BRASÍLIA - Principal pauta do governo federal no Congresso Nacional neste começo de mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a reforma tributária mudará significativamente o regime fiscal nacional e também teve grandes efeitos políticos.
Por 382 votos a favor e 118 contrários no primeiro turno e 375 votos a favor e 113 contrários no segundo turno, a proposta de emenda à Constituição (PEC) foi aprovada na madrugada desta sexta-feira, e passará por análise de destaques antes de ir ao Senado.
Veja quem ganha e quem perde politicamente com a aprovação da reforma:
Quem ganha
Tarcísio de Freitas
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) assumiu o ônus de fraturar o grupo de apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro ao apoiar a reforma tributária, mas aparece como um dos protagonistas na aprovação e desponta como um dos principais líderes políticos do País.
Tarcísio se articulou com a base do seu partido para fechar questão favorável à reforma tributária e com deputados do PL, de Bolsonaro para mudar a ideia dos parlamentares do partido sobre o tema. “O governador Tarcísio foi muito correto com o tratamento da PEC e é um amigo que precisa ser preservado”, disse Arthur Lira (PP-AL), em um telefonema ao ex-presidente na noite da quinta-feira.
Antes da votação, Tarcísio se encontrou com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e disse “concordar com 95%” do texto da reforma. Bolsonaro afirmou ter ficado “chateado” com o posicionamento do seu ex-ministro da Infraestrutura e também foi criticado pelo deputado Ricardo Salles (PL-SP), ex-companheiro de Esplanada. “Se tem um lugar no Brasil que não tem um governo de direita, é o governo de São Paulo”, disse o ex-ministro do Meio Ambiente.
“Não sou 95%, sou 100% contra a reforma tributária do PT”, ironizou o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP).
Arthur Lira
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), dedicou todos os principais esforços da Casa para a aprovação da reforma. Primeiro, dedicou esta semana inteira para votar pautas da agenda econômica; segundo, adotou uma interpretação do regimento que permite que PECs possam ser votadas já que não é um projeto de lei — neste momento os PLs estão travados até que a proposta do Conselho Administrativo sobre Recursos Fiscais (Carf), matéria ainda controversa na casa, seja votada.
Em terceiro lugar, a articulação de Lira com governadores, prefeitos e deputados garantiu a aprovação da reforma tributária com folga. Durante a votação, ele adotou uma postura inusual e discursou de pé no plenário da Câmara, o que mostrou o protagonismo dele na discussão. “(Lira) Foi uma grande liderança, teve um papel fundamental. Está todo mundo de parabéns”, elogiou Haddad.
Agora, Lira poderá cobrar a conta deste esforço. O Centrão articula para assumir o controle de ministérios, conquistar mais cargos em estatais e autarquias e garantir o repasse de emendas. A primeira pasta na mira é o Turismo, que deverá demitir Daniela Carneiro para dar espaço a um nome do União Brasil. Celso Sabino (PA) é o nome mais provável. O grupo ainda almeja os vastos orçamentos da Saúde e do Desenvolvimento Social, mas enfrentam a resistência de Lula.
O governo liberou emendas polpudas para garantir a aprovação: foram R$ 2,1 bilhões empenhados apenas nesta primeira semana de julho e R$ 5,3 bilhões em emendas Pix apenas nesta quarta-feira, 5. Esse tipo de recurso é indicado por deputados e senadores e enviado por Estados e municípios sem transparência e fiscalização.
Fernando Haddad
Fora dos holofotes, Haddad aproveitou os bastidores para negociar a aprovação da reforma tributária. A articulação de Haddad rendeu elogios de Lula. “(Haddad) vem tendo muita paciência, conversando com as pessoas, fazendo as negociações que têm que ser feitas”, afirmou o presidente. Haddad vai ser uma extraordinária surpresa neste País na área econômica.”
Lula ainda disse que não precisou entrar no “corpo a corpo” para a aprovação da matéria no Congresso por causa do trabalho do ministro da Fazenda. “O Haddad está jogando bem. Se ele fosse jogador de futebol e tivesse convocação da seleção agora, certamente ele seria convocado para a seleção”, elogiou Lula.
Em um dos momentos mais relevantes na negociação da reforma, Haddad apareceu ao lado de Tarcísio, seu rival na disputa ao governo de São Paulo, para mostrar o apoio de ambos à pauta. O episódio provocou furor nos bolsonaristas.
Lula
Ao longo do primeiro semestre um tema era praticamente unanimidade entre os petistas como prioridade para o governo: a aprovação da reforma tributária. E assim acabou por acontecer. O próprio presidente reconhece que o texto “não é o ideal”, mas é o fruto da correlação de forças entre Executivo e Legislativo.
Como resultado dessa correlação, Lula aprovou uma reforma que, após 35 anos de tentativas infrutíferas, finalmente foi aprovada. E no seu governo, que recebia críticas de todos os lados sobre a incapacidade de articulação com o Congresso Nacional.
Quem perde
Jair Bolsonaro
Durante uma reunião dos deputados do PL antes da votação da reforma tributária, Bolsonaro interrompeu Tarcísio, que defendia a postura favorável à reforma, para falar que o partido poderia derrubar a proposta. “Pessoal, se o PL estiver unido, não aprova nada”, disse o ex-presidente. Resultado: um em cada cinco deputados do PL votou a favor da reforma mesmo assim, e, mesmo se não houvesse dissidências na bancada, a PEC passaria mesmo assim.
Bolsonaro tenta se manter como força política mesmo após se tornar inelegível por oito anos após decisão do TSE, ter uma bancada heterogênea que ainda vota em pautas do governo, e corre o risco de ser ofuscado por Tarcísio de Freitas, um dos vitoriosos por capitanear o apoio à reforma.
Assim como fez com sua esposa, Michelle, Bolsonaro disse que Tarcísio ainda “não é experiente” para participar de uma eleição presidencial em 2026, mas é o governador de São Paulo e o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, que deverão herdar o voto bolsonarista no próximo pleito ao Executivo federal.
Bolsonarismo
O bolsonarismo foi a grande força contra a reforma tributária na Câmara. Mesmo sendo o partido com o maior número de deputados – 99 – e estando dissolvido em parlamentares de outras legendas, a força do grupo não gerou nenhum risco na aprovação da reforma tributária. No primeiro turno, foram 382 votos a favor e 118 contrários; no segundo turno, 375 votos a favor e 113 contrários. Era preciso o mínimo de 308.
No discurso Lira lembrou que apoiou Bolsonaro nas eleições, mas lembrou que o povo brasileiro está cansado do radicalismo. “Não nos deixemos, também, levar pelo radicalismo político. O povo brasileiro já está cansado disso”, disse. “As eleições já ocorreram, os vitoriosos estão no poder. Lembro a vocês que meu candidato perdeu a eleição presidencial. Deixemos as urnas de lado. Voltemos nossos olhos para o povo brasileiro.”
Menções na rede
Levantamento da Quaest aponta que foi Haddad quem mais recebeu menções positivas nas redes sociais proporcionalmente, com 78%. Seguem ele Lira, com 63% e Lula, com 58%.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, dividiu sentimentos e ficou com 49% de citações positivas ante 51% de citações negativas. O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sai como grande derrotado, com 71% de menções negativas.
Foram analisadas 5,3 milhões de menções sobre a reforma tributárias no Twitter, no Facebook e no Instagram.
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