ESPECIAL PARA O ESTADÃO - Integrantes do União Brasil têm sido pivôs de diferentes focos de desgaste ao governo Lula. Desde as negociações para conquistar espaço na Esplanada dos Ministérios – convertidas em três pastas, Turismo, Comunicações e Integração – a sigla ainda não provou que vai de fato votar com a base governista no Congresso.
Dentre os desgastes, está o fato de a ministra do Turismo, Daniela Carneiro, ter recebido apoio de milicianos no Rio de Janeiro para a sua candidatura como deputada nas eleições de 2022. Com sua permanência no governo em risco, a ministra afirmou que “está à disposição” do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A ministra teve uma reunião com Lula no Palácio do Planalto na manhã desta terça-feira, 13, depois que se intensificou a cobrança do União Brasil para que ela seja demitida do cargo e que no seu lugar seja nomeado o deputado Celso Sabino (União Brasil-PA).
A troca no Ministério do Turismo foi prometida a deputados do União Brasil com a expectativa de que o partido entregue mais votos favoráveis ao governo na Câmara. Depois da reunião com Lula, que durou 1h30, o governo informou que Daniela segue no cargo. No entanto, parlamentares do União Brasil esperam que um novo ministro seja nomeado nos próximos dias.
O presidente se reúne com todos os chefes das pastas nesta quinta-feira, 15. A reunião pode ser a última com a participação da ministra do Turismo.
Deputados do União Brasil fizeram um abaixo-assinado em apoio à indicação de Sabino para o Ministério do Turismo. O movimento ocorreu após uma ofensiva do prefeito de Belfort Roxo (RJ), Waguinho (Republicanos), marido de Daniela, para tentar manter a ministra no comando da pasta.
Em entrevista ao Estadão/Broadcast, Waguinho havia dito que seria uma “covardia” trocar uma ministra evangélica por um deputado “bolsonarista”, em referência a Sabino. Os parlamentares do partido ficaram incomodados com o que classificaram como forma “pejorativa” usada pelo marido de Daniela para se referir ao deputado do União Brasil.
Além de Daniela, outros cinco deputados da bancada do União Brasil no Rio de Janeiro pediram para deixar a sigla à Justiça Eleitoral. Os parlamentares entraram com um pedido de desfiliação partidária, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Os políticos acusam o presidente do partido, Luciano Bivar, de assédio político por parte da direção nacional. Conforme mostrou o Estadão, a crise com a cúpula do partido se estendeu sob a acusação de que ele age como se dirigisse um “partido de cartório”. Deputados afirmam que Bivar negociou cargos nas administrações do governador do Rio, Cláudio Castro (PL), e do prefeito da capital, Eduardo Paes (PSD).
Além disso, especialistas ouvidos pelo Estadão avaliam que o histórico de formação da sigla já mostra as dificuldades enfrentadas pelo governo. Nascido de uma junção do Democratas e PSL, o União Brasil surge com a bagagem de ausência ao diálogo com o PT. “É claro que, quando o partido busca negociar entrada no governo de esquerda, isso suscita dificuldade interna de negociação”, diz Eduardo Grin, cientista político da FGV.
“Para conseguir construir com partido político, aquele parlamentar que está no Congresso precisa ver alguma vantagem em ter um membro do seu partido ocupando uma pasta ministerial, e isso é difícil de se enxergar quando o partido não tem coesão e, sobretudo, divisões internas no partido”, disse Graziella Testa, cientista política e professora da Escola de Políticas Públicas da mesma instituição.
Perda de governabilidade
Os dois avaliam que há preocupação por parte do governo Lula em manter governabilidade e, consequentemente, apoio no Congresso. “O fato de Lula manter esses parlamentares, a despeito das denúncias e dos problemas que isso pode lhe causar do ponto de vista de apoio político da população, denota uma preocupação de Lula com a governabilidade”, avaliou Graziella.
“Se ele mantém essas pessoas sob as quais não tem uma relação mais profunda, é porque quer demonstrar para a base que está disposto a construir essa coalizão com partidos políticos”, disse. Segundo Testa, por outro lado, existe um limite em até quando se pode sustentar este cenário. “E o quanto vai haver de retorno em forma de votos do União Brasil para que seja razoável a manutenção desses cargos ministeriais neste momento.”
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Grin explica que, hoje, o Poder Legislativo aumentou seu poder de barganha no Congresso Nacional, e que os presidente não possuem a mesma força de negociação que detinham em mandatos anteriores, inclusive o próprio Lula. “Isso faz com que partidos políticos, sabendo que o presidente precisa do Congresso, barganhe de forma mais intensa para obter concessões e privilégios”, pontuou.
“O que está acontecendo com o União Brasil envolve se o Lula vai conseguir, em um ambiente de polarização política, construir uma coalizão de governo com a estabilidade que lhe dê garantia de voto para aprovar o que ele precisa”, esclareceu. Grin avalia que a perda do União Brasil neste momento para o governo seria trágica e culminaria na dificuldade de aprovar projetos. “Perder o União Brasil deixaria o governo em minoria no parlamento, o que seria trágico.”
Debandada
Além do comando da pasta de Turismo, o União Brasil possui outros dois ministérios no governo Lula, comandados por Juscelino Filho, nas Comunicações e Waldez Góes,ç na Integração. Além de Daniela, também pediram desfiliação os deputados Chiquinho Brazão, Juninho do Pneu, Marcos Soares, Ricardo Abrão e Dani Cunha, todos do Rio de Janeiro.
A ministra e o marido dela, Waguinho, apoiaram Lula na campanha eleitoral do ano passado. O prefeito de Belfort Roxo comandava o diretório do União Brasil no Rio, mas se desfiliou após ser substituído no cargo. Ao sair, acusou Luciano Bivar de “intervenção”.
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