Eleger o presidente da República nos próximos dez anos e se tornar uma referência internacional em conservadorismo. De quebra, se consolidar como um dos três maiores partidos políticos do País, com representação qualificada no Congresso Nacional. Essas são as metas de médio prazo do Republicanos, segundo o site oficial da legenda, que é ligada a Igreja Universal do Reino de Deus. No momento, porém, o partido se equilibra entre o apoio constrangido ao governo Lula e a presença de bolsonaristas de relevo entre os seus filiados, como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.
Para as eleições do ano que vem, o Republicanos pretende expandir o número de prefeitos de 215 para 300 e o de vereadores de 2,5 mil para 3 mil. “São metas módicas dentro da perspectiva do partido”, diz o deputado federal Marcos Pereira (SP), vice-presidente da Câmara e presidente nacional da sigla desde 2011. “Creio que possamos avançar mais do que essa meta. São Paulo, por termos o governador, é possivelmente o território onde devemos crescer mais, mas fiz mudanças em vários Estados e estou confiante de que avançaremos homogeneamente na maior parte do país”, conta.
Questionado sobre as metas de médio prazo, ele diz que todo partido sério que tenha um programa de crescimento bem definido quer lançar e eleger o presidente da República. “Não sei dizer quando isso se dará. Mas garanto que um dia irá acontecer”. Na última convenção nacional do Republicanos, Pereira indicou que a legenda vai trabalhar para ter candidato próprio na disputa ao Palácio Planalto em 2026. Porém, ele evita dizer que Tarcísio será o nome do partido na próxima eleição presidencial. “Entendo que ele (Tarcísio) precisa fazer um bom governo em São Paulo, cumprir suas propostas e ir para a reeleição em 2026. Depois disso, acho que será sim um grande nome (ao Planalto)”.
Outro objetivo da sigla é comandar a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados no biênio de 2025-2026. Embora diga que está muito cedo para discutir sobre o tema, Pereira é a aposta do partido para suceder o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). A proximidade com Lira e o histórico de “cumpridor de acordos” são pontos favoráveis ao atual vice-presidente da Casa. Além disso, a entrada do Republicanos no governo Lula é considerada parte da estratégia da sigla para conquistar a Mesa Diretora, visto que o apoio do Executivo tem peso relevante na disputa pela presidência da Câmara.
Com 41 deputados federais e quatro senadores, o Republicanos possui a sétima e a nona maiores bancadas partidárias na Câmara e no Senado, respectivamente. A sigla também é a única que apresenta crescimento contínuo desde 2006, segundo dados do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). Na última eleição, a legenda elegeu dois governadores – São Paulo e Tocantins –, tornando-se o partido que governa o maior número de eleitores nos Estados, com 35,8 milhões de pessoas aptas a votar sob a sua administração.
Além disso, a sigla recebeu, entre janeiro e agosto deste ano, R$ 40 milhões do fundo partidário – a sétima maior quantia distribuída aos partidos políticos. Já em relação ao fundo eleitoral, a agremiação partidária recebeu R$ 236 milhões na última eleição.
Republicanos embarca sem pompa no governo Lula
No início deste mês, o Republicanos foi contemplado pela reforma ministerial feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a fim de garantir governabilidade por meio da incorporação do Centrão à Esplanada dos Ministérios. Com isso, o deputado federal e presidente estadual da sigla, Silvio Costa Filho (PE), assumiu o comando da pasta de Portos e Aeroportos. A aproximação entre a legenda e o governo Lula irritou membros do Republicanos ligados ao bolsonarismo. O governador Tarcísio e o senador Hamilton Mourão, por exemplo, acenaram até para a possibilidade de trocar de partido por causa da adesão à gestão petista.
Diante disso, o Republicanos buscou uma forma de reduzir o ânimo entre os seus correligionários. A saída encontrada pela Executiva Nacional foi liberar Costa Filho para assumir o Ministério de Portos e Aeroportos, porém alegando que se tratava de um convite pessoal do presidente Lula ao parlamentar. Além disso, o deputado se licenciou de suas funções partidárias e a sigla emitiu nota informando “que não fará parte da base do governo Lula e seguirá atuando de forma independente”. A solução agradou tanto petistas, que demonstraram tranquilidade com a manobra, como bolsonaristas, que, por ora, seguem na legenda.
“O partido jamais poderia impedir que o Silvio assumisse o ministério quando convidado pelo governo Lula. Quando anunciamos que seríamos independentes, foi deixado claro que o partido tem pautas que são caras ao Republicanos”, disse Marcos Pereira, em entrevista ao programa Roda Viva na segunda-feira, 25. “Nós não poderíamos abrir mão de defender essas pautas. As que coadunarem com aquilo que defendemos, nós apoiaremos. A gente tem que se pautar pela coerência, e nesse contexto vamos avaliar pauta a pauta, matéria a matéria”, completou.
