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Qualificada, seguro, frustrante, folclórico, arrogante, instável: o debate de SP na visão do eleitor

Pesquisa qualitativa realizada durante evento promovido pelo Estadão, Terra e Faap mostra que eleitores estão interessados no debate de problemas reais da cidade e querem fugir de bate-boca e baixarias

Foto do author Adriana Victorino
Foto do author Bianca Gomes
Atualização:

Uma candidata qualificada, que disputa a eleição com um concorrente seguro, seguidos por um nome conhecido de todos, mas que gerou frustração entre os eleitores, um personagem folclórico, uma mulher arrogante e um postulante a prefeito instável. Esse foi o cenário traçado por 15 eleitores que participaram na quarta-feira, 14, de uma pesquisa qualitativa realizada durante o debate promovido pelo Estadão, Terra e FAAP entre os principais candidatos à Prefeitura de São Paulo.

Candidatos Guilherme Boulos e Pablo Marçal durante debate do Estadão na FAAP Foto: Werther Santana/Estadão

Na pesquisa conduzida pelo instituto Travessia, a deputada federal Tabata Amaral (PSB) foi elogiada pelos participantes por sua “firmeza” e “conhecimento” da cidade, o que garantiu a percepção geral de que a candidata conseguiu ter a melhor performance durante o debate, o segundo realizado até agora na corrida eleitoral deste ano.

Tabata consolidou o voto de um eleitor e conquistou outros seis durante o debate, com o maior saldo entre os postulantes. O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), se destacou ao demonstrar conhecimento sobre a cidade e elencar realizações de sua gestão, atraindo eleitores de Pablo Marçal (PRTB), que foi o mais rejeitado por conta da postura agressiva adotada durante o evento. O deputado federal Guilherme Boulos, candidato do PSOL na capital paulista, fracassou na tentativa de conquistar novos eleitores e decepcionou os seus próprios ao se render às provocações do ex-coach.

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O tucano José Luiz Datena (PSDB), estreante em uma disputa eleitoral, conseguiu empolgar o grupo ao abordar pautas de segurança pública e propor uma abordagem humanizada aos usuários de drogas da Cracolândia. Seu desempenho geral, no entanto, deixou a desejar segundo avaliação dos participantes da pesquisa. O apresentador perdeu os dois eleitores que antes do início do debate disseram que pretendiam votar nele. O grupo considerou Datena “atrapalhado” e alguns disseram que sua performance ficou muito aquém do esperado. Marina Helena, do Partido Novo, foi vista como “arrogante” e “despreparada”.

O grupo demonstrou interesse em ouvir propostas para a cidade, mas a maioria se queixou quando a dinâmica se transformou em bate-boca e troca de acusações entre os candidatos. A polarização entre o presidente Lula (PT) e Jair Bolsonaro (PL), seu antecessor, assim como a discussão entre “esquerda e direita” - e outros temas nacionais que não têm relação direta com o município - foram malvistos e interpretados como tentativas de desviar do foco do debate.

“Quem trouxe propostas reais e demonstrou conhecimento sobre a cidade se destacou. Tabata foi a que mais sobressaiu nesse aspecto, seguida de Nunes e Boulos,” avalia o cientista político Renato Dorgan, CEO do Instituto Travessia.

“Tenho dúvidas se a polarização entre Boulos e Marçal, semelhante à que ocorreu entre Lula e Bolsonaro, é válida. Boulos se apagou no embate com Marçal, que foi visto pela maioria dos entrevistados como excessivamente polêmico. Esta eleição para a Prefeitura de São Paulo é diferente da eleição de 2022; a polarização entre os dois não é numérica, é apenas ideológica”, ponderou o cientista político, que acrescentou: “Nunes, Tabata e Datena são opções competitivas para o eleitor frente a essa polarização. Boulos perde mais com isso do que Marçal. Se fosse definir numa palavra a sensação dos entrevistados da pesquisa qualitativa, seria: Nunes seguro, Tabata qualificada, Datena frustrante, Marçal folclórico, Marina fraca e Boulos instável.”

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Como funciona a pesquisa

Reunidos em uma “sala de espelho” — ambiente com espelho unidirecional que permitiu à reportagem observar a dinâmica sem ser vista — os eleitores assistiram ao debate em tempo real e reagiram com comentários, utilizando três cartões para avaliar o desempenho dos candidatos: verde para aprovação, amarelo para neutralidade e vermelho para reprovação.

