A lenta reação ao apagão provocado pela tempestade do final da semana passada e que continuou trazendo consequências para a população de São Paulo no início desta semana arranhou as imagens do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e do prefeito Ricardo Nunes (MDB). Faltou energia também na cobrança de soluções. No caso do chefe do Executivo municipal, com o agravante de que o fato foi fortemente explorado por seus adversários na corrida eleitoral de 2024. Mais do que a culpa propriamente dos dois no episódio, pesou a inabilidade para tratar publicamente da situação que envolve uma concessão federal, as falhas do atendimento de uma empresa privada, um crônico problema da fiação elétrica exposta na capital, as dificuldades para lidar com a gestão e poda de árvores na cidade e a ocorrência de um evento climático extremo.
No caso de Tarcísio de Freitas, o estrago se dá pelo fato de que o fracasso de uma empresa privada que opera serviços públicos se dá justamente quando se discute na Alesp a privatização da Sabesp. Sua proposta passou a ser alvo de ataques, inclusive de bolsonaristas aliados que, percebendo o prejuízo político de insistir na tese em um momento ruim, passaram a condenar a ideia, seja com questionamentos nas redes ou com mobilizações junto ao ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF). A Tarcísio restou enfatizar que o modelo de privatização da companhia de água e saneamento será bem distinto do aplicado lá atrás com a antiga Eletropaulo. E que esse tipo de contrato precisa ser revisto para o futuro.
Tarcísio também culpou a gestão inadequada da poda de árvores na capital - o que joga parte da culpa no aliado Ricardo Nunes — e lembrou que a fiscalização do serviço cabe à União. Também evitou culpar a Enel, dizendo se trata de “um fato extraordinário”. Aos olhos da opinião pública, porém, soa como drible em suas responsabilidades em vez de bater na mesa e exigir que a empresa resolvesse o problema de forma rápida. Ao paulista pouco importa de quem é a culpa mas qual autoridade vai pressionar para que um suplício como esse seja resolvido, afinal extraordinário mesmo é ficar sem energia.
Leia mais
Um levantamento feito pela Quaest a pedido do Estadão mostrou que, das 560 mil menções feitas ao apagão nas redes sociais, quase metade (42%) menciona Tarcísio ou Nunes.
No caso do prefeito da capital, a primeira reação, propondo que o cidadão tivesse que pagar pelo enterramento dos cabos de energia, foi a pior possível. Na segunda-feira, ele defendeu a proposta em uma fala confusa: “A taxa, pela regulação, uma possibilidade de fazer a cobrança de uma taxa de serviço, taxa de melhoria, contribuição de melhoria (corrigiu após ser alertado), a gente tem conversado com a Enel, desde o ano passado estamos tratando disso”, afirmou em entrevista à imprensa cercado de outras autoridades. Na ocasião, ele disse que seria uma contribuição voluntária. Algo como chegar a um quarteirão da cidade e perguntar pro cidadão — que já paga pela energia, pela contribuição para a iluminação pública e pelo IPTU — se ele não quer enterrar os fios ali, pagando parte da obra (de novo) do próprio bolso. A proposta foi tida como um desastre por seus aliados. E de lá para cá, Nunes tem gastado tempo, postagens em redes sociais e entrevistas para dizer que não é bem assim e que não foi o que quis dizer ou propor.
Até aquela entrevista, Nunes estaria na mira apenas pelos questionamentos sobre a poda de árvores, de responsabilidade da prefeitura, mas que envolve tanto a própria Enel como o Corpo de Bombeiros. Sobre o enterramento de fios, sustentaria apenas, como tem feito, que a Justiça dificultou o serviço ao derrubar legislação municipal que obrigava a Enel a fazer essas obras. O tamanho do estrago na imagem, inevitável para um político que está no poder quando um acontecimento dessa monta acontece, seria bem menor do que o registrado.
Leia também
Paralelamente a isso, a Câmara Municipal decidiu instalar a CPI da Enel. Por mais que os governistas controlem o colegiado com a presidência, a chance de uma oposicionista na relatoria pode ser mais um ponto de incômodo na Casa. Gera ruído e noticiário negativo em um momento em que o prefeito quer se tornar mais conhecido sem entrar em grandes polêmicas.
Se no caso da greve do metrô foi Guilherme Boulos (PSOL) quem apanhou duramente nas redes pelo apoio de seu partido a uma paralisação que prejudicou profundamente o cidadão, agora é seu principal adversário quem tem que lidar com uma situação que não pode contornar facilmente e sem apoio de seus possíveis aliados na Câmara. A defesa do prefeito coube a ele mesmo.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.