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Traduzindo a política

Opinião | Debate ‘light’ expõe dobradinhas, críticas terceirizadas, medo da rejeição e dilema de Pablo Marçal

Encontro foi morno, um pouco mais propositivo e acabou do jeito que Nunes e Boulos queriam: sem grandes destaques

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Foto do author Ricardo Corrêa
Atualização:

Após encontros bélicos em ocasiões anteriores, os candidatos à Prefeitura de São Paulo fizeram um debate um pouco mais propositivo e sem que os ataques ultrapassassem os limites do razoável. Em um ambiente menos caótico, foi possível perceber mais claramente as dobradinhas firmadas por José Luiz Datena com Guilherme Boulos e Tabata Amaral – em especial para críticas a Ricardo Nunes – e, sobretudo, entre Marina Helena e Pablo Marçal. Os ataques mais ferozes foram terceirizados a ela, enquanto o ex-coach adotou uma postura bem mais comedida. Essa estratégia, porém, expôs o dilema que enfrenta o candidato do PRTB: quando ataca sem controle, sua rejeição sobe. Quando modera, desaparece em meio aos demais nomes.

Candidatos à Prefeitura de São Paulo participam de debate realizado no SBT Foto: Taba Benedicto/Estadão

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A própria postura dos outros candidatos contribuiu para que Marçal ganhasse menos evidência. Já no primeiro bloco, ficou visível essa estratégia. Ele foi o último a ter o direito de falar, mais de 20 minutos após o encontro começar. Quem lhe perguntou foi Tabata Amaral, a única que tem procurado esse confronto com o ex-coach desde o início da campanha. E mesmo quando Marçal tentou criar um personagem do adversário leal, que até a parabeniza pelo “Pé-de-Meia” ou faz uma defesa da gestão do prefeito Ricardo Nunes, ela não aliviou, dizendo que ele seria como um “jogo do tigrinho” que engana as pessoas com promessas falsas para tirar todo seu dinheiro.

Com Marçal apagado, aconteceu exatamente o que Nunes e Boulos queriam. Um debate sem grandes destaques, sem que alguém pudesse sair dos estúdios debatido nas redes sociais ou ganhando qualquer atenção junto a quem não assistiu. Basta isso para quem ponteia as pesquisas, como é o caso dos dois. Se daqui até o dia da eleição nada acontecer, dificilmente não teremos um segundo turno justamente entre os dois que, desde a pré-campanha, são apontados como favoritos para tal.

Para outros candidatos, como Datena, Tabata e Marina Helena, pouco ajuda um debate morno ou “sem graça”. Enquanto o primeiro passou o programa inteiro fazendo o esforço para desfazer a imagem de descontrole da cadeirada e usando seu tempo como escada para Boulos e até para elogiar as propostas de Tabata Amaral, a deputada manteve uma postura mais crítica, sobretudo a Marçal. Mas sem que ele a respondesse, Tabata sumiu. Dessa vez, nem suas propostas ganharam mais evidência.

Já Marina Helena merece uma reflexão à parte. Passou o debate inteiro buscando a viralização que Marçal obteve nos embates anteriores. Repetiu, basicamente, durante todo o debate, cerca de 10 frases em resposta a qualquer questão. Mobilidade, segurança, saúde... independentemente do tema, a resposta era sempre a mesma: “o problema é o dinheiro para a companheirada”. Manteve uma evidente dobradinha com o ex-coach, não quebrada nem mesmo quando ele criticou o fato de ela receber recursos do fundo eleitoral dizendo que é contra a existência da verba. Considerando que disputam o mesmo voto e que ele tem cerca de 20% e ela pouco mais de 2% ou 3%, parece até ter desistido da eleição.

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É difícil imaginar que, daqui em diante, outros debates poderão trazer algo novo, que tire algum dos candidatos da zona de conforto. Foram tantos encontros que quase todos os testes já foram realizados e os candidatos parecem já se conhecer suficientemente para que possam evitar armadilhas que cada um possa preparar. O que resta de dúvida é se, diante de um debate um pouco mais saudável, algum candidato pode conseguir ainda fazer com que o eleitor preste atenção nas propostas e soluções para os problemas e não fique apenas lamentando que o entretenimento pode ter ficado para trás.

Opinião por Ricardo Corrêa

Coordenador de política em São Paulo no Estadão e comentarista na rádio Eldorado. Escreve às quintas

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