PF aceita delação premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro

Decisão ainda precisa ser discutida com o Ministério Público e homologada pelo Supremo Tribunal Federal

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Foto do author Gabriel de Sousa
Atualização:

BRASÍLIA - A Polícia Federal (PF) aceitou fechar um acordo de delação premiada com o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A decisão porém deve ser discutida pelo Ministério Público Federal (MPF) e homologada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). As informações são de Andreia Sadi, da Globo News.

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Segundo o portal de notícias, o ex-ajudante de ordens foi “de livre e espontânea vontade” com o seu advogado, Cezar Bitencourt, para o STF no final da tarde desta quarta-feira (6) a fim de confirmar que fará a delação premiada. O encontro foi com um juiz do gabinete do ministro Alexandre de Moraes.

Uma delação de Mauro Cid pode complicar ainda mais a situação do ex-presidente Jair Bolsonaro. Ainda não se sabe quais casos devem ser priorizados. Para ter sua colaboração aprovada pela Justiça, o coronel tem que não só prestar depoimentos, mas também apresentar provas.

Cid esteve ao lado de Bolsonaro em entrevistas, lives e reuniões, e foi o braço-direito do então presidente da República nos quatro anos do governo passado. O oficial do Exército participou diretamente do caso das joias desde os primeiros passos, como revelado pelo Estadão. No final do governo, Cid despachou um auxiliar para tentar resgatar um kit de joias que a casal Jair e Michelle Bolsonaro receberam do governo da Arábia Saudita. As joias tinham sido retidas pela Receita Federal no aeroporto de Garulhos.

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O ex-ajudante de ordens também participou da operação para venda de outros objetos de valor que Bolsonaro recebeu como presente na qualidade de chefe de Estado. Os itens deveriam ter sido restituídos à União, mas foram despachados para venda nos Estados Unidos.

No caso das joias apropriadas pelo ex-presidente e que foram colocadas a venda, Cid deixou rastros em e-mails, conversas por aplicativos de mensagens e movimentações financeiras que podem acabar comprometendo o seu ex-chefe.

Mauro Cid e PF fecharam acordo para uma delação premiada Foto: WILTON JUNIOR

No dia 28 de agosto, quando o ex-presidente e a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro ficaram em silêncio em um depoimento prestado na PF, Cid falou com os policiais por mais de 10 horas. Além do caso da venda ilegal de joias recebidas por comitivas da Presidência da República, Cid também é investigado por estar envolvido com o escândalo da invasão do sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pelo hacker Walter Delgatti Netto e a falsificação de cartões de vacina da família de Bolsonaro, motivo esse que motivou a sua prisão preventiva em maio deste ano.

O Estadão tenta contato com a defesa do ex-ajudante de ordens, mas ainda não obteve retorno. O espaço segue aberto.

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Advogado de Cid já escreveu artigos contra delação premiada

No dia 17 de agosto, o advogado de Mauro Cid, Cezar Bitencourt disse à revista Veja que o ex-ajudante de ordens iria confessar que vendeu as joias recebidas pelo ex-chefe em agendas oficiais, transferiu o dinheiro para o Brasil e entregou os valores em espécie para Bolsonaro. Ao Estadão, Bitencourt recuou e disse que seu cliente buscou resolver “um problema” do chefe, mas negou que ele tenha agido a partir de uma ordem específica do ex-presidente.

Terceiro criminalista a assumir a defesa de Cid, Bitencourt já deu declarações públicas e escreveu artigos contra o instrumento da delação premiada. Em um texto publicado em 2017 no portal Consultor Jurídico, intitulado Delação premiada é favor legal, mas antiético, o advogado chamou as colaborações de “figura esdrúxula”. “Não se pode admitir, eticamente, sem qualquer questionamento, a premiação de um delinquente que, para obter determinada vantagem, ‘dedure’ seu parceiro”, escreveu.

Cid teria auxiliado vendas de joias e entregue dinheiro a Bolsonaro

Segundo as investigações da PF, Cid e outros aliados de Bolsonaro teriam vendido joias e outros objetos de valor recebidos em viagens oficiais da Presidência da República fora do País. Os itens de luxo deveriam ser incorporadas ao acervo da União, mas foram omitidos do conhecimento dos órgãos públicos, negociados para fins de enriquecimento ilícito e entregues em dinheiro vivo para o ex-chefe do Executivo, conforme a PF.

O tenente-coronel teria vendido, também com o auxílio do pai dele, o general Mauro Lourena Cid, joias no exterior. De acordo com a PF, uma das peças comercializadas pelo ex-ajudante de ordens foi um relógio da marca Rolex, estimado em R$ 300 mil e recebido por Bolsonaro em uma viagem presidencial à Arábia Saudita em 2019.

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Com a determinação do Tribunal de Contas da União (TCU) para a devolução de outro conjunto de joias, foi feita uma operação de resgate das peças por parte dos aliados do ex-presidente. Em conversa com Marcelo Câmara, assessor especial da Presidência, obtida pela PF, os dois falaram sobre um conjunto de joias que teriam supostamente sumido com Michelle, e que não poderiam ser vendidos no esquema. Para Cid, “só dá pena porque estamos falando de US$ 120 mil”.

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Cid sabia que joias não podiam ser vendidas

Em outra troca de mensagens com o advogado Fábio Wajngarten, em março deste ano, Cid demonstra que já sabia que as joias recebidas pelo governo seriam bens de interesse público. Além disso, o tenente-coronel tinha a consciência de que, mesmo se os itens fizessem parte legalmente do acervo pessoal do então presidente — o que não é o caso, por não serem personalíssimos —, a União teria direito de preferência para a aquisição se fossem vendidas.

A revelação aparece em mensagens trocadas entre Cid e o advogado Fábio Wajngarten, que integra a defesa de Bolsonaro no caso das joias e foi seu secretário de Comunicação durante o mandato. Os arquivos do celular de Cid foram obtidos pela coluna de Juliana Dal Piva, no UOL.

De acordo com os investigadores, os montantes obtidos das vendas foram convertidos em dinheiro em espécie e ingressaram no patrimônio pessoal do ex-presidente, por meio de laranjas e sem utilizar o sistema bancário formal, com o objetivo de ocultar origem, localização e propriedade dos valores. Em outro áudio entre Cid e Câmara, em janeiro deste ano, o ex-ajudante de ordens citou US$ 25 mil que estavam com o pai dele e seriam destinados a Bolsonaro.

“Tem US$ 25 mil com meu pai. Eu estava vendo o que era melhor fazer com esse dinheiro, levar em ‘cash’ aí. Meu pai estava querendo inclusive ir aí falar com o presidente. (...) E aí ele poderia levar. Entregaria em mãos. Mas também pode depositar na conta (...). Eu acho que quanto menos movimentação em conta, melhor, né?”, afirmou Mauro Cid.

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