Quais são os interesses em jogo no PL 2630 das Fake News? Veja quem é a favor e quem é contra

Requerimento de urgência da proposta foi aprovado ontem; texto deve ir a plenário na próxima terça-feira

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Por Redação
Atualização:

Aprovado o regime de urgência e pronto para votação em plenário na Câmara dos Deputados já na próxima terça-feira, 2, o projeto de lei das Fake News coloca frente a frente interesses de diferentes grupos políticos e setores da sociedade. Enquanto alguns aprovam a ideia de novas diretrizes para as redes sociais sob a justificativa de controlar “conteúdos críticos” e notícias falsas, outros alegam se tratar de censura e do fim da “liberdade individual”.

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Sob a relatoria do deputado Orlando Silva (PC do B), a proposta causa impacto no modelo de negócios tanto das big techs, como são chamadas as empresas que administram as redes sociais, quanto dos veículos jornalísticos e das agências de checagens, que divulgam seus conteúdos também por meio das plataformas.

Com aprovação do regime de urgência por 238 votos a favor e 192 contrários, o PL segue para deliberação em plenário no início da semana que vem, se prevalecer o desejo do governo Lula e do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), terça-feira. Como teve origem no Senado, caso seja alterado, o texto volta para aprovação dos senadores. Diante da série de mudanças propostas na versão do relator na Câmara, Orlando Silva (PC do B-SP), é provável que o PL precise de novo aval do Senado antes de seguir à sanção presidencial e ser convertido de fato em lei.

O deputado federal Orlando Silva (PC do B-SP), relator do PL das Fake News na Câmara. Foto: Divulgação/Câmara.

Confira os interesses dos principais grupos políticos e setores da sociedade impactados pelo projeto:

Governo Lula

A última versão do texto do PL conversa com algumas ideias do governo Lula, adicionadas ao texto. Uma delas é a obrigatoriedade das plataformas cuidarem de “conteúdos críticos”. As empresas, segundo o texto, precisariam atuar preventivamente sobre o que possa estimular ou disseminar crimes de abolição violenta do estado democrático de direito, golpe de Estado, atos de terrorismo e crimes contra crianças e adolescentes.

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O controle dos conteúdos por meio das plataformas casa com uma ideia anteriormente defendida pelo presidente Lula, que é a regulamentação das mídias. No início do governo, o ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), iniciou a construção de um pacote de medidas para regulação das mídias digitais, sob o argumento de combate às fake news. No Palácio do Planalto, foi criada uma estrutura para combater desinformação e discurso de ódio nas redes sociais, a Secretaria de Políticas Digitais.

Outra proposta do PL é o estabelecimento, por meio do Poder Executivo, de uma entidade autônoma de supervisão para regulamentar e fiscalizar os provedores. Segundo o documento, a agência também teria o aval de “instaurar processos administrativos e, comprovado o descumprimento das obrigações desta lei pela plataforma, aplicar as sanções cabíveis”.

O governo e sua base no Congresso são a favor da aprovação do PL conforme o texto apresentado pelo relator.

Oposição bolsonarista

Dando continuidade à ideia defendida pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, os parlamentares e políticos aliados a ele passaram a se referir ao texto como “PL da Censura”, como uma forma de defender que a proposta cercearia a liberdade dos usuários nas redes sociais. “Quem acha q (sic) aprovar o PL da censura 2630 fará com que cessem as críticas ou cegará as tias do zap está enganado. Uma criação espontânea silenciada sempre é sucedida por outra criação espontânea”, afirmou o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) em uma rede social.

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Requerimento de urgência do PL das Fake News está previsto para ser votado nesta quarta-feira, 26. Foto: Dida Sampaio/Estadão

Outro ponto do PL que pode impactar a mobilização bolsonarista nas redes sociais é a limitação dos aplicativos de mensagens de distribuição massiva de conteúdos e mídias, estratégia muitas vezes usadas em grupos para divulgação de narrativas.

