Análise | Projeto de emendas não impõe transparência exigida pelo STF e garante R$ 50,5 bilhões em 2025

Supremo Tribunal Federal vai decidir entre cobrar as determinações que fez e destravar o pagamento dos recursos em nome do acordo entre os Poderes; leia análise

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Foto do author Daniel  Weterman
Atualização:

BRASÍLIA – O projeto das emendas parlamentares aprovado pela Câmara na terça-feira, 5, não cumpre os requisitos de transparência exigidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e garante R$ 50,5 bilhões em recursos nas mãos dos parlamentares no Orçamento de 2025, deixando para o governo Lula e para a cúpula do Congresso o poder de barganhar apoio político com dinheiro público.

05/11/2024 - Plenário - Sessão Deliberativa Foto: Mário Agra/Câmara dos Deputados

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Em primeiro lugar, a transparência não foi uma questão decisiva entre as cabeças do governo e do Legislativo. O ponto determinante foi a definição do valor e de quem comanda o dinheiro. O apoio à candidatura do deputado federal Hugo Motta (Republicanos-PB) para a presidência da Câmara destravou a votação da proposta.

O projeto garante crescimento real de 2,5% ao ano, acima da inflação, para as emendas parlamentares impositivas (individuais e de bancada), e R$ 11,5 bilhões para as emendas de comissão, herdeiras do orçamento secreto, com correção pela inflação. Fora os gastos obrigatórios e carimbados, nenhuma outra despesa da máquina pública têm essas garantias e estão congeladas atualmente.

Ou seja, as emendas vão consumir cada vez mais espaço de outros gastos. O que se fará para garantir a manutenção das universidades? E dos postos de saúde? E quando o governo quiser dar reajuste para servidores? Se não for da escolha dos congressistas, áreas essenciais ficarão sem dinheiro.

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No caso da emenda Pix, há um avanço aparente, que é exigir do parlamentar e da prefeitura ou do Estado que recebe o recurso dizer o que será feito com o dinheiro, mas a essência mantida neutraliza completamente a mudança e impede a transparência. A verba continua caindo de forma antecipada sem qualquer apresentação e análise de projeto, ignorando uma exigência do STF, driblando o planejamento e a lei eleitoral em ano de eleições.

O texto não exige a prestação de contas da emenda Pix depois que o recurso é gasto, o que também era uma determinação da Corte e do Tribunal de Contas da União (TCU), até agora não cumprida. Continua dispensando a necessidade de convênio, principal mecanismo de transparência e fiscalização e ao mesmo tempo o maior pesadelo dos administradores por conta da burocracia. Além disso, ficou de fora a proibição de o parlamentar mandar dinheiro para outro Estado.

As emendas de comissão, herdeiras do orçamento secreto, esquema revelado pelo Estadão, serão colocadas de vez na legislação orçamentária sem a obrigação de mostrar o nome dos verdadeiros padrinhos e parlamentares que são beneficiados, descumprindo as decisões do STF em mais um ponto.

Para 2025, o governo reservou recurso apenas para as emendas impositivas (individuais e de bancada). Agora, o Congresso garantiu mais R$ 11,5 bilhões para as emendas de comissão e terá que tirar o dinheiro de algum lugar, sacrificando despesas de manutenção da máquina e investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (Novo PAC).

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O valor é menor que o deste ano (R$ 15,5 bilhões), mas permite aos presidentes da Câmara e do Senado controlar a distribuição com os líderes partidários. Como não é impositivo, está mantido o instrumento de barganha do governo. O baixo clero ensaiou uma revolta nos bastidores, mas vai continuar sendo baixo clero. Vale dizer que as regras existentes já exigem transparência para o setor público — falta cumprir.

As comissões deveriam discutir e deliberar sobre o orçamento total de cada área, mas vão se consolidar como o locus de balcão e divisão de um naco de dinheiro público entre parlamentares. Nas emendas de bancada, unidades federativas menores com oito parlamentares, como Amapá e Distrito Federal, continuarão com a possibilidade de dividir os recursos individualmente, pois a exigência de projetos e ações estruturantes é seguida de uma série de exceções que abarcam o que é feito hoje.

O Congresso rejeitou a medida que permitiria ao governo cortar emendas para cumprir o arcabouço fiscal. Por outro lado, o governo conseguiu retirar do texto o calendário de pagamento de recursos indicados por parlamentares. Com cada um recuando no que foi possível, ficou mais fácil. Resta saber se o Supremo Tribunal Federal vai “engolir” o projeto, ignorar as determinações que fez para as emendas parlamentares e destravar o pagamento dos recursos em nome do acordo feito entre os Poderes.

Análise por Daniel Weterman

Repórter do Estadão em Brasília (DF), com experiência em economia, política e investigação. Participou das coberturas que desvendaram o orçamento secreto, a emenda Pix, as irregularidades cometidas pelo ministro das Comunicações, Juscelino Filho, e o descontrole no orçamento do Ministério da Saúde. Vencedor dos prêmios IREE, Ielusc e Estadão.

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