A decisão do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), desta segunda-feira, 28, que anulou todos os atos processuais do ex-juiz Sérgio Moro contra o ex-ministro José Dirceu no âmbito da Operação Lava Jato, se soma à lista de extinções que a Corte já impôs sobre ações da força-tarefa ao longo de quase cinco anos.
Decisões da Lava Jato anuladas pelo STF
Desde 2019, o Supremo e outras Cortes superiores têm anulado decisões de primeira instância, se baseando não no mérito das denúncias, mas em questões processuais. Caso a tipificação do crime esteja incorreta, segundo a nova análise das instâncias superiores, o processo é anulado. Da mesma forma, se as provas que baseiam determinada sentença são anuladas, o processo conseguinte deixa de ser válido.
Na nova decisão de Gilmar, os efeitos da suspeição de Moro, que foi declarado parcial em abril de 2021, se estende também aos processos que envolvem Dirceu.
Algumas das anulações acabaram resultando em um efeito cascata que afeta diversas outras decisões, que juntas colocam em frangalhos a operação que, no seu auge, foi considerada a maior mobilização judicial do País contra políticos suspeitos de desvios de recursos públicos.
Confira, a seguir, sentenças e provas da Operação Lava Jato que acabaram anuladas pelo STF.
Primeiro caso anulado por entendimento de competência em março de 2019
O primeiro caso da Lava Jato anulado devido ao entendimento de a competência de julgamento ser da Justiça Eleitoral foi registrado em março de 2019. O inquérito em pauta tratava do atual prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD), e do deputado federal Pedro Paulo (PSD-RJ), que eram acusados de lavagem de dinheiro e caixa dois em campanha. Na época, os dois eram do DEM, que, após fusão com o PSL, deu origem ao União Brasil.
A decisão da Corte provocou um “efeito cascata” desastroso para a Lava Jato, pois o STF decidiu que a prática de caixa dois é de competência exclusiva da Justiça Eleitoral. Por isso, a Justiça Federal, na qual tramitavam os processos da força-tarefa, foi retirada de todas as ações do gênero.
Primeira sentença anulada em agosto de 2019
A primeira sentença da Lava Jato anulada pelo STF foi a de Aldemir Bendine, ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras. A decisão foi da Segunda Turma do STF, por 3 votos a 1, em agosto de 2019. A razão foi processual: como Bendine era alvo da acusação, cabia a ele o direito de ser o último a se manifestar no processo. No entanto, ele havia sido obrigado a entregar o seu memorial ao mesmo tempo que os delatores.
Condenação de Lula em abril de 2021
O caso mais célebre de condenação anulada é a do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em abril de 2021, por 8 votos a 3, o plenário do STF selou que a 13ª Vara Federal de Curitiba não era competente para avaliar as ações penais do petista. Com isso, todas as condenações contra ele foram decretadas nulas.
Ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha em maio de 2023
A anulação do processo contra o ex-deputado federal Eduardo Cunha (PRD), que havia sido condenado a 15 anos de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, ocorreu em maio de 2023. Cunha foi julgado pela 13ª Vara Federal de Curitiba, mas o STF foi acionado para julgar a competência do caso. Por 3 votos a 2, a Segunda Turma da Corte entendeu que, na verdade, o ex-presidente da Câmara dos Deputados deveria ter sido processado na Justiça Eleitoral.
Sérgio Cabral e Gilberto Kassab em agosto de 2023
Em agosto de 2023, o ex-governador do Rio Sérgio Cabral, que chegou a ser condenado a mais de 400 anos de prisão por casos de corrupção e se tornou o símbolo da Operação no Rio, se livrou de uma das acusações. O ministro Dias Toffoli anulou o uso de provas da Odebrecht contra Cabral e contra o secretário de Governo e Relações Institucionais de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD).
Toffoli estendeu aos dois o entendimento do ministro aposentado Ricardo Lewandowski, que considerou as provas obtidas a partir dos sistemas Drousys e My Web Day B, utilizados no acordo de leniência fechado pela Odebrecht com a Lava Jato, “imprestáveis” e “desprovidas de lastro probatório mínimo”.
Todas as provas do acordo de leniência da Odebrecht em setembro de 2023
Por decisão do ministro do STF Dias Toffoli, em setembro de 2023, todas as provas obtidas por meio do acordo de leniência da Odebrecht, entre as quais estavam os relatórios de contabilidade do que ficou conhecido como o “setor de propinas” da empreiteira, foram declaradas nulas.
Em dezembro do mesmo ano, o ministro anulou também a multa do acordo de leniência do grupo J&F, derivado de investigações da Lava Jato.
Ex-deputado André Vargas em outubro de 2023
Sob relatoria do ministro Cristiano Zanin, o STF anulou, em outubro do ano passado, a condenação do ex-deputado federal André Vargas por razões processuais, baseando-se em uma resolução anterior do colegiado. A Corte havia decidido que a 13ª Vara Federal de Curitiba só podia julgar e condenar atos ilícitos no âmbito da Petrobras, tornando improcedente a condenação de André Vargas naquele local.
Vargas foi o primeiro político condenado pela Lava Jato, pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro em setembro de 2015. Somadas, as penas impostas por Moro passavam dos 15 anos de prisão.
Beto Richa em dezembro de 2023
Toffoli também determinou a nulidade absoluta de todos os atos praticados em processos da Lava Jato contra o ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB). As provas foram declaradas ilícitas após vazamento expostos pela Operação Spoofing que mostraram suposto conluio processual envolvendo Moro e os procuradores Deltan Dallagnol e Diogo Castor de Mattos, no caso específico de Richa.
Ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e marqueteiros João Santana e Mônica Moura em fevereiro de 2024
Em fevereiro, o ministro do STF Edson Fachin anulou as condenações do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e dos marqueteiros João Santana e Mônica Moura. Eles haviam sido denunciados pelo suposto recebimento de caixa dois para o PT nas eleições de 2010. Na avaliação de Fachin, o processo deveria ter tramitado na Justiça Eleitoral do Distrito Federal, e não na 13ª Vara Federal de Curitiba.
Siga o ‘Estadão’ nas redes sociais
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.