PT foge de polêmica com Forças Armadas e aborta pedido para debater papel de militares

Diretório Nacional do partido desiste de convocar uma conferência para tratar do tema; acadêmicos reivindicam discussão mais ampla com a sociedade civil

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Foto do author Monica  Gugliano

O PT se absteve de mexer no vespeiro da relação com os militares e desistiu de convocar uma conferência para debater o papel das Forças Armadas. A decisão foi tomada após um encontro do Diretório Nacional do partido e publicada em uma resolução na segunda-feira, 10. Houve um voto em separado do professor Valter Pomar.

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Ele faz uma dura crítica à recusa do diretório a incluir na sua resolução uma emenda dizendo o seguinte: “Não se poderá falar em democracia plena no Brasil, enquanto persistir a tutela militar. O Diretório Nacional do PT decide convocar uma conferência nacional para debater a política de Defesa Nacional e o papel das Forças Armadas”.

O documento final aprovado pelo diretório, intitulado Brasil do presente e do futuro: no rumo certo, faz um balanço dos seis primeiros meses do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. De acordo com o texto, o País “começou a retomada da democracia e da normalidade institucional”. O diretório pede que seja aumentada a pressão para a demissão do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, chamado de “teimoso” pelo presidente Lula por manter a taxa básica de juros, a Selic, a 13,75% ao ano.

O presidente Lula durante a cerimônia de apresentação de oficiais-generais recém-promovidos em abril no Palácio do Planalto Foto: Wilton Junior/Estadão - 4/4/23

Ao final da votação, não se falou no debate sobre os militares, abortando a ideia de convocar uma Conferência de Defesa e Forças Armadas, demanda que vem sendo reivindicada por acadêmicos e entidades da sociedade civil organizada.

“Perdemos a oportunidade de “discutir melhor” a questão militar no debate sobre o programa de reconstrução e transformação; perdemos a oportunidade de “discutir melhor” a questão militar no debate sobre o programa da federação”, afirmou Pomar em seu blog, acrescentando: “Perdemos a oportunidade de “discutir melhor” a questão militar no debate sobre o programa da coligação. O mesmo ocorreu no governo de transição. Esta atitude contribuiu para sermos surpreendidos pelo 8 de janeiro”.

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O secretário-geral do partido, o ex-deputado Henrique Fontana, não quis comentar as declarações de Pomar. E o próprio Pomar também disse ao Estadão que tudo que precisava falar estava em seu blog. “Na comissão e no DN, ninguém argumentou que a tutela militar não existe ou não deva ser combatida. O problema parece estar no quando, como e onde debater o assunto. Enquanto isso não se resolve, se depender dos 47 (membros do Diretório Nacional) teremos – como eu escrevi no grupo de zap do DN – luta pelo socialismo e Petrobras, mas com tutela militar.”

Segundo Fontana, o tema não estava previsto e havia outras coisas a tratar. “Não vou comentar isso”, afirmou.

Ministério da Defesa

As conferências, que são instrumentos de participação social, são uma prática nos ministérios da Esplanada há várias décadas. Uma delas, a de Ciência e Tecnologia, em 1985, foi a responsável pela criação do Ministério, então entregue ao peemedebista Renato Archer. Ainda nesta quinta-feira, 13, Lula assinou o decreto para que seja organizada a 5ª Conferência que será realizada no ano que vem. O mesmo tem acontecido em outras pastas que, periodicamente, chamam a sociedade civil e debatem os temas de interesse da população e do País.

O Ministério da Defesa, embora tenha sido criado em 10 de junho de 1999, há 24 anos, nunca convocou nenhuma conferência, e o processo de elaboração dos documentos de defesa continua sendo discutido majoritariamente pelos militares. A política e a estratégia nacional de Defesa começaram a ser atualizadas, de quatro em quatro anos, no Estado Maior Conjunto das Forças Armadas. “De fato, os documentos são atualizados a cada quatro anos, mas pelos próprios militares com uma participação externa muito limitada”, observa a professora de ciência política, doutora, Adriana Marques, uma das estudiosas do tema.

O Ministério da Defesa, em resposta a um questionamento do Estadão, informou por escrito que a Política Nacional de Defesa (PND), a Estratégia Nacional de Defesa (END) e o Livro Branco da Defesa Nacional (LBDN) são os documentos estratégicos de mais alto nível no País sobre Defesa Nacional. “A PND é o documento que se destina a orientar os esforços de toda a sociedade brasileira no sentido de reunir capacidades em nível nacional, a fim de desenvolver as condições para garantir a soberania do País, sua integridade e a consecução dos objetivos nacionais”.

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Segundo a nota, a Estratégia Nacional de Defesa orienta todos os segmentos do Estado brasileiro quanto às medidas a serem implementadas para se atingir os objetivos estabelecidos na Política Nacional de Defesa. “As atualizações da PND e da END são conduzidas pelo Ministério da Defesa e contam com a participação de outras Pastas, da academia, e de cidadãos”.

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Entretanto, de acordo com acadêmicos, pesquisadores e outros integrantes de entidades ligadas ao tema Defesa, essas discussões são feitas sob o olhar das Forças Armadas. Segundo eles, nas outras Conferências, a ampla participação social, permite que sejam debatidos em profundidade temas de interesse da população. “Não existe no Brasil uma discussão sobre nossa política e estratégia de Defesa ou sobre o papel, o tamanho das Forças Armadas que anteceda e organize a revisão dos documentos de Defesa e a sociedade quer ter essa discussão”, afirma Adriana.

Outro item citado pelo ministério da Defesa, o Livro Branco de Defesa Nacional (LDBN), o documento que visa a informar a sociedade a comunidade internacional sobre os dados estratégicos, orçamentários e institucionais detalhados sobre as Forças Armadas é feito pela Assessoria de Planejamento do Ministério que, segundo informou, já começou a atualizar a próxima versão para 2024. “Ele é um documento importante, mas não substitui uma Conferência Nacional. Ele apenas expõe como se organiza o setor de Defesa, e reflete a visão das Forças Armadas”, diz a professora.