BRASÍLIA - Parlamentares da base do governo Lula no Congresso e integrantes da Esplanada dos Ministérios temem que o relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2024, Danilo Forte (União Brasil-CE), aumente o controle do Congresso sobre o Orçamento e use o projeto para tornar impositivo o pagamento de recursos do antigo orçamento secreto, apurou o Estadão/Broadcast.
Membros do Executivo estão com um pé atrás em relação a Forte e têm lembrado que, há exatos 10 anos, o deputado desempenhou o mesmo papel na LDO, quando implementou a obrigatoriedade do pagamento das emendas individuais.
Nos bastidores, interlocutores do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), dizem que ele mesmo afirma que a tendência é o Orçamento se tornar cada vez mais impositivo. Alguns ministros estão cientes desse movimento e passaram a temer alguma “pegadinha” de Forte.
O Centrão quer, especificamente, que o pagamento dos recursos das antigas emendas de relator (RP9), se tornem impositivos, ou seja, que o Executivo tenha que pagá-los ao longo do exercício orçamentário. Por meio do esquema que ficou conhecido como orçamento secreto, revelado pelo Estadão, a cúpula do Congresso, em acordo com o governo Bolsonaro, mantinha controle total sobre a distribuição das verbas que, embora não fossem de pagamento obrigatório, eram divididas de acordo com interesses políticos.
Em dezembro, o mecanismo foi considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), pela falta de transparência. Os recursos, no entanto, foram realocados. Uma parte foi direcionada para as emendas individuais, que já são impositivas, mas outro montante virou verba discricionária dos ministérios, também por meio de emendas, sob o código RP2-A4. No entanto, o governo não tem obrigação de pagar as despesas discricionárias, caso, por exemplo, de investimentos e outras despesas.
Um acordo feito em dezembro entre o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva e o Congresso, durante a discussão da emenda constitucional da transição, previa que os parlamentares teriam controle sobre as emendas A4. Na prática, o Executivo pode decidir se permite ou não o controle do Congresso sobre esses recursos, o que sempre deixa os deputados desconfiados.
Outro pleito do Legislativo é estabelecer um calendário para a liberação das verbas das emendas individuais. Hoje, mesmo no caso das emendas impositivas, é o Executivo que controla o ritmo dos pagamentos. É comum que as verbas sejam liberadas na véspera de votações importantes no Congresso, como aconteceu com a análise da reforma tributária na Câmara, quando foram pagos R$ 2,1 bilhões.
A LDO, que serve de base para a elaboração do Orçamento da União, será analisada somente em agosto, na volta do recesso parlamentar. Nesse retorno, deputados e senadores da base já foram avisados de que terão de ficar atentos para qualquer manobra que possa vir do relator. A ordem é “conter danos”. Na visão de uma fonte do Congresso, o Orçamento vai ser a “grande batalha” do segundo semestre.
Congresso emponderado
O governo já enfrentará neste ano mais dificuldades para elaborar o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), que usa a LDO como base, por causa de mudanças nas regras fiscais. Por causa do empoderamento do Congresso nos últimos anos e as grandes mudanças na economia, a base aliada do governo - em especial, o próprio PT- lutou para ficar com a relatoria da LDO, mas fracassou. Questionado pela reportagem, Danilo Forte afirmou, por meio de sua assessoria de imprensa, que só terá condições de comentar sobre a elaboração da LDO quando o arcabouço fiscal estiver aprovado, o que deve ocorrer em agosto.
Teoricamente, a votação da LDO deveria ocorrer até 17 de julho, mas Lira adiou a análise do projeto para que os deputados pudessem se concentrar nas votações da reforma tributária e do projeto de lei que retoma o voto de desempate a favor da Receita Federal nos julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), aprovados na semana passada.
Desde o começo do terceiro mandato de Lula na Presidência, há uma grande insatisfação do Congresso com a demora na liberação de emendas, principalmente aquelas oriundas do antigo orçamento secreto. O auge do imbróglio ocorreu no final de maio, quando os deputados ameaçaram derrubar a estrutura ministerial do petista durante a votação da Medida Provisória que deu forma à Esplanada no atual governo. A Câmara considerou rejeitar a MP no plenário para mandar um recado ao Palácio do Planalto, mas o texto acabou sendo aprovado na última hora.
“Parecia que o teto do plenário Ulysses Guimarães ia cair na nossa cabeça”, resumiu o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), ao relembrar os momentos de tensão durante a votação da MP. Desde aquele momento mais agudo de desarticulação política do Planalto, a relação do governo com o Congresso vem melhorando. Na semana passada, após acelerar a liberação de emendas e negociar cargos, inclusive no primeiro escalão, Lula viu duas das prioridades do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, serem aprovadas na Câmara: a reforma tributária e o projeto do Carf.
Para agradecer, o petista chamou Lira e líderes partidários da Câmara para uma reunião no Palácio da Alvorada. Ao final do encontro, todos posaram para uma foto que parecia simbolizar a entrada do Centrão no governo. Mesmo com essa aproximação entre Lula e o Congresso, contudo, os parlamentares não querem ficar reféns do Planalto e terem em mãos os recursos das emendas apenas quando houver uma demanda do Executivo a ser negociada.
A avaliação na Esplanada é de que o atual governo conseguiu “estancar a sangria” dos recursos públicos no Legislativo vista durante a administração Bolsonaro por meio da distribuição das RP9.
As emendas parlamentares são uma forma de os congressistas enviarem recursos para suas bases eleitorais, fazem parte do funcionamento normal da máquina pública e, em tese, devem ser usadas para fomentar políticas públicas. No entanto, há críticas sobre a falta de transparência em alguns casos que envolvem, até mesmo, corrupção e favorecimento político.
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