Para Breno Guimarães, cientista político e membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), se a cúpula do Republicanos realmente fosse contrária à nomeação de Costa Filho ao Ministério de Portos e Aeroportos não teria autorizado o parlamentar a entrar no governo. Porém, na avaliação do pesquisador, o partido pode sair ganhando com a nomeação, assim como o governo.
“Para Lula, a vantagem é que ele poderá ter a adesão desse partido. Por mais que não veja uma adesão automática, que deverá ser negociada pauta a pauta. O governo teve dificuldade até na aprovação do aumento do salário mínimo. Acredito que essa dificuldade pode ser atenuada com a entrega a partidos do Centrão”. Já do lado do Republicanos, Guimarães conta que Costa Filha poderá nomear membros do partido em cargos estratégicos, além de liberar emendas por meio do Ministério de Portos e Aeroportos. “O próprio Marcos Pereira tem R$ 4,8 milhões em emendas parlamentares que não foram pagas. Agora, provavelmente, ele vai direcionar as emendas para o ministério onde há um membro de seu partido”.
Embora a entrada de Costa Filho no governo Lula tenha gerado ruído dentro do Republicanos, a relação da legenda com o PT é histórica. Fundado como Partido Municipalista Renovador (PMR) em 2005, a sigla trocou de nome para Partido Republicano Brasileiro (PRB) no ano seguinte, por sugestão do vice-presidente da República José Alencar. Na eleição de 2006, o PRB foi o partido do vice-presidente de Lula na disputa à reeleição. Assim, a legenda foi base dos governos petistas até pouco antes do impeachment de Dilma Rousseff.
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Em 2019, o PRB mudou novamente seu nome para Republicanos. A mudança de nomenclatura também foi acompanha de um reposicionamento político, que se baseou em movimentos conservadores mundo afora. “Em 2017, autorizei a formação de um grupo de estudos composto por seis pessoas ligadas ao partido para que formulassem e apresentassem uma nova proposta de partido”, conta Marcos Pereira. “Este grupo, do qual não participei para não influenciar de um jeito ou de outro, se baseou principalmente no Partido Conservador, do Reino Unido, no Partido Republicano, dos Estados Unidos, no União Democrata Cristão, da Alemanha, e no Likud, de Israel. O grupo chegou a fazer consultas diretas, mas não estabeleceu nenhuma relação de parceria”, explica.
Republicanos opera como ‘braço político’ da Igreja Universal
Fundamentado nos valores cristãos e tendo a família como alicerce da sociedade, o Republicanos possui uma relação íntima com a Igreja Universal, do bispo Edir Macedo, sendo considerado “braço político” da organização religiosa por cientistas políticos. Entretanto, a cúpula do partido nega que a Universal tenha qualquer influência nas decisões do Republicanos. “A Igreja não interfere no partido e o partido não serve à igreja”, afirmou Marcos Pereira, que além de presidente do partido é bispo licenciado da Universal, na entrevista ao Roda Viva.
Especialistas argumentam, porém, que as decisões do Republicanos são sim influenciadas pela Universal, uma vez que a cúpula da igreja ocupa cargos de direção na alta cúpula do partido. Atualmente, pelo menos 14 dos 24 membros da Executiva Nacional do Republicanos são fiéis, obreiros, pastores ou bispos, com predominância dos dois últimos. Além disso, os cargos mais importantes da estrutura partidária, como presidente, secretário-geral e tesoureiro são ocupados por bispos ou pastores da Universal (licenciados), sendo que dentro da organização da Universal, os bispos ocupam a posição mais elevada na hierarquia, ficando abaixo apenas do bispo Macedo.
Para o professor Cláudio Couto, da Fundação Getulio Vargas, a Universal é um grande conglomerado que opera com três braços: o religioso, o político-partidário e o empresarial, este último representado pela emissora de televisão Record. Assim, Couto conta que os dirigentes de um braço do grupo acabam sendo compartilhados com os demais, como o caso de Pereira, que além de bispo da Universal e presidente do Republicanos, foi vice-presidente da Record. “Estamos falando do mesmo negócio”, conta o professor.
Já o cientista político Breno Guimarães conta que a estrutura do Republicanos está em sua grande maioria concentrada para eleger líderes político-religiosos. “A chapa é feita com três ou quatro membros da Igreja Universal e depois preenchida com artistas, apresentadores da TV Record e outras personalidades que possam puxar ainda mais votos. (Porém), faz parte do jogo democrático se ter partidos ligados a igrejas, sindicatos e outras organizações. O problema é quando o Estado fica controlado pela organização. Agora, as classes quererem terem uma representação é legítimo”, pontua.
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