O que se sabe até o momento sobre as explosões no STF? Entenda os detalhes

Francisco Wanderley Luiz, empresário de 59 anos, morreu após explodir bomba em frente ao STF; Praça dos Três Poderes foi isolada e PF investiga

PUBLICIDADE

Foto do author Juliano  Galisi
Foto do author Karina Ferreira
Atualização:

A Praça dos Três Poderes permaneceu isolada até a manhã da quinta-feira, 14, após explosões na noite anterior. O caso é investigado pela Polícia Federal (PF) como terrorismo e tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito. O autor do atentado é Francisco Wanderley Luiz, de 59 anos, morto próximo à sede do Supremo Tribunal Federal (STF).

Além das explosões na Praça, o carro de Wanderley com explosivos no porta-malas foi encontrado no estacionamento da Câmara dos Deputados, nas imediações de um dos prédios anexos da Casa.

Praça dos Três Poderes amanhece sob forte policiamento após incidente com duas explosões na noite desta quarta-feira, 13 Foto: Wilton Junior/Estadão

Autor do atentado

Horas antes de morrer, Francisco Wanderley Luiz, conhecido como Tiü França, fez publicações nas redes sociais que indicavam pretensões terroristas, além de criticar os chefes dos Três Poderes. Em 2020, Francisco Luiz foi candidato pelo PL a vereador de Rio do Sul, cidade no oeste catarinense. Recebeu 98 votos e não foi eleito. O PL, na ocasião, ainda não abrigava o ex-presidente Jair Bolsonaro, que chegou à sigla somente no ano seguinte.

Imagem de Francisco Wanderley Luiz em campanha para vereador de Rio do Sul (SC) em 2020 Foto: Reprodução

Explosão na busca e apreensão

A PF e governo do Distrito Federal (GDF), por meio das polícias civil e militar, seguem apurando as circunstâncias da explosão. O inquérito da polícia distrital identificou que Francisco Luiz alugou uma casa na região da Ceilândia, em Brasília. Em entrevista na quinta-feira, 14, o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, afirmou que a avaliação é que houve planejamento “de médio a longo prazo” para a ação do homem.

Publicidade

Um exemplo da complexidade desse planejamento, segundo o diretor-geral, ocorreu na operação de busca e apreensão na casa alugada por Francisco Luiz. A entrada no local foi feita por um robô. Ao abrir uma das gavetas, houve uma explosão descrita por Rodrigues como “gravíssima”. “O uso do robô salvou a vida de alguns policiais. Se tivessem ingressado na residência, certamente não sobreviveriam à intensidade da explosão”, afirmou o diretor-geral da PF.

Trailer alugado e mais bombas

Durante as operações da PF, um trailer alugado por Francisco Luiz foi identificado em um estacionamento próximo à Câmara. O veículo foi alugado “há alguns meses”, segundo Andrei Rodrigues.

No interior do trailer, foram localizados “bombas tubo”, que consistem em tubos de PVC recheados com pólvora. O material seria utilizado para maximizar o potencial de explosões. Dentro do carro, também foram localizados documentos e um celular. O Estadão apurou que os dispositivos, chamados de “pipe bombs”, também foram usados nas explosões na Praça dos Três Poderes.

Local do atentado

Segundo a Polícia Civil do Distrito Federal, as duas explosões ocorreram por volta das 19h30. A primeira ocorreu em um carro estacionado no Anexo IV da Câmara dos Deputados. A segunda explosão ocorreu em frente ao prédio do STF, na Praça dos Três Poderes.

Publicidade

O sargento Santos, da PM do Distrito Federal, informou ao Estadão que o veículo com explosivos no estacionamento da Câmara foi parcialmente destruído por um incêndio, contido por seguranças próximos ao local. Segundo o relato do sargento, os policiais avistaram um homem saindo correndo do carro, mas presumiram que ele estava fugindo do fogo. Na verdade, tratava-se de Francisco Luiz, proprietário do carro e detonador das bombas.