Os eleitores do grupo são moradores de São Paulo e pertencem às classes C1, B1 e B2. Seguindo a proporção das últimas pesquisas quantitativas, foram selecionados três eleitores que declararam intenção de voto em Nunes na pesquisa estimulada; três em Boulos; dois em Datena; dois em Marçal; um em Tabata; um em Marina Helena; e três indecisos. Após o debate, eles foram questionados novamente sobre em quem votariam se a eleição para a Prefeitura de São Paulo fosse hoje.

Abaixo, confira o desempenho de cada candidato na pesquisa qualitativa.

‘Centrada’, Tabata conquista mais seis eleitores

Tabata Amaral começou o debate com apenas um eleitor declarado e terminou com sete. Ao longo da dinâmica, ela conseguiu atrair intenção de voto de um indeciso e de outros cinco paulistanos que inicialmente iriam optar por candidatos de centro e direita (Datena, Nunes, Marina Helena). A deputada não conseguiu avançar sobre os apoiadores de Boulos.

O grupo simpatizou com várias das propostas apresentadas pela deputada. Quando ela mencionou a meta de alfabetizar 100% das crianças até o terceiro ano do Ensino Fundamental e expandir a rede de ensino integral, oito eleitores, incluindo indecisos e aqueles que inicialmente declararam voto em Datena e Nunes, levantaram a placa verde em sinal de aprovação.

Tabata também conquistou a maioria ao apresentar propostas para combater o racismo, detalhar o programa “Jovem Tech”, que prevê parcerias com empresas e universidades para levar capacitação tecnológica para jovens de baixa renda, e afirmar que, em um eventual governo, o filho do pobre terá as mesmas oportunidades que o filho do rico – essa última declaração recebeu nove cartões verdes.

Eleitora de Nunes e moradora da Vila Bancária, na Zona Leste da capital, R., 37 anos, afirmou que Tabata demonstrou “coerência” e, apesar de ser a mais jovem, é a mais centrada entre os candidatos do debate. Durante a discussão, R. chegou a mencionar que a eleição deste ano está entre “Nunes, Tabata e Boulos”. Ao final da dinâmica, mesmo elogiando novamente a deputada, ela manteve seu voto no prefeito. “Nunes está mais preparado porque já está inserido nesse contexto da prefeitura, mas Tabata também se mostra bastante participativa”, comentou.

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Nunes se destaca tendo ‘o que mostrar’

Ricardo Nunes começou o debate com três eleitores e terminou com quatro. No entanto, houve uma troca: ele perdeu dois apoiadores para Tabata, mas conquistou um indeciso e os dois eleitores que, antes do debate, pretendiam votar em Marçal.

O emedebista causou boa impressão no grupo ao falar sobre as iniciativas de sua gestão, especialmente na área de segurança, como a operação delegada, que contrata policiais militares em suas horas de folga para reforçar a segurança na cidade. Essa proposta recebeu o cartão verde de dois eleitores de Marçal, dois indecisos e dois eleitores de Nunes.

Ao mencionar o aumento do efetivo da Guarda Civil Metropolitana (GCM) e o reforço à Corregedoria, Nunes conquistou cinco cartões verdes, entre eleitores de Datena, Marçal e dele próprio. E., 56 anos, eleitor de Bolsonaro que trocou o ex-coach pelo prefeito, elogiou o fato de Nunes “ter o que mostrar”, enquanto os demais candidatos só falam de ideias. Esse mesmo eleitor, morador do Alto da Lapa, considerou a interação entre Boulos e Datena “jogada ensaiada”.

O embate entre Nunes e Boulos no último bloco foi um dos mais criticados. O psolista tentou associar o prefeito a Bolsonaro e pediu que ele comentasse frases polêmicas do ex-presidente. Nunes respondeu que não é “comentarista político”, mas prefeito. Em seguida, após falar sobre sua trajetória, o emedebista pediu que Boulos explicasse sua relação com Nicolás Maduro e “Janones da rachadinha”, acusando o psolista de já ter atacado viaturas da Polícia Militar. Esse discurso agradou a um eleitor que, depois, trocou seu voto de Marçal para Nunes.

A maioria dos eleitores reprovou a interação entre Nunes e Boulos. “Toda vez que foge do tema da cidade de São Paulo vira um caos o debate”, declarou uma indecisa.

Boulos cai em armadilha de Marçal e decepciona eleitores

O candidato do PSOL entrou e saiu do debate com os mesmos três apoiadores, demonstrando ter um público fiel, mas sem conseguir furar a bolha da esquerda. Embora tenham mantido seus votos, seus eleitores saíram decepcionados, comentando que o psolista “se perdeu” ao cair nas provocações de Marçal. A troca de farpas entre os dois rendeu comentários como “muito infantil”, “ridículo esses dois” e “estão pior que Lula e Bolsonaro”.

