Pressão sobre direção da Receita para liberar joias começou já em Cumbica

Logo após auditores do Fisco apreenderem no Aeroporto de Guarulhos presente avaliado em R$ 16,5 milhões, então ministro Bento Albuquerque acionou chefia do órgão em Brasília

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BRASÍLIA - Logo após auditores do fisco apreenderem em outubro de 2021 no aeroporto de Guarulhos as joias presenteadas pelo regime da Arábia Saudita para o casal Bolsonaro, a equipe do ex-ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque acionou a direção da Receita Federal em Brasília para tentar liberar os bens. As joias avaliadas em cerca de R$ 16,5 milhões estavam na bagagem de um auxiliar do ex-ministro e não foram declaradas no momento do desembarque internacional em São Paulo, como revelou o Estadão.

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Bento Albuquerque ainda estava no aeroporto quando a chefia da Receita, que era comandada pelo então secretário José Tostes, foi acionada pela equipe do então ministro sob alegação de que havia um problema na alfândega que poderia atrasar a conexão do voo de Bento. Naquele momento, Sandro Serpa, que era subsecretário de Tributação da Receita, recebeu um telefonema do chefe de gabinete do ex-ministro, o contra- almirante José Roberto Bueno Junior.

A ligação é um novo elemento para mostrar que integrantes do governo Bolsonaro tentaram pressionar o Fisco a liberar os diamantes destinados à primeira dama Michelle Bolsonaro e seu marido.

Equipe do ex-ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque acionou a direção da Receita Federal em Brasília para tentar liberar joias logo após a apreensão em Guarulhos. Foto: Carla Carniel/Reuters

Ao Estadão, Serpa disse que na ligação telefônica Bueno relatou que havia um “problema em Guarulhos” envolvendo as bagagens da comitiva do ministro e se referiu a um “presente” que poderia atrasar a conexão do seu próximo voo, que seguiria até Brasília.

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O chefe de gabinete do ex-ministro alegou que, naquele momento, não havia auditores para atendimento na alfândega, o que Serpa disse ter estranhado, já que os servidores da Receita trabalham sem parar em turnos de 24 horas, em todos os dias da semana.

No dia da apreensão em Garulhos, subsecretário de Tributação da Receita disse que, após receber a ligação do auxiliar do ministro Bento, entrou em contato com o então superintendente da Receita na 8 ª Região Fiscal de São Paulo, José Roberto Mazarin. “Eu fiquei preocupado com a informação de que o ministro iria perder o voo por conta de um suposto não atendimento da Receita. Esse foi o principal motivo de eu ligar para o superintendente”, disse.

De acordo com relato de Serpa, Mazarin retornou mais tarde informando que tinha havido a apreensão de um conjunto de joias inicialmente avaliado em US$ 265 mil. Naquele momento, o subsecretário recebeu, inclusive, a foto das joias enviada pelo superintendente da Receita em São Paulo.

O ex-subsecretário do Fisco relata que se surpreendeu com o que viu na foto e percebeu que a Receita tinha feito o seu trabalho. Segundo ele, no dia seguinte, comunicou ao então secretário especial da Receita, José Tostes, do ocorrido. A resposta de Tostes foi a de que já “estava sabendo” do que tinha acontecido. Tostes perdeu o cargo 37 dias após a apreensão.

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Serpa informou que não tratou mais do assunto, porque o tema não era da sua área de atuação na Receita, mas do setor aduaneiro. Ele atribui o fato de ter sido o primeiro a ser procurado porque conhecia Bento Albuquerque e José Roberto Bueno quando os três trabalharam no mesmo período na embaixada Brasileira em Washington.

Como revelou o Estadão, Bento Albuquerque e seu assessor, Marcos André dos Santos Soeiro, desembarcaram em Guarulhos no dia 26 de outubro de 2021 no voo 773. Na chegada, Soeiro foi selecionado para vistoria da bagagem, quando foi detectado pelos fiscais um conjunto de joias avaliado em 3 milhões de euros (R$ 16,5 milhões). Bento passou sem ser revistado. Os dois informaram ao Fisco que não tinham nada a declarar na bagagem. Foi quando Soeiro teve a bagagem fiscalizada e as joias foram descobertas.

O governo Bolsonaro acionou pelo menos três ministérios para tentar liberar as joias no final de seu governo. O braço direito do presidente Jair Bolsonaro, o coronel Mauro Cid agiu para tentar retirar do cofre da Receita em Guarulhos a caixa que continha um colar, brincos e anel de diamantes da loja de luxo Chopard. A operação acabou sendo barrada por servidores do fisco que não aceitaram entregar os bens que deveriam ter sido declarados como patrimônio da União.

A defesa do presidente alega que as joias fazem parte da cota de presentes que o chefe do Executivo recebe durante o mandato e podem ser levados para casa como objetos pessoais. Decisão de 2016 do Tribunal de Contas da União indica o contrário do que alega Bolsonaro. Presentes de alvo valor, como joias, fazem parte do acervo da União. Ficam sob a guarda do governo após o fim do mandato do presidente e não podem ser considerados um patrimônio pessoal.

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