Confronto com seguranças do STF e explosão fatal

Minutos antes dessa explosão, Francisco Luiz acessou o Anexo IV da Câmara e foi ao banheiro. A movimentação avistada pelos policiais e relatada pelo sargento Santos se refere ao trajeto de Francisco Santos até o STF. Ele tentou entrar na sede da Corte, mas foi impedido por seguranças.

As circunstâncias foram narradas por um desses seguranças em depoimento à polícia. Segundo o servidor público Natanael da Silva Camelo, “o indivíduo (Francisco Luiz)” se aproximou da estátua da Justiça, que fica na frente do prédio do STF, trazendo “consigo uma mochila e estava em atitude suspeita em frente à estátua, colocou a mochila no chão, tirou um extintor, tirou uma blusa de dentro da mochila e a lançou contra a estátua”.

Estátua da Justiça à frente da sede do Supremo Tribunal Federal (STF) Foto: Wilton Junior/Estadão

O depoimento segue com Natanael dizendo que, com a aproximação dos seguranças do STF, Francisco Luiz abriu a camisa e os advertiu para não se aproximarem. O servidor público disse ter visto objeto semelhante a um relógio digital, o qual, segundo o segurança, julgou se tratar de uma bomba. “(Francisco Luiz) pegou um extintor, desistiu e o colocou no chão. Saiu com os artefatos para a lateral e lançou dois ou três artefatos, que estouraram”.

Publicidade

PUBLICIDADE

Em seguida, Natanael conta que Francisco Luiz “acendeu o último artefato, colocou na cabeça com um travesseiro e aguardou a explosão”. O servidor afirmou ter visto “algo” atado ao corpo do morto, mas não soube precisar o que era.

Na noite de quarta-feira, a governadora em exercício do Distrito Federal, Celina Leão, anunciou que a Praça dos Três Poderes permaneceria isolada até que se tenha garantia de segurança no local. O corpo de Francisco Luiz permaneceu estirado no local do falecimento por 12 horas, sob a suspeita de que algum explosivo ainda estivesse ativo. Após a retirada do corpo, o cordão de contenção passou a isolar somente arredores da sede do Supremo.

Celina é vice-governadora, mas está à frente da gestão da crise, uma vez que o titular do cargo, Ibaneis Rocha (MDB), se encontra em Roma, na Itália, para uma visita ao Papa Francisco.

PF trabalha com vertentes de terrorismo abolição do Estado Democrático de Direito

A Polícia Federal trabalha com as vertentes de terrorismo e tentativa de abolição ao Estado Democrático de Direito, disse Andrei Rodrigues em coletiva de imprensa na manhã desta quinta-feira.

Publicidade

Questionado sobre a hipótese do “lobo solitário”, ou seja, de uma ação individual e sem participação de terceiros, Rodrigues afirmou que o inquérito não descartará nenhuma hipótese de imediato e que ele possui “ressalvas” dessa expressão.

“Ainda que a ação visível seja individual, por trás dessa ação nunca há só uma pessoa. Há sempre um grupo ou ideias de um grupo”, disse Andrei Rodrigues. “A investigação dirá se há outras conexões”.

Relatoria de Alexandre de Moraes

O autor das explosões desta quinta deixou uma mensagem inscrita no espelho da casa alugada na Ceilândia. “Débora Rodrigues, por favor não desperdice batom! Isso é para deixar as mulheres bonitas! Estátua de merda se usa TNT”, diz a frase. “É um dos elementos, não é o único”, disse Rodrigues sobre a relação entre os dois episódios de ataque aos prédios públicos.

Andrei Rodrigues afirmou que a alusão de Francisco Luiz à ré Débora Rodrigues, que pichou a inscrição “Perdeu, mané” na estátua da Justiça à frente do Supremo, indica uma “relação direta” entre o atentado desta quinta com o ataque aos Três Poderes em Brasília em 8 de janeiro de 2023.

