O governo de Jair Bolsonaro venceu uma batalha contra a oposição e conseguiu empurrar a CPI do Ministério da Educação para depois das eleições. Com essa estratégia, dificilmente a comissão parlamentar de inquérito sairá do papel. A decisão de não abrir agora a investigação sobre o gabinete paralelo no MEC foi anunciada ontem, após uma reunião entre o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e líderes de partidos.
Pacheco disse que lerá esta quarta-feira, 6, no plenário o requerimento de instalação de três CPIs: uma para apurar a suspeita de desvio de recursos no MEC, outra sobre obras paradas e uma terceira referente ao crime organizado. O anúncio de três comissões foi interpretado no meio político como uma tática para desviar a atenção do escândalo de corrupção no governo. Diante desse quadro, a oposição ameaça entrar com recurso no Supremo Tribunal Federal (STF) para garantir a abertura da CPI do MEC. Na prática, a leitura do requerimento de instalação não significa que a comissão funcionará.
A existência de um balcão de negócios no MEC para liberação de verbas a prefeituras foi revelada pelo Estadão, em março. O pedido de abertura da CPI ganhou impulso no mês passado, após a prisão do ex-ministro Milton Ribeiro e dos pastores Gilmar dos Santos e Arilton Moura, além de dois auxiliares.
O escândalo atinge a campanha do presidente Jair Bolsonaro à reeleição e por isso o governo entrou em campo. O Palácio do Planalto sofreu um revés na articulação para impedir que a oposição conseguisse as assinaturas necessárias para abrir a CPI, mas virou o jogo ontem.
No encontro com Pacheco, a maioria dos líderes de partidos fez discurso em defesa da investigação no MEC, mas alegou que o momento pré-eleitoral não era adequado para se instalar uma CPI. Pacheco disse que os partidos também indicarão os integrantes da CPI somente depois das eleições.
“Não há recusa da presidência (do Senado), não há recusa dos líderes partidários em indicar membros. Absolutamente. Há apenas a informação de que as indicações se darão em determinado período de tempo”, afirmou ele. “É um encaminhamento lúcido, ponderado, muito lógico até, de que as CPIs podem existir, mas esse não é um momento adequado para fazê-lo.
Questionado sobre a ameaça da oposição de recorrer ao Supremo para obrigar o Senado a pôr a CPI para funcionar, Pacheco disse que o cenário de hoje é muito diferente daquele verificado em abril de 2021. À época, a Corte determinou a abertura da CPI da Covid, que desgastou Bolsonaro.
“Neste momento, não temos situação de excepcionalidade e o requerimento será lido, ou seja, o papel da presidência será cumprido com a leitura do requerimento. Os blocos e partidos políticos serão instados por meio de seus líderes a fazerem as indicações dos membros. Mas há um acordo da maioria de líderes de que a instalação, a partir das indicações, se dará em um momento oportuno”, disse Pacheco.
Autor do pedido de criação da CPI do MEC, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) reclamou da posição da maioria dos líderes da Casa. “Nós alcançamos 31 assinaturas, quatro a mais do que o mínimo necessário para que a CPI seja instalada. Assim, não cabe juízo de valor, de oportunidade e conveniência de quem quer que seja, muito menos do colégio de líderes do Senado”, argumentou Randolfe, que foi vice-presidente da CPI da Covid. “Aguardarei até esta quarta-feira a leitura do requerimento de instalação. Caso não ocorra, não restará à oposição, lamentavelmente, outra alternativa a não ser recorrer ao Supremo Tribunal Federal.”
Além de prometer para hoje a leitura de requerimentos de comissões com o objetivo de investigar obras inacabadas -- caso que, na visão do Planalto, atinge o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), principal adversário de Bolsonaro --, e também crime organizado e narcotráfico, Pacheco disse ser importante apurar o “desmatamento ilegal” na Amazônia. A investigação sobre o assunto chegou a ser aberta pelo Senado, mas estava engavetada.
“Empurrar a instalação da CPI do MEC para após as eleições é o mesmo que não apurar. Ninguém vai instalar essa CPI no final do ano”, resumiu a senadora Simone Tebet (MS), pré-candidata do MDB à Presidência e uma das signatárias do pedido de investigação. “A eleição não é desculpa. Todos nós recebemos os salários, todos nós temos que ficar de olho 24 horas por dia, especialmente quando estamos falando de denúncias gravíssimas, com indícios maiores ainda, contra autoridades públicas.”
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