“Boulos está perdendo, se deixou levar pelo Marçal. Ele perde muita credibilidade discutindo com o Marçal”, afirmou M., 25 anos, moradora da Vila Clementino e eleitora de Boulos. Uma apoiadora de Datena comentou que “esperava mais” do deputado federal no debate.

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Boulos se destaca quando apresenta propostas. O bloco em que interagiu com Tabata foi bem avaliado por 10 eleitores, com oito deles levantando o cartão verde para sua participação. Nessa parte do debate, ele falou sobre a revisão dos contratos de transporte da prefeitura, propôs o fortalecimento da Patrulha Guardiã Maria da Penha para combater a violência contra a mulher e prometeu não aumentar impostos.

Datena acerta no discurso da segurança, mas desempenho geral decepciona

O apresentador Datena não obteve bons resultados e decepcionou eleitores em seu segundo debate, começando com dois eleitores e saindo sem nenhum. A aposta do tucano foi criticar a gestão de Nunes, mas seus apoiadores o consideraram atrapalhado por não conseguir completar seus raciocínios. Os participantes ainda avaliaram que Datena não possui propostas concretas e relevantes para temas importantes como educação e saúde.

Ao citar planos de transformação da periferia em centros atrativos, o apresentador divagou e recebeu cinco cartões vermelhos, sendo dois de apoiadores dele. “Datena fica perdendo tempo”, disse R., de 37 anos, moradora da Vila Bancária. Quando o assunto foi segurança pública, o apresentador conseguiu se destacar tecendo críticas à política de enfrentamento da atual gestão ao Primeiro Comando da Capital (PCC).

Datena agradou alguns eleitores ao abordar temas sensíveis ao cotidiano da população, como o valor dos impostos, a condição do centro da cidade e o funcionamento da tarifa zero nos ônibus. Mas ficou longe de conseguir conquistar o eleitorado. “Ele passa o tempo todo gaguejando”, criticou C., 47 anos, auxiliar administrativo e morador do bairro do Limão.

Marçal vira piada e lidera rejeição

Pablo Marçal não conseguiu emplacar grandes vitórias nos embates. O candidato do PRTB perdeu os dois eleitores que tinha para Nunes e foi o mais rejeitado durante a pesquisa, com oito pessoas que terminaram o debate dizendo que não votariam nele. O ex-coach recebeu seis cartões vermelhos quando atacou Tabata por não ter uma vice negra em sua chapa. Em outro momento, Marçal tentou fragilizar Boulos ao dizer que levaria “os comunistas para Cuba” e recebeu seis cartões vermelhos.

O postulante arrancou risos do grupo e foi motivo de chacota ao falar sobre a proposta do teleférico e quando foi comparado ao Padre Kelmon, candidato à Presidência da República em 2022. “Marçal tem ideias boas, mas ele não tem tanta noção”, afirmou M., pedagoga de 57 anos, moradora do bairro Paraíso. O ex-coach ainda foi criticado quando titubeou ao falar o preço da passagem de ônibus. “Ele é um João Doria 2, moleque arrogante, playboy e mimado”, disse o administrador G., de 50 anos.

Para os eleitores, um dos triunfos do ex-coach foi conseguir desestabilizar Boulos. Um apoiador do psolista avaliou que o candidato, assim como outros postulantes, “perdem um pouco a credibilidade” ao discutir com o Marçal.

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Arrogância e falta de preparo marcam estreia de Marina

Impedida de comparecer ao primeiro debate eleitoral, Marina Helena estreou perdendo um eleitor e recebendo três rejeições do grupo. “Pesquisei sobre ela, mas vou mudar meu voto, ela está mudando de caminho”, afirmou L., 31 anos, morador da Vila Clementino, que virou eleitor de Tabata Amaral ao final do debate.

Marina abriu o embate com Nunes incitando uma discussão sobre ideologia de gênero, que recebeu pouco engajamento dos eleitores. A candidata do Novo tentou usar o tema da segurança pública a seu favor, citando ampliação do efetivo da GCM para 15 mil guardas, mas não empolgou. Para o grupo, Marina desagradou ao apostar num discurso contra a esquerda e trazer à tona discussões que não se relacionam com a cidade. Os eleitores consideraram a candidata arrogante e despreparada.