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O que diz PEC que limita poderes dos ministros do STF? Entenda

Em meio a tensão entre STF e Congresso, Senado discute PEC que altera decisões feitas pela Corte, veja o que mudaria

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Foto do author Gabriel de Sousa
Atualização:

BRASÍLIA – O Senado Federal discute nesta quinta-feira, 19, proposta de emenda à constituição (PEC) que pretende impor barreiras às decisões monocráticas e os pedidos de vista feitos por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Apresentada em 2021 por um grupo de senadores encabeçado por Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), a PEC deve ser votada em breve no Congresso Nacional em meio a tensão entre o Legislativo e a Corte.

Senado deve votar em novembro PEC que modifica prazos para vista e decisões monocráticas feitas pelo STF Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF

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No último dia 4 de outubro, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou o projeto em apenas 40 segundos. O texto está pronto para ser discutido pelo plenário, e segundo Oriovisto, deve ser votada em novembro. Nesta quinta-feira, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG, defendeu a necessidade de ajustes nas regras de atuação do STF. “Sabemos também que os Três Poderes do Brasil são independentes e harmônicos. E podem sempre evoluir, seja por iniciativa própria, seja com a contribuição de um outro Poder”, afirmou Pacheco.

Neste ano de 2023, o Supremo tomou decisões que provocaram irritação em parte do Legislativo ao iniciar julgamento sobre a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal, tornar inconstitucional o marco temporal das terras indígenas e começar a votação sobre a legalização do aborto até 12 semanas de gestação. O Congresso defende que esses temas devem ser decididos pelos seus parlamentares.

Decisões monocráticas

A PEC estabelece que as decisões monocráticas do STF (feitas por um único ministro) que suspendem leis, atos do presidente da República e dos presidentes da Câmara e do Senado deixem de ser válidas. O texto impõe que essas ações devem ter votadas por pelo menos seis dos 11 ministros.

Foi o que ocorreu, por exemplo, no caso do piso da enfermagem. O relator do julgamento no STF era o presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, que atendeu a um pedido da Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde) e suspendeu liminarmente a lei do piso salarial da categoria.

Caso a PEC entre em vigor, isso só seria possível com o voto da maioria dos magistrados. Na prática, como todos os ministros teriam que avaliar uma questão antes decidida monocraticamente, demoraria mais tempo para um tema urgente ser deliberado.

Se a proposta for aprovada, o direito de tomar decisão monocrática será apenas dlo presidente do STF, que atualmente é Luís Roberto Barroso. Porém, o texto impõe que isso poderá ser feito apenas em “caso de grave urgência ou perigo de dano irreparável”. A Corte precisará decidir sobre a ação do presidente em até 30 dias e, caso isso não seja feito, ela perderá a sua eficácia.

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Em uma alteração feita no Regimento Interno do STF em dezembro de 2022, a Corte definiu que as decisões liminares dos ministros precisam ser confirmadas pelos demais ministros da Corte em plenário virtual.

Pedidos de vista

Sobre os pedidos de vista feitos pelos ministros, que ocorrem quando um magistrado suspende uma votação para apreciar os autos dos processos, a PEC sugere que eles devem ser feitos sempre de forma coletiva e tenham um prazo máximo de seis meses para retorno ao plenário.

Ou seja, se um ministro solicitar tempo extra para analisar um processo em julgamento, todos os ministros terão direito à vista. No final do ano passado, os pedidos passaram a ter o prazo máximo de três meses, metade do que o desejado pela PEC. Passado esse tempo, o processo volta automaticamente ao plenário da Corte.

“Formulado pedido de vista, esta deve ser concedida coletivamente a todos os membros do colegiado, pelo prazo estabelecido na lei processual, não superior a seis meses, assegurada uma única nova concessão de vista pelo prazo de até três meses no curso dos julgamentos em que houver divergência entre os votos já proferidos”, estabelece a PEC.

A PEC pode ir para frente?

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Juristas ouvidos pelo Estadão divergem sobre a possibilidade da PEC ir para frente caso seja aprovada. O advogado e ex-ministro da Justiça, Miguel Reale Junior vê que uma eventual aprovação da PEC provocaria uma “insegurança jurídica”. Para ele, a norma “já nasce vitimada por inconstitucionalidade”.

“Risco para a separação dos Poderes existe é com essa proposta, porque obriga a um exame urgente e de toda a colegialidade de atos que podem, às vezes, ser extremamente graves”, disse Reale Junior.

Caso o projeto seja aprovado pelo Congresso Nacional, o Supremo poderá julgar a sua constitucionalidade, desde que seja provocado por alguma entidade. O artigo 60 da Constituição estabelece temas que não podem ser objeto de emenda, as chamadas “cláusulas pétreas”: a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação entre os Três Poderes; e os direitos e garantias individuais.

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Wálter Maierovitch, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), afirma que a PEC “busca adentrar o regimento interno do STF”. “É uma questão que diz respeito ao próprio governo do Poder Judiciário”, afirmou. “É uma emenda inconstitucional dentro da Constituição. Não é incomum normas inconstitucionais atacarem princípios pétreos. Nesse caso, é a independência e a separação dos Poderes”, completou.

Já o advogado e professor Ives Gandra Martins diverge dos colegas e afirma que a proposta não extrapola esses limites. “Há um poder constituinte originário, que criou o STF em 1988, e há um poder constituinte derivado, dado ao Congresso Nacional. O que o Congresso não pode fazer a nível de PEC é o que está no parágrafo 4º do art. 60. São as únicas hipóteses em que a Constituição não permite mudança”, disse. Para ele, tecnicamente não há inconstitucionalidade, porque “um regimento interno não pode prevalecer sobre uma emenda constitucional”.

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