A escolha de Gleisi Hoffmann para entrar no governo na vaga de Márcio Macêdo na Secretaria-Geral da Presidência indica que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva começou a sentir a perda de popularidade e a desconexão com sua própria base. A mudança alinhavada para a reforma ministerial distancia-se bastante da ideia de aproximar-se do eleitor médio e preocupa-se com uma aproximação com um público historicamente identificado com o presidente que, segundo pesquisas divulgadas na última semana, começa a dar sinais de esgotamento com o governo.
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Gleisi não é nem de longe uma figura que possa agregar forças ao centro ou trazer uma imagem de pluralidade ao governo. Ao contrário. Por ter sido escalada como porta-voz das posições mais radicais da esquerda e do PT, inclusive contra opositores, empresariado, imprensa e até integrantes do governo, tem imagem profundamente desgastada com aqueles que não são militantes ferrenhos do Partido dos Trabalhadores. Mas é, também por isso, quem conseguiria dialogar mais com o comando dos movimentos sociais de esquerda que o PT sempre teve em seu entorno e que vocalizam exatamente as posições que Gleisi externou ao longo dos últimos anos, inclusive com críticas a figuras do próprio governo que tentavam transitar para posições mais moderadas.
Na antessala do Palácio do Planalto, terá que conviver com figuras com quem diverge: Rui Costa, o todo-poderoso ministro da Casa Civil, e com o sempre presente ministro da Fazenda, Fernando Haddad, hoje o virtual sucessor de Lula. Ela também já criticou publicamente do ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha. A temperatura dos embates no entorno do presidente tende a se elevar.
Lula sabe que não vencerá a eleição de 2026 sem conquistar uma porção do eleitorado de centro que tomou ir com ele em 2022 por ojeriza a Jair Bolsonaro. Mas a urgência em sair das cordas é tão grande que o primeiro olhar está sendo justamente em garantir que o eleitor próximo da esquerda não largue sua mão. E que o governo tenha nos movimentos sociais uma força para fazer a luta política que a gestão não tem conseguido fazer.
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O papel de Gleisi será exatamente insuflar esses movimentos a sair em defesa do governo no momento mais difícil que Lula enfrenta na atual gestão. Foi dela essa mesma missão no momento mais complicado que Lula enfrentou na vida, quando ficou mais de 580 dias preso na sede da Polícia Federal e sua força política foi sendo cultivada pelo movimento “Lula Livre”.
A troca também ajuda a resolver um impasse no PT. A presidente atual do partido era refratária à posição de Lula de colocar Edinho Silva, mais moderado e próximo de Haddad, no comando do partido. Como mostrou Vera Rosa na reportagem que apresentou a escolha de Lula por Gleisi, a entrada de Edinho no comando confirma a força de Haddad como sucessor de Lula, seja em 2026 ou 2030. E se o grupo de Gleisi poderia ser um empecilho a essa mudança de ares, a ida dela para o governo, um desejo antigo dessa turma, aplaca um pouco essa resistência. Sua ala ganha espaço no governo em troca de ceder o comando da sigla.
Enquanto o PT prepara uma tentativa de transição ao dar mais espaço ao grupo de Haddad, o governo pinta-se para a guerra que será o 2025 e sobretudo 2026. Se Gleisi terá a missão de organizar a tropa da esquerda, figuras como Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, que também são cotadas para entrar no governo, terão a bem mais difícil missão de domar os partidos de centro e ajudar a garantir uma mínima base que permita que Lula perdure até 2026 e chegue competitivo mesmo no comando de um governo sem marca e com popularidade ladeira abaixo.