O texto prevê que a divulgação e promoção de desinformação seja punida com até três anos de prisão, o que também acende um alerta na oposição, já que alguns conteúdos do núcleo são frequentemente investigados por agências de checagens e classificados como falsos ou fora de contexto.

A oposição ao governo no Congresso, em especial os aliados do ex-presidente Bolsonaro, são contrários à aprovação do texto e, como mostrou o Estadão, já vinham trabalhando para adiar a votação. Bolsonaristas também conduziram intensa campanha nas redes sociais, não apenas definindo a proposta como “PL da Censura”, mas buscando emplacar a hashtag “Não ao PL 2630″.

Imprensa

Uma das propostas do PL é que as as plataformas remunerem as empresas jornalísticas pelos conteúdos noticiosos usados pelos provedores, fato inédito no País. Nesse cenário, na última terça-feira, 18, uma coalizão formada por onze entidades que representam o setor de comunicação do País e organizações jornalísticas saíram em defesa do PL das Fake News. Na avaliação das associações, a proposta é uma forma de valorização do jornalismo “como antídoto aos efeitos dramáticos da desinformação e do discurso de ódio na internet”.

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O manifesto é assinado pelas seguintes entidades: Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner), Associação Nacional de Jornais (ANJ), Associação De Jornalismo Digital (Ajor), Associação Brasileira de Mídia Digital (ABMD), Associação da Imprensa de Pernambuco (Aip), Associação Paulista de Jornais (APJ), Associação Riograndense de Imprensa (Ari), Confederação Nacional da Comunicação Social (CNCOM), Federação Nacional das Empresas de Jornais e Revistas (Fenajore) e Federação Nacional das Empresas de Rádio e Televisão (Fenaert).

A Coalizão do Setor de Comunicação para os Desafios do PL das Fake News também se manifestou a favor do projeto. Assinaram o documento: Associação Brasileira de Agências de Publicidade (ABAP), Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (ABERT), Associação Baiana do Mercado Publicitário (ABMP), Associação Brasileira das Agências de Comunicação (Abracom), Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abratel), Associação dos Jornais do Interior de Santa Catarina (ADJORI-SC), Associação dos Jornais do Interior de Sergipe (ADJORI-SE), Associação Nacional do Mercado e Indústria Digital (AnaMid), Associação Nacional de Editores de Revistas (ANER), Associação Nacional de Jornais (ANJ), Associação dos Profissionais de Propaganda (APP), Clube Associativo dos Profissionais de Marketing Político (CAMP), Central de Outdoor, Confederação Nacional da Comunicação Social (CNCOM), Federação Nacional das Agências de Propaganda (Fenapro) e Grupo de Atendimento & Negócios (GAN).

A remuneração da atividade jornalística pelas plataformas é considerada item fundamental do texto, na avaliação dessas entidades: “Pode ser um elemento decisivo para a formação de um ecossistema jornalístico amplo, diverso e saudável, capaz de se opor à difusão da desinformação e dos discursos de ódio. Tal ecossistema é essencial para a manutenção da própria democracia”, comentaram as entidades. Os critérios, a forma para aferição dos valores, a negociação, a resolução de conflitos, a transparência e a valorização do jornalismo profissional nacional, regional, local e independente ainda precisariam ser regulamentados.

Em nota, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) saiu em defesa do projeto e disse ser “imprescindível que o Brasil combata com vigor a disseminação de notícias falsas e a propagação da desinformação nas redes sociais, que desqualificam a razão de ser do jornalismo e contaminam o debate democrático”. A entidade também defendeu a remuneração pelo conteúdo jornalístico reproduzido nas ferramentas de buscas e redes sociais.

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“A ABI também entende que as plataformas digitais devem remunerar o conteúdo jornalístico que republicam de terceiros. Inicialmente, a exemplo de outras entidades de jornalistas e da sociedade civil, defendia que esta remuneração não fosse incluída no PL 2630 tendo em vista sua especificidade, mas objeto de uma legislação a parte. Tendo em vista a posição que acabou prevalecendo no texto do relator Orlando Silva, a ABI, em conjunto com a Federação Nacional dos Jornalistas – Fenaj, apresentou uma emenda para que a remuneração do conteúdo jornalístico pelas plataformas seja devida tanto a empresas jornalísticas como a seus profissionais jornalistas ou a jornalistas profissionais independentes responsáveis pela produção do referido conteúdo”, diz a nota.

