BRASÍLIA - O jornalista e consultor político Eduardo Oinegue recusou o convite para ser porta-voz do presidente Michel Temer. A decisão foi tomada após uma longa conversa na manhã desta quinta-feira, 22, no Palácio do Jaburu. Em nota divulgada pelo Planalto, o governo esclareceu que Oinegue entregou a Temer uma proposta de plano estratégico para as várias áreas da comunicação. "O objetivo é colocar a comunicação no centro das decisões governamentais. Pelo plano, o porta-voz seria um diplomata, não Oinegue. O presidente vai estudar os outros pontos do plano", diz a nota.
Na conversa, segundo apurou o Broadcast Político, os dois discutiram sobre o "escopo, natureza e objetivo da função" de porta-voz. A avaliação do Planalto é que o governo precisa afinar e concentrar o discurso para evitar ruídos e desgastes, que o obrigou a ter seguidos "recuos". Fontes ouvidas pelo Broadcast Político, entretanto, afirmaram que pelo perfil de Oinegue, seu papel no governo teria que ser ainda mais extenso do que um simples porta-voz, já que ele é consultor político.
Em artigo publicado no ano passado, na revista da ESPM e reproduzido no Observatório da Imprensa, Oinegue destacou que a comunicação é parte de um processo decisório e não apenas a parte final de uma estratégia de governos ou empresas. "Boa parte dos problemas que impactam a imagem de uma organização seria solucionada se um profissional de comunicação - cujos conhecimentos técnicos os líderes respeitem - fosse integrado ao grupo decisório para participar da formulação da estratégia", escreveu.
O jornalista e consultor escreveu ainda que "haverá o momento em que a estratégia de comunicação será falar abertamente, com todos os jornalistas". "Haverá outros em que convém dar entrevista a alguns poucos jornalistas, ou a um só. Em certas ocasiões, o melhor não é falar, mas escrever e distribuir uma nota à imprensa. Ou escrever e colocar no site oficial. Ou conversar informalmente, "off the record". Não serão poucos os casos em que o melhor caminho será até o silêncio", avaliou.
No mesmo artigo, Oinegue, afirmou que os líderes brasileiros, tanto do setor público quanto do privado, não demonstram muito apreço pela "comunicação". "Há sinais claros de que ela só ganha importância quando surge a chamada "crise de imagem"", escreveu. "Para desalento dos gestores públicos e privados, a origem dos problemas que comprometem a imagem institucional raramente se deve a falhas na comunicação. Vai desembocar ali em algum momento, claro. Responsabilizar a comunicação, o mordomo dessa história, é um caso clássico de investigação malfeita, é culpar a bala pelo homicídio, em vez de procurar quem puxou o gatilho", completou.
Uma das principais dificuldades do futuro porta-voz que ainda precisa ser definido será "unificar" o discurso, como quer o governo. Isso porque muitos ministros de Temer, mesmo após seguidas recomendações de tomarem cuidado com suas declarações, seguiram "falando demais" e "falando bobagem", segundo interlocutores do Planalto.
Aproximação. Oinegue e Temer se aproximaram pouco antes de o presidente se preparar para o cargo de vice, em 2010. Na época, o jornalista ajudou o peemedebista em treinamentos em comunicação. Mais recentemente, Oinegue fez parte de reuniões do grupo informal de comunicação criado por Temer, conforme mostrou o Broadcast Político.
Oinegue participou de duas das três reuniões que já foram realizadas e, segundo outros participantes, destacou-se por seu trabalho de consultoria considerado extremamente profissional por aliados do presidente. Para Gaudêncio Torquato, idealizador do grupo informal de comunicação, não haveria uma mudança de postura na escolha do presidente - que desde o início queria um diplomata para o cargo. "Talvez seja melhor alguém com postura de diplomata e com experiência em jornalismo. Oinegue é um jornalista experiente, entende de política e tem sensibilidade para analisar o cenário", afirmou.
Perfil. Oinegue tem 52 anos e construiu a maior parte da sua carreira na Editora Abril, onde permaneceu por 20 anos, 19 deles na revista Veja - da qual foi chefe da sucursal de Brasília - e um ano na revista Exame. Trabalhou em Brasília de 1989 a 1995 e assumiu a chefia da sucursal da Veja aos 24 anos. Sob seu comando, a revista fez a cobertura de impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Melo, por exemplo. Atualmente, o jornalista é sócio da editora Análise Editorial, que produz diversos anuários segmentados, e tem uma consultoria política.
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