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Traduzindo a política

Opinião | Pedido de voto de Lula para Boulos reforça o ‘faz de conta’ que é a legislação para pré-campanha

Multa baixa e facilidade de driblar uma regra fraca forçam um início antecipado das disputas eleitorais e causa insegurança jurídica

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Atualização:

O artigo 36-A da Lei 9.504/97 é bastante permissivo sobre o que um candidato pode fazer na pré-campanha. Deixa um pré-candidato e seus aliados à vontade para mencionar uma pretensa candidatura, exaltar qualidades pessoais de quem vai concorrer, libera entrevistas, programas, debates, exposição de plataformas políticas, encontros, seminários, congressos, prévias, divulgação de atos de parlamentares que se candidatam, divulgação de seus posicionamentos pessoais, reuniões pagas pelo partido com a sociedade civil e campanhas de arrecadação de recursos. Tudo isso pode. Só não pode pedir voto, que foi exatamente o que fez o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para Guilherme Boulos (PSOL). E ele fez, provavelmente, não por não saber que não pode, mas por vislumbrar que vale a pena no território de faz de conta da legislação eleitoral brasileira.

O que especialistas em direito eleitoral dizem é que a punição pela conduta deve ser uma multa de R$ 5 mil a R$ 25 mil. E só. Para uma eleição do tamanho de São Paulo, que movimentará milhões de cada partido e numa época em que o fundo eleitoral é de R$ 4,9 bilhões (acrescido de cerca de R$ 1 bilhão por ano do fundo partidário), o valor pode ser chamado de simbólico. Quanto Boulos ganhou em exposição com o pedido de voto de Lula? Não vale R$ 25 mil? Parece óbvio que sim.

Lula participou de ato de centrais sindicais em comemoração ao Dia do Trabalhador e aproveitou oportunidade de fazer campanha para Guilherme Boulos, pré-candidato em São Paulo Foto: Taba Benedicto/Estadão

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Ainda que Lula não tivesse feito o pedido explícito, o que foi agravado pela transmissão oficial da TV do governo, o fato de a legislação considerar apenas palavrinhas mágicas como detonadoras de uma conduta vedada faz com que, na prática, a campanha comece bem antes do prazo previsto pela legislação eleitoral. Dizer que o “vote no fulano” é diferente do “em outubro esse cara ótimo aqui deve disputar as eleições” é uma mera encenação.

E o início antecipado da campanha traz ainda um nítido cenário de insegurança jurídica, inclusive quanto à forma de contabilização dos gastos no período prévio ao determinado na lei. Foi o que vimos, por exemplo, no episódio do ex-juiz e ex-ministro Sérgio Moro, que teve gastos numa pré-campanha para presidente, depois virou candidato de fato ao Senado e vai ter que responder, no TSE, a uma possível tentativa de cassar seu mandato.

É hipocrisia fingir que a campanha só começa quando a lei diz que começa. Se olharmos para trás, Jair Bolsonaro anunciou sua candidatura à Presidência nas eleições de 2018 na semana em que Dilma Rousseff foi eleita presidente em 2014. De lá até a disputa de quatro anos depois, ficou permanentemente em campanha. Durante os quatro anos em que esteve no Palácio do Planalto, também. Lula, da mesma forma, começou sua campanha bem antes do prazo oficial de 2022. A diferença é que, na época, costumava repetir, aproveitando a hipocrisia da lei, que ‘não podia pedir votos e nem dizer que era candidato”, querendo dizer, evidentemente, que era. Agora, nem mais essa fantasia quis vestir. Preferiu pagar R$ 25 mil para começar logo a campanha de Boulos.

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Opinião por Ricardo Corrêa

Coordenador de política em São Paulo no Estadão e comentarista na rádio Eldorado. Escreve às quintas

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