Após a revelação de que o gabinete do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu, por meio de canais informais, a produção de relatórios ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para embasar decisões na mais alta Corte do País, Moraes afirmou, em nota, que todas as investigações conduzidas por ele seguiram as normas previstas em lei, argumentando que a Justiça Eleitoral dispõe de poder de polícia e que a Procuradoria Geral da República (PGR) participou integralmente dos casos.
Segundo reportagem do jornal Folha de S. Paulo, auxiliares diretos de Moraes solicitaram, por meio de mensagens de Whatsapp, que o órgão de combate a desinformação do TSE produzisse relatórios sobre pessoas e organizações suspeitas de promoverem ataques ao Supremo e à própria democracia. Após a produção, esses documentos eram utilizados pelo gabinete de Moraes, no STF, para embasar decisões no âmbito dos inquéritos das fake news (Inq 4781) e das milícias digitais (Inq 4878), sendo que o primeiro trata-se de um processo físico, aberto de ofício e sob sigilo.
Apesar de a produção desses documentos pelo TSE fazer parte das atribuições do órgão, a ausência de comunicação formal entre o gabinete de Moraes, no STF, e a Justiça Eleitoral tem sido alvo de críticas. Congressistas da oposição, especialmente os aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), têm condenado a prática e afirmam que vão entrar com novo pedido de impeachment contra o ministro do Supremo. Outra controvérsia envolvendo o caso são as orientações feitas por auxiliares de Moraes para a produção de relatórios sobre personalidades específicas, como o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP).
O que é poder de polícia?
Os pedidos extraoficiais feitos por auxiliares de Moraes ao TSE ocorreram no período em que o ministro presidia o órgão de cúpula da Justiça Eleitoral, segundo a Folha de S. Paulo. Esse fato é importante porque o poder de polícia do Tribunal Superior Eleitoral é usado como argumento para defender a produção dos relatórios. Considerada por juristas como a primeira função exercita pelo Estado, o poder de polícia é, efetivamente, a garantia da manutenção da ordem pública.
Em artigo disponível na biblioteca digital do TSE, a procuradora da República Eloisa Helena Machado faz uma distinção entre o “poder de polícia geral”, exercido pela administração pública, e o “poder de polícia eleitoral”, exercido pelo Justiça Eleitoral. Segundo a procuradora, ambos os poderes podem ser exercidos de forma preventiva e repressiva. Além disso, o poder de polícia, seja ele geral ou eleitoral, visa garantir a ordem pública, coibir irregularidades e impedir que direitos sejam violados.
Um exemplo concreto do uso do poder de polícia eleitoral se dá no controle da propaganda eleitoral. Caso um candidato fixe um outdoor em local proibido pela legislação eleitoral. O juiz eleitoral, ao tomar conhecimento da situação, poderá determinar a imediata retirada do outdoor, mesmo sem que haja qualquer denúncia formal ou ação judicial nesse sentido.
“Importante frisar que a Justiça Eleitoral é o único âmbito do Poder Judiciário em que encontramos o poder de polícia. Isto é, em nenhuma outra esfera judicial pode o juiz agir de ofício”, destaca Eloisa no artigo “O poder de polícia na Justiça Eleitoral”.
A previsão legal do poder de polícia eleitoral é garantida tanto pela Lei das Eleições (Lei 9.504/1997) quanto pelo Código Eleitoral. Segundo a resolução 23.648/2021 do TSE, o presidente da Corte Eleitoral responde pelo poder de polícia do Tribunal, “cujo exercício se dará por ele, por magistrados que presidem as sessões e audiências, e por agentes e inspetores da polícia judicial, podendo, quando necessário, ser requisitada a colaboração de autoridades externas”.
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