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Traduzindo a política

Opinião | Bolsonaro agora busca novas barreiras à condenação e prisão após PGR destruir principal esperança

Ex-presidente intensificou apelo desesperado por anistia e fim da ficha limpa para tentar impedir efeitos do julgamento, mas vê o tempo correr muito mais rápido do que esperava

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Foto do author Ricardo Corrêa
Atualização:

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) intensificou nos últimos dias o trabalho para tentar criar novas barreiras a uma eventual prisão por orquestrar uma tentativa de golpe de Estado no Brasil. O esforço não vem por acaso. A denúncia da Procuradoria-Geral da República contra ele, apresentada nesta terça-feira, 18, sinaliza a queda de uma trava que ainda rendia alguma esperança até pouco tempo.

Bolsonaro não crê que tenha qualquer chance de ser absolvido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que tanto alvejou. Como também não imaginava lá atrás que poderia escapar do indiciamento pela Polícia Federal, a quem atribuía viés lulista. Por isso, imaginava que sua melhor chance de evitar o desfecho atrás das grades seria na PGR, com a denúncia de Paulo Gonet não sendo feita ou pelo menos demorando tempo suficiente para que as condições políticas e jurídicas mudassem.

Jair Bolsonaro foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República nesta terça-feira, por tentar dar um golpe de Estado Foto: Wilton Junior/Estadão

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Isso não aconteceu e, por isso, Bolsonaro entra em uma nova fase da batalha. Não foi por outro motivo que ele voltou a bater duramente no Judiciário, por meio dos ataques sem provas ao TSE ainda relacionados às eleições de 2022. E por isso convocou os atos para o dia 16 de março, onde mais uma vez tentará se colocar como uma vítima do sistema. Se tivesse qualquer esperança de uma absolvição, o ex-presidente tomaria outro caminho, em vez de confrontar os ministros.

Também é por isso que ele colocou a mão na massa pessoalmente para tentar empurrar goela abaixo de sua própria base pautas impopulares, como a anistia a golpistas do dia 8, o que usaria para depois também estendê-la a ele, e o fim da Lei da Ficha Limpa. Seria o antídoto para tentar concorrer mesmo condenado, o que Lula, seu adversário político, não conseguiu em 2018.

Em meio a negociações complexas para tentar fazer avançar no Parlamento projetos que teriam longo caminho para, possivelmente, ao final, serem declarados inconstitucionais pelo STF, Bolsonaro vê o tempo correr contra ele. Com a denúncia sendo apresentada 10 dias antes do Carnaval e com o prazo de apenas 15 dias para que a defesa se manifeste de forma prévia, é possível que a aceitação da peça seja feita ainda em março, transformando Bolsonaro em réu. Aí começa a fase de instrução processual, com testemunhas sendo ouvidas para, só depois, haver o julgamento.

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No STF, a aposta é que é possível concluir o caso ainda em 2025, para evitar a contaminação do processo eleitoral do ano que vem. Percalços no caminho podem aparecer, a depender da intenção de um ou mais ministros de esticar o caso. Mas isso não pode se dar mais indefinidamente como antes. Com o prazo fixado de até 90 dias para a devolução de pedidos de vista, é difícil que a defesa consiga tempo suficiente para evitar a condenação ainda em 2025. E como Bolsonaro já é julgado na última instância, contaria apenas com embargos, sem efeito substancial sobre a condenação, para tentar empurrar o trânsito em julgado mais adiante.

Juridicamente, o destino de Bolsonaro deve ser selado em 2025. E é grande a chance de que vá parar atrás das grades se não buscar uma estratégia de evasão no momento em que isso acontecer. Politicamente, porém, ele quer mais tempo, inclusive forçando uma candidatura natimorta até a reta final do prazo definido pela Justiça eleitoral. Resta saber se seus aliados, sobretudo no campo da centro-direita, vão aceitar uma estratégia suicida, já testada e rejeitada pelo eleitor com a esquerda em 2018.

Opinião por Ricardo Corrêa

Coordenador de política em São Paulo no Estadão e comentarista na rádio Eldorado. Escreve às quintas

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