O movimento pela República envolveu personagens e locais em vários pontos distantes da capital do Império. Como o interior de São Paulo. Dezesseis anos antes de Deodoro proclamar a República na área do Campo de Santana, no Rio de Janeiro, em Itu (SP) era realizada a Convenção Republicana, um dos marcos da luta pelo fim da Monarquia.
O evento ocorreu em um casarão de dois pavimentos. Construído no início do século 19, era residência de Carlos Vasconcelos de Almeida Prado. Passou por reformas, mas mantém a estrutura original, segundo a historiadora Anicleide Zequini, do Museu Convenção de Itu. “A fachada é a mesma que os convencionais viram, com azulejos portugueses na platibanda, as mesmas portas e janelas”, descreve. Adquirido pelo Estado, foi transformado no museu inaugurado em 18 abril de 1923.

A convenção registrou as presenças de 133 convencionais de 16 cidades paulistas, incluindo a capital. “Mas com certeza foram mais de 200, nem todos registraram presença”, afirma. “Campinas e outras cidades disputaram a realização da convenção, mas a votação feita nos clubes republicanos deu a vitória a Itu”, conta Anicleide.
O pesquisador e historiador Genaro Campoy Scriptore, que escreve um livro sobre o período, afirma que Campinas esteve no centro do movimento. “Os ideais republicanos se intensificaram a partir da revolução (liberal) de 1842, iniciada em Sorocaba e que se estendeu para outras cidades do interior, principalmente Itu e Campinas. Aqui (Campinas), o padre Diogo Feijó, ex-regente do Império, aderiu ao levante que ficou marcado pelo combate em que ao menos 17 campineiros morreram.”
Segundo o pesquisador, o campineiro Manuel Ferraz de Campos Sales logo assumiu a linha de frente dos republicanos, que tinham em Francisco Quirino dos Santos e seu irmão, João, os doutrinadores liberais. “Era um grupo apoiado pela maçonaria, que incluía Prudente de Moraes e Rangel Pestana, que morou um período em Campinas. Campos Sales formou-se em 1863 na Faculdade de Direito de São Paulo e Prudente era seu colega de turma.”
Com a República, Campos Sales se tornaria o quarto presidente do País e o segundo eleito. Governou de 1898 a 1902 e deixou marcas importantes em sua terra natal. O casarão onde nasceu e morou grande parte da vida, no entanto, foi demolido e em seu lugar ergueu-se um prédio de 12 andares. Mas o Centro de Ciências, Letras e Artes, entidade particular sem fins lucrativos, abriga em suas instalações o Museu de Campos Sales.
O local, no entanto, foi alvo de ladrões em agosto de 2013: levaram cerca de 100 peças, entre elas documentos originais de Campos Sales, uma carta do imperador chinês Guangxu e um livro com dedicatória sobre a história da dinastia Romanov, doado em sua posse como presidente por Nicolau II, último czar russo.

Em Piracicaba, a casa onde morou o primeiro presidente civil do Brasil, Prudente José de Moraes Barros (1894-1898), está preservada. Prudente nasceu na vizinha Itu, em outubro de 1841, mas passou 32 anos de sua vida em Piracicaba, onde morreu.
O casarão com nove cômodos de estilo eclético – do neogótico ao imperial – contrasta com as construções modernas da região. A antiga sala de visitas da família Moraes e Barros virou um espaço para exposições temporárias. O acervo de 12 mil peças aborda a história de Piracicaba, mas o foco principal é a vida de Prudente. Dele, há peças e objetos pessoais.

Em Rio Claro, viveram personagens importantes do movimento republicano como José Alves de Cerqueira César, Alfredo Ellis, Cândido Valle e Campos Sales. Com o fim da Monarquia, a Praça Matriz da cidade foi rebatizada de Praça da Liberdade e nela foi plantada, exatamente um mês após a proclamação, a Árvore da República. Mas ela secou. “Não deixa de ser simbólico, pois nossa República, aos 130 anos, também precisa ser revigorada”, afirma o jornalista e pesquisador José Roberto Sant’Ana. Para manter a tradição, a prefeitura informou que vai plantar outra árvore no local.
Da família de Cerqueira César, poucos vestígios restam na cidade. O clube Philarmônica Rioclarense, fundado em 1879, do qual o republicano foi o primeiro presidente, resiste. Mas o prédio clássico da época deu lugar a outro ‘modernoso’. Lá, os cafeicultores se reuniam para tramar contra o imperador, afirma o pesquisador. O Teatro Fênix, onde houve o lançamento do Partido Republicano de Rio Claro, está ocupado por lojas.

Na capital paulista, também é possível encontrar marcos importantes do período. Na Praça da República, cujo o próprio nome dispensa explicações, está o edifício Caetano de Campos, sede da primeira Escola Normal Paulista – e que hoje é sede da Secretaria Estadual da Educação. “Os republicanos, e Caetano de Campos foi um republicano de primeira hora, acreditavam que era pela educação que iriam mudar a sociedade. Para eles, os prédios das escolas deveriam ser verdadeiros templo da civilização”, conta o historiador Diógenes Lawand, do núcleo de memória do Centro de Referência em Educação Mario Covas (CRE Mario Covas).
Outro marco da República na cidade é a Faculdade de Direito do Largo São Francisco. “Muitos consideram que foi da Faculdade de Direito do Largo São Francisco que partiram os principais movimentos do século 19: o abolicionismo e o movimento republicano. De fato, a faculdade sempre foi um lugar de concentração intelectual, um celeiro de homens públicos”, diz a museóloga Heloisa Barbuy, especialista no acervo da faculdade.

Em seus bancos, como mencionado, estiveram Campos Sales e Prudente de Moraes. Entre as figuras históricas da faculdade, Heloísa destaca Américo Brasiliense – que já em 1873 presidia a convenção de Itu, que deu início ao movimento republicano em São Paulo.
Todos esses locais estão conectados a republicanos que contribuíram para que, em 15 de novembro de 1889, o marechal Manuel Deodoro da Fonseca ajudasse a dar fim à Monarquia. Estava doente, de pijama, quando o convocaram para a missão. Foi no Campo de Santana, o epicentro da antiga capital – e, portanto, do País. Da casa em que morava, ao lado da praça, foi de carruagem, puxada a cavalo, ao encontro de militares revoltosos, a cerca de 650 metros de onde estava. Era o início da Proclamação.

Assim nomeado por causa da antiga Igreja de Sant’Ana, localizada na área em que hoje é a Central do Brasil, o Campo de Santana era onde as coisas aconteciam na cidade: sediou festas e comemorações políticas e militares. Lá, d. Pedro foi aclamado imperador.
No entorno, a casa de Deodoro foi transformada em Museu Histórico do Exército e expõe peças do marechal. O Palácio do Itamaraty foi sede do governo republicano de 1889 a 1898 e depois, até 1970, abrigou o Ministério das Relações Exteriores.