Publicidade

Mensagem endereçada a Debora Rodrigues foi encontrada em espelho da casa que homem alugava, na Ceilândia (DF). Foto: Guilherme Caetano/Estadão

Por determinação do presidente do STF, Luís Roberto Barroso, o processo será relatado pelo ministro Alexandre de Moraes, pelo princípio do “juiz prevento”. Trata-se de um dispositivo de órgãos colegiados por meio do qual o relator de uma determinada ação fica com a guarda de outra causa de natureza semelhante. É o caso da investigação do atentado desta quarta-feira e de Alexandre de Moraes, relator dos inquéritos sobre o 8 de Janeiro

Debates sobre anistia do 8 de Janeiro

Moraes afirmou no dia seguinte ao atentado que caso não foi isolado e que uma pacificação é necessária, mas não será feita com perdão aos criminosos. Segundo o ministro, as explosões são resultado do ódio político que se instalou no País nos últimos anos e defendeu que não haja anistia aos envolvidos na invasão do 8 de Janeiro.

“O que ocorreu ontem não é um fato isolado do contexto. Queira Deus que seja um ato isolado, este ato. Mas o contexto é um contexto que se iniciou lá atrás, quando o famoso gabinete do ódio começou a destilar discurso de ódio contra as instituições, contra o Supremo Tribunal Federal, principalmente. Contra a autonomia do Judiciário, contra os ministros do Supremo e as famílias de cada ministro”, afirmou.

Perfis do autor indicam pretensões terroristas

Nas redes sociais, Francisco utilizava o apelido de Tiü França e demonstrava ser adepto de teorias da conspiração. Horas antes de morrer, fez publicações que indicavam pretensões terroristas. “Pai, ‘Tiü França’ não é terrorista, né? (...) Ele apenas soltou uns foguetinhos para comemorar o dia 13″, diz um texto publicado pelo homem morto, fazendo referência à data desta terça-feira. Os perfis de Francisco Luiz foram retirados do ar.

Publicidade

Francisco Luiz publicou mensagens com pretensões terroristas horas antes de morrer Foto: Reprodução

Visitas ao STF e a gabinete na Câmara: ‘Raposa no galinheiro’

Em outra publicação, Francisco Luiz publicou uma fotografia em que aparece no plenário do STF. Na legenda, o catarinense afirmou que “deixaram a raposa entrar no galinheiro”. A fotografia não é datada, mas há registros de uma visita de Tiü França ao STF em 24 de agosto.

'Raposa no galinheiro', disse Francisco Wanderley sobre visita ao STF em 24 de agosto de 2024 Foto: Reprodução

Também há registros de uma visita de Tiü França ao gabinete do deputado Jorge Goetten (Republicanos-SC) no ano passado. Ao Estadão, Goetten disse ter percebido o amigo “alterado” na ocasião. “Diziam que estava com problemas mentais por causa da separação da mulher”, afirma o parlamentar, relatando não saber que Francisco Luiz estava em Brasília nesta quarta-feira.

“Conhecia ele, era um cara equilibrado. Sempre foi um cara ativo. Lamento muito o acontecido. Lamento a morte e lamento o que ele causou”, disse Jorge Goetten.

Compra de fogos de artifício

Imagens obtidas pela Polícia Civil do Distrito Federal mostram que Wanderley comprou fogos artifícios em uma loja regular na semana anterior ao atentado. Informações preliminares apontam que ele modificou o material, de maneira caseira, para potencializar o efeito explosivo.

Publicidade

Acesso limitado ao STF até final do ano

A Corte implementou grades cercando o prédio e limitou as visitações públicas, que permanecem suspensas por tempo indeterminado, além de protocolos excepcionais que estão sendo adotados após o atentado.

A previsão é que eles sejam reavaliados ao longo dos próximos meses. Enquanto isso, as sessões de julgamentos estão mantidas, mas com acesso restrito a advogados das partes e jornalistas previamente credenciados. Todos são submetidos a um esquema de segurança rigoroso.

Casa sofre incêndio em Rio do Sul

Na manhã deste domingo, 17, quatro dias após o atentado em Brasília, a casa de Wanderley, localizada em Rio do Sul (SC), sofreu um incêndio. Segundo informações do 15° Batalhão de Bombeiros Militar de Santa Catarina, a ocorrência aconteceu por volta das 7h e uma mulher, cuja identidade não foi confirmada, sofreu queimaduras de até terceiro grau por todo o corpo. A Policia Federal (PF) informou que vai assumir a investigação.

Siga o ‘Estadão’ nas redes sociais

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.