Diversas entidades representativas de empresas jornalísticas, a exemplo das citadas acima, são a favor da aprovação.

Fact checkers

A visão de diferentes grupos de checadores de informações ressalta que não há confirmações de que uma regulamentação seja capaz de reduzir a desinformação. A ausência de critério de definição no PL sobre o que seria o “jornalismo profissional”, apto a receber remuneração das plataformas, é outro ponto levantado pelo grupo, já que as agências são também uma forma de produção jornalística.

Em 2020, mais de 50 entidades nacionais e internacionais assinaram uma nota em que afirmavam que “sem tempo hábil para debate e amadurecimento, o texto pode resultar numa lei que instaure um novo marco regulatório de Internet baseado na identificação massiva e na vigilância e inviabilize o uso das redes sociais e de aplicativos de comunicação.” Redes sociais também aderiram ao documento na época. Vale ressaltar que o texto do PL, há 2 anos, era outro comparado com o documento de hoje, que sofreu diversas alterações.

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Integrantes do setor não fecharam posição a respeito do projeto, mas houve diversas manifestações contra o PL.

Big techs

No dia 19 de abril, um dia após a divulgação do documento da coalizão dos setores tradicionais de comunicação, três associações que representam o setor de tecnologia, como Meta, Twitter, Google e TikTok, divulgaram uma carta aberta defendendo a instalação de uma comissão especial, o que adiaria a votação.

As empresas do setor afirmaram que “esforços de regulação de tecnologia são bem-vindos” e alegaram querer “ser parte da construção de uma legislação que responda de maneira eficiente e equilibrada a desafios públicos”. Segundo tais entidades, embora o PL tramite no Congresso há três anos, “ele é fruto de um processo tortuoso e fechado”.

Além de estabelecer regras, diretrizes e mecanismos de transparência para redes sociais, o texto propõe algumas normas de atuação e de conduta para as plataformas como “atuar preventivamente” em relação a “conteúdos potencialmente ilegais” e um processo de informação instantânea às autoridades em casos de suspeitas de crimes.

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O Google também divulgou manifesto público no qual diz que o projeto pode ser votado em regime de urgência “sem que a sociedade tenha tempo necessário para debater o tema com profundidade”. “Uma legislação apressada pode piorar o funcionamento da internet, cercear direitos fundamentais, favorecer determinados grupos ou setores da economia e criar mecanismos que coloquem em risco discursos legítimos e a liberdade de expressão”, disse Marcelo Lacerda, diretor de Relações Governamentais e Políticas Públicas do Google Brasil. Foi ele quem assinou a carta aberta.

Outro ponto acende alerta para as big techs: as punições. Caso descumpram a lei, as plataformas podem sofrer até sete tipos de sanção, como advertência, multa, suspensão ou proibição de exercícios das atividades no País. Além disso, há também previsão de multa entre R$ 50 mil e R$ 1 milhão, por hora, para empresas que não cumprirem decisões judiciais para “remoção imediata de conteúdo ilícito”.

As chamadas big techs fizeram companha contrária ao PL, buscando inclusive adiar a votação por meio da criação de uma comissão especial para analisar o texto.

Entidades diversas da sociedade civil

O universo de organizações não governamentais e entidades da sociedade civil que opinaram sobre o projeto é grande e muito diverso; assim, é difícil indicar um posicionamento único. Na manifestação mais recente, a Sala de Articulação contra a Desinformação (SAD), que reúne 100 entidades como Instituto Igarapé, Fundação Tide Setúbal e outras, defendeu a criação de um dos principais pontos do projeto: “É absolutamente necessária a criação de um órgão regulador independente e autônomo” e definiu uma série de prioridades que o País precisa tomar para avançar no debate.

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