RIO – Dez anos após o início da Lava Jato, a força-tarefa – que chegou a ser considerada a maior cerca a políticos suspeitos de desvios de recursos públicos da história – acumula derrotas nos tribunais superiores do País. Em mais um revés da operação, o ministro Gilmar Mendes, Supremo Tribunal Federal (STF), anulou nesta segunda-feira, 28, todos os atos processuais do ex-juiz Sérgio Moro contra o ex-ministro José Dirceu no âmbito da Operação Lava Jato.
A decisão do ministro em um habeas corpus da defesa do petista estende os efeitos da suspeição do ex-juiz, hoje senador pelo União Brasil do Paraná, aos processos que envolvem Dirceu. Essa é mais uma decisão do STF que beneficia políticos e empresários investigados pela Lava Jato.
Mônica Moura e João Santana
Em fevereiro deste ano, o ministro Edson Fachin anulou as condenações do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e dos marqueteiros João Santana e Mônica Moura. Eles haviam sido condenados pela Lava Jato pelo suposto recebimento de caixa dois para o PT nas eleições de 2010. Na avaliação de Fachin, o processo deveria ter tramitado na Justiça Eleitoral do Distrito Federal, e não na 13ª Vara Federal de Curitiba.
Dessa forma, todas as decisões tomadas na ação penal, desde o recebimento da denúncia até a sentença, foram anuladas. O processo será retomado do início na esfera eleitoral.
O caso será transferido porque o STF decidiu, em 2019, que todas as ações de corrupção relacionadas a crimes de campanha devem ser processadas na Justiça Eleitoral. Coube a Fachin analisar se o caso se enquadrava na jurisprudência.
João Vaccari Neto
Vaccari havia sido condenado a 24 anos de reclusão. João Santana e Mônica Moura pegaram oito anos e quatro meses. As condenações impostas na primeira instância pelo então juiz Sérgio Moro haviam sido mantidas pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF4).
Relator das ações remanescentes da Lava Jato no STF, Fachin entendeu que a 13.ª Vara Federal Criminal de Curitiba, responsável pela condenação, não tinha competência para processar e julgar o caso. Na avaliação do ministro, o processo deveria ter tramitado na Justiça Eleitoral do Distrito Federal.
André Vargas
No ano passado, sob relatoria do ministro Cristiano Zanin, o STF anulou a condenação do ex-deputado federal André Vargas por razões processuais, baseando-se em uma resolução anterior do colegiado. A Corte havia decidido que a Vara Federal de Curitiba só podia julgar e condenar atos ilícitos no âmbito da Petrobras, tornando improcedente a condenação de André Vargas naquele local.
Vargas foi o primeiro político condenado pela Lava Jato. Em setembro de 2015, o ex-juiz Sérgio Moro condenou o parlamentar pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro por usar sua influência como deputado para atuar em contratos no âmbito da Caixa Econômica Federal. Somadas, as penas passavam dos 15 anos de prisão.
Beto Richa
Em 2023, o ministro Dias Toffoli determinou a “nulidade absoluta” de todos os atos praticados pela Lava Jato contra o ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB), atualmente deputado federal. A decisão do ministro acatou um pedido da defesa de Richa, que alegava vícios processuais. Segundo os advogados do parlamentar, e assim entendido por Toffoli, os procuradores Deltan Dallagnol e Diogo Castor de Mattos, além do juiz Sérgio Moro haviam agido de forma “parcial”.
Luiz Fernando Pezão
A Justiça Federal no Rio de Janeiro reformou, em abril de 2023, a sentença do juiz federal Marcelo Bretas e absolveu o ex-governador do Rio de Janeiro Luiz Fernando Pezão das acusações de corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e participação em organização criminosa decorrentes da versão fluminense da Lava Jato.
Bretas, que está afastado do cargo de juiz da 7ª Vara Federal Criminal do Rio por decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), condenou Pezão a 99 anos de prisão por esses crimes, em 2021. A defesa do ex-governador recorreu e o Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF-2) aceitou os argumentos e reformou a decisão, livrando Pezão das acusações.
Após ser acusado e preso por suspeitas de corrução, Pezão retornou à vida pública neste ano. O ex-governador foi eleito à prefeitura de Piraí, a cerca de 90 quilômetro da capital fluminense. Pezão recebeu 10.714 votos (58,58% dos votos válidos) e desbancou o adversário Arthur Tutuca (PRD).
A candidatura do ex-governador havia sido indeferida em primeira instância por conta de uma condenação recebida por improbidade administrativa, mas o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) validou, no dia 8 de outubro, a vitória de Pezão. Segundo a ação, o ex-governador não teria repassado à área da saúde valores mínimos definidos em lei durante seu mandato como governador. A condenação, recebida em 2022, cassava seus direitos políticos por cinco anos.
Sérgio Cabral
Símbolo da Lava Jato no Rio, o também ex-governador do Rio Sérgio Cabral, que chegou a ser condenado a mais de 400 anos de prisão por casos de corrupção, se livrou de uma das acusações em março do ano passado. Ele foi absolvido em um processo em que era acusado de receber propina de empreiteiras por irregularidades em licitações.
Na sentença, a juíza Maria Paula Gouvêa Galhardo, da 4.ª Vara da Fazenda Pública do Rio, apontou ausência de provas e “atuação tímida do Ministério Público no caso”.
Eduardo Cunha
Em maio de 2023, a Segunda Turma do STF decidiu, por três votos a dois, anular uma das condenações do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha na Lava Jato, após ver incompetência da Justiça Federal para julgar o processo. A sentença derrubada pela Corte máxima havia imposto 15 anos e 11 meses de prisão de prisão a Cunha, por corrupção e lavagem de dinheiro.
Marcelo Odebrecht
Em maio deste ano, o ministro Dias Toffoli anulou todos os atos praticados pela 13.ª Vara Federal de Curitiba contra Marcelo Bahia Odebrecht, no âmbito da Operação Lava Jato. A anulação não afetou o acordo de delação premiada do empreiteiro.
A defesa do empreiteiro disse à época que o “Judiciário finalmente está reconhecendo e concretizando em decisões” aquilo que os advogados já denunciavam “desde o princípio da Operação Lava Jato”.
Odebrecht foi delator do conluio de empreiteiras que pagou propinas a centenas de políticos em troca de contratos com a Petrobras revelado pela Lava Jato. Ele era presidente da construtora que levava o sobrenome da família quando a operação estourou em 2014 e prendeu os principais executivos do grupo.
Alberto Youssef
Pivô das investigações, o doleiro Alberto Youssef foi um dos primeiros presos na Lava Jato, em março de 2014. Foi condenado por lavagem de dinheiro e organização criminosa no decorrer das investigações, mas, após fechar novo acordo de delação, migrou para a prisão domiciliar em 17 de novembro de 2016 e, em 2017, para o regime aberto.
Em 2023, por ordem do juiz federal Eduardo Appio, da 13.ª Vara Federal Criminal de Curitiba, a PF voltou a prender Youssef em Itapoá, em Santa Catarina, onde mora, segundo sua defesa. Em menos de 24 horas, no entanto, o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4) determinou a soltura do doleiro.
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