulo, há um efetivo de 7 mil guardas, e vou apurar quantos PMs atuam na cidade. Em São Bernardo do Campo, onde fui prefeito, o efetivo da GCM já era maior que o da PM, mas quem paga o salário da GCM é o orçamento municipal.

Publicidade

Para aumentar o poder, seria necessário dividir os custos entre União, Estado e município. Porque daqui a pouco sobra toda a responsabilidade para a GCM, a sociedade vai cada vez cobrar mais que tenha mais guardas, mas e o papel do Estado? Vale lembrar que a Constituição deixa claro que segurança pública é dever do Estado. Isso não significa que a responsabilidade não deva ser compartilhada. Está aqui a prova: o prefeito Ricardo Nunes tem feito investimentos históricos na Secretaria de Segurança. No entanto, é fundamental entender melhor essa conta, pois, além de contribuir com a segurança, a Prefeitura tem atribuições que são exclusivamente dela, como a educação até o quinto ano.

Siga o ‘Estadão’ nas redes